Concessões a entes privados previstas no texto ajudarão recuperação pós-pandemia, defendem congressistas
Um grupo de líderes partidários do Senado encabeça a defesa da votação do novo marco regulatório do saneamento básico durante o estado de calamidade pública por causa do novo coronavírus.
A intenção é acelerar a votação e finalizar a tramitação do texto nos próximos dias. Como a proposta já foi aprovada na Câmara, se não sofrer alterações, pode em seguida ir à sanção.
Com isso, o novo marco entraria em vigor em 2021. A aprovação pode, na avaliação de congressistas e do governo, ajudar na retomada da economia, além de ampliar o acesso a água e esgoto no país.
O projeto prevê que empresas privadas possam prestar o serviço à população. Vencedoras de licitação terão de se comprometer com metas para os próximos dez anos.
Fornecimento de água potável e tratamento de esgoto
Entre os pontos dos contratos a serem cumpridos estão a cobertura de 99% do fornecimento de água potável e de 90% para coleta e tratamento de esgoto à população.
Pelo texto, também fica determinado que não haverá interrupção dos serviços, mesmo em caso de atrasos dos pagamentos por parte dos usuários.
Para o senador Confúcio Moura (MDB-RO), embora o Senado tenha priorizado pautas de saúde em razão da Covid-19, projetos estruturantes, como o do saneamento, precisam avançar.
“Ela [a lei do novo marco do saneamento] é importantíssima, é fundamental para que no ano que vem, quando as coisas melhorarem, aí sim, já se iniciem as concessões de saneamento no Brasil”, disse.
O projeto é considerado polêmico, sobretudo por permitir a entrada de empresas privadas no setor. E é exatamente neste ponto que o governo Jair Bolsonaro defende a pauta.
Na quinta (28), o secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues, pediu a aprovação do projeto a congressistas da comissão mista que acompanha gastos do governo na pandemia.
Segundo ele, o novo marco do saneamento poderá ser um fator de estimulo de crescimento no pós-pandemia. Para isso, o país precisa manter, disse Rodrigues, preocupação e zelo com a questão fiscal.
“Quer seja na área de saneamento, quer seja na área de infraestrutura básica, o Brasil é um grande ativo para investidores internacionais”, afirmou.
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Falta de acesso a coleta e tratamento de esgoto
Dados divulgados no começo deste ano pelo Instituto Trata Brasil apontam que mais de 100 milhões de brasileiros não têm acesso a coleta e tratamento de esgoto. Isso colabora para a proliferação de doenças.
Com os caixas apertados, cumprir as metas previstas no novo marco é inviável para União, estados e municípios sem que haja injeção de recursos privados.
Os senadores querem aproveitar as sessões virtuais para votar a proposta. Com isso, o projeto fica livre de passar pelo exame de comissões, como a de Infraestrutura.
Os colegiados estão com reuniões suspensas desde o começo de março. Dessa forma, a tramitação pode ser agilizada.
O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) é o relator da proposta. Até sexta-feira (29), havia apenas uma emenda protocolada ao projeto, de autoria do senador Lasier Martins (Podemos-RS).
Apesar de ter sido aprovada pela Câmara em dezembro, a matéria só teve movimentação no Senado no início de março, quando foi encaminhada para a Comissão de Meio Ambiente.
No dia 20 daquele mês, o Senado recebeu um ofício assinado pelo ministro Paulo Guedes (Economia) colocando a matéria como uma das prioridades para o governo durante a pandemia.
“Trata-se de matérias infraconstitucionais que estão em tramitação e que são extremamente relevantes para resguardar a economia do país, aumentando a segurança jurídica para os negócios e para atrair investimentos“, afirmou Guedes no documento.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), acatou o argumento e, passados 17 dias do documento protocolado pelo governo, Vieira entregou relatório pela aprovação do texto.
“Matéria pronta para ser colocada em votação”
Sem encontros da Comissão de Meio Ambiente, o relatório não foi lido no colegiado. “A matéria já passou por um longo processo de instrução e está pronta para ser colocada em votação”, afirmou Vieira.
“Este não é um assunto novo, e, diante da crise sanitária que estamos vivendo, é oportuno neste momento que o novo marco seja votado pelos colegas.”
Entretanto há quem discorde da tática do governo em usar o novo coronavírus para acelerar a tramitação.
Para o senador Esperidião Amin (PP-SC), o novo marco, da forma como está previsto no projeto, pode não servir de incentivo para as empresas e ainda causar prejuízos a estados e municípios.
“Apressar esse assunto neste momento difícil favorece mais a especulação do que o investimento. Quem é o investidor que vai querer colocar dinheiro nesta questão agora em que todos querem segurar recursos?”
Amin questiona ainda artigos do projeto, como o que impede o corte do fornecimento dos serviços aos usuários em caso de atraso de pagamento e a possibilidade de contratos já feitos terem de passar por licitação.
Para o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), porém, o texto já contempla todas as regras necessárias.
Ele é autor de um requerimento que pede audiência pública na Comissão de Desenvolvimento Regional da Casa para debater o tema. Porém, diante da possibilidade de aceleração da medida, já afirmou que abre mão de novos debates para levar o texto ao plenário.
“O projeto já tem um belo relatório e está pronto para ser votado. Neste momento de calamidade, com a necessidade de ações em saneamento, precisamos acelerar“, disse o senador.
O que prevê o marco
Contratos
- Os municípios não poderão transferir a execução dos serviços de saneamento para empresas públicas estaduais. Passam a valer as licitações, envolvendo empresas públicas e privadas;
- Os acordo em vigor serão mantidos, e, até março de 2022, poderão ser prorrogados por 30 anos, desde que as empresas consigam comprovar viabilidade econômico-financeira;
- As empresas devem se comprometer com metas a serem cumpridas até o fim de 2033, entre elas: cobertura de 99% para o fornecimento de água potável e de 90% para coleta e tratamento de esgoto. Também fica determinado que não haverá interrupção dos serviços. As empresas não poderão distribuir lucros e dividendos.
Serviços em bloco
Estados e municípios poderão contratar serviços de forma coletiva. A adesão é voluntária e os participantes podem deixar o bloco, se não se sentirem contemplados.
Regulação
- O saneamento básico do Brasil será regulado pela ANA (Agência Nacional de Águas), que poderá oferecer ajuda técnica e financeira para municípios e blocos de municípios implementarem planos de saneamento básico;
- O apoio estará condicionado a regras como a adesão ao sistema de prestação regionalizada e à substituição dos contratos vigentes, em troca de licitação;
- A participação da União em fundos de apoio à estruturação de parcerias público-privadas será ilimitada, facilitando essa modalidade para os estados.
Subsídio
Famílias de baixa renda poderão receber subsídios para cobrir os custos do fornecimento dos serviços de saneamento. Poderão ter gratuidade na conexão à rede de esgoto.
Lixão
Estabelece prazos da Política Nacional de Resíduos Sólidos para que as cidades encerrem os lixões a céu aberto. Os novos prazos vão de 2021, para capitais e regiões metropolitanas, até 2024, para municípios com até 50 mil habitantes.
Tarifas
Municípios e o Distrito Federal passarão a cobrar tarifas sobre outros serviços urbanos, como poda de árvores, varrição de ruas e limpeza de estruturas de drenagem de água da chuva. Caso não haja a cobrança depois de um ano da aprovação da lei, será considerado renúncia de receita e o impacto orçamentário deverá ser demonstrado.
Fonte: Folha de São Paulo .
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