Quem chega ao município de Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, não consegue ignorar as montanhas. A cidade, como outras na região serrana, é rodeada por morros, muitos deles ainda cobertos pelo manto da floresta. Parte do território é protegido pelo Parque Estadual dos Três Picos, o maior parque estadual do Rio, outra parte integra a Área de Proteção de Ambiental (APA) de Macaé de Cima, de uso sustentável. Ambas as áreas protegidas desempenham um papel importante para conservação da natureza no município, mas a Mata Atlântica tem outro forte aliado por lá: a sociedade civil. Mais especificamente, os proprietários de Reservas Particulares do Patrimônio Natural, as RPPNs.
Uma reserva particular é uma categoria de unidade de conservação – a única – onde a gestão cabe ao setor privado. Outro aspecto importante é que elas são registradas ad perpetum, ou seja, são para sempre. Podem ser vendidas ou herdadas, mas permanecem como áreas de proteção ambiental.
“É um legado que aquela pessoa está deixando para a humanidade”, resume Bernardo Furrer. Médico por carreira e ambientalista por paixão, Bernardo é dono de duas reservas na zona rural de Nova Friburgo: a Reserva Ecológica Rio Bonito de Lumiar, reconhecida em março de 2018, com 158 hectares; e a mais recente, a Canto da Coruja, criada em agosto de 2020 com 2,4 hectares. As duas são contíguas e ajudam a proteger o córrego Abraão, um dos tributários do rio Macaé. A importância hídrica das reservas, reforçada também nas diversas nascentes da propriedade, é apenas um dos aspectos que evidenciam o papel estratégico das reservas particulares para conservação da natureza e prestação de serviços ecossistêmicos.
“Além disso, você pode trazer um uso público para essas unidades, em termos de visitação turística, de pesquisa científica, identificação de espécies. Agora mesmo nós estamos fazendo aqui um projeto de reflorestamento e também de identificação de espécies, e estamos identificando árvores que são consideradas raras atualmente no estado do Rio. Com isso você pode trabalhar muito a questão de fauna, de flora, você pode pensar em reintrodução de espécies ameaçadas. Você tem uma infinidade de possibilidades de ação”, reforça Bernardo, que é um entusiasta na missão de transformar outros proprietários em “rppnistas”, como são apelidados os donos de RPPNs.
Em todo Brasil, existem mais de 1.600 RPPNs que preservam mais de 800 mil hectares de áreas naturais no país, conforme os dados divulgados pelo Painel da Confederação Nacional de RPPNs . A maioria delas, cerca de 1.200, está na Mata Atlântica. Minas Gerais é o líder disparado no ranking, com 356 reservas, seguido pelo Paraná, com 292. Empatados em terceiro lugar estão a Bahia e o Rio de Janeiro, ambos com 168 RPPNs.
O recordista do estado fluminense é justamente o município de Nova Friburgo, com 24 RPPNs (17 delas reconhecidas pelo estado). No cenário nacional, perde apenas para Curitiba, no Paraná, com 34 reservas. “Mas lá são reservas muito pequenas e são RPPNs urbanas, é diferente”, defende Bernardo Furrer em tom de brincadeira.
Rivalidades à parte pelo título da categoria na esfera municipal, no âmbito do estado, apesar de estar atrás do Paraná em números gerais, o Rio se tornou uma referência no campo das reservas particulares, a partir da elaboração de uma política pública de estado para o apoio à criação e gestão das RPPNs. Em agosto de 2007, foi criado o Programa Estadual de Apoio às Reservas Particulares do Patrimônio Natural, e para operacionalizar a iniciativa, criou-se também o Núcleo de RPPNs, hoje abrigado dentro do Instituto Estadual do Ambiente do Rio de Janeiro, o Inea.
O objetivo do Núcleo é ajudar os proprietários interessados em transformarem suas terras em unidades de conservação privadas, agilizar o reconhecimento de RPPNs no estado e divulgar o tema. Através de recursos oriundos de compensação ambiental e de projetos aprovados pelo Fundo da Mata Atlântica, que gere o recurso, uma empresa é contratada e fica responsável pela execução das ações.
“O programa veio para suprir inclusive uma lacuna do órgão no que diz respeito à técnicos para avançar nessa agenda de conservação privada. O programa surgiu justamente para poder atender a demanda desses proprietários que querem criar de forma célere”, aponta Roberta Guagliardi, coordenadora-executiva do projeto. “Há uma carência de recurso humano suficiente no órgão para avançar nessa agenda, então a estratégia foi justamente utilizar esses recursos de compensação ambiental para criação de RPPN”, acrescenta Roberta.
Desde que foi criado, o Programa catapultou o número de RPPNs no estado. Das 168 reservas que existem hoje no Rio, 98 são reconhecidas em âmbito estadual, todas elas criadas com apoio do núcleo especializado nesses últimos 12 anos.
O ato de criação da reserva é voluntário, conforme desejo do proprietário, mas para ser reconhecida como RPPN, a propriedade precisa passar por um trâmite burocrático e validação junto a um órgão ambiental competente em qualquer uma das três esferas – federal, estadual ou municipal. Esse processo nem sempre é rápido e pode ser oneroso ao rppnista.
“O ICMBio responde pela análise de reconhecimento de RPPNs no Brasil inteiro e como o estado do Rio de Janeiro já possui um programa consolidado de apoio à criação e gestão, esse processo [de reconhecimento] se torna mais célere. Porque é o estado do Rio de Janeiro olhando para o estado do Rio de Janeiro. Além de se tornar mais rápido, o proprietário tem um contato direto com os técnicos que atuam na área, o que também agiliza as ações”, complementa Roberta, que conta os dias para criação da 100ª RPPN em âmbito estadual.
Além da orientação e apoio à criação da RPPN, o programa também auxilia na execução do georreferenciamento necessário para a criação das reservas e na elaboração do Plano de Manejo. “O georreferenciamento é a parte mais cara do proprietário arcar. Nessa fase que está acabando agora, a gente fez o ‘geo’ de várias propriedades, de acordo com critérios para eleger as propriedades beneficiadas. Essa é uma linha importante porque tem proprietários que querem criar, têm floresta, mas não têm recurso para pagar o georreferenciamento”, comenta Roberta.
Uma das últimas reservas a serem oficializadas no estado foi a RPPN Raibert, em – adivinhe – Nova Friburgo, mais especificamente no distrito de Lumiar. Oficializada em agosto deste ano, a reserva protege uma área de 7,4 hectares às margens do rio Macaé.
“Eu fui gerado aqui nessa região [de Lumiar] e sempre frequentei muito. Então meu amor pela natureza veio desde a infância. E sempre aquela ideia de, poxa, um dia eu quero ter uma reserva, um dia eu quero ajudar a proteger essa mata”, lembra o engenheiro mecânico e hoje rppnista, César Raibert.
César lembra da apreensão às vésperas da criação da reserva, quando, em abril deste ano , veio a informação de que o contrato da empresa que coordena o Programa das RPPNs havia sido abruptamente encerrado. O susto foi posteriormente minimizado com a notícia de que seria feito apenas um corte no orçamento original.
“Já havia dois anos que eu estava com essa ideia de RPPN e eu estava nos finalmente do processo quando houve essa crise de Covid e eles retiraram as verbas do programa. E eu seria um dos prejudicados, porque minha RPPN estava para sair. A união de todos, da mídia, fazendo pressão junto aos políticos foi a forma de recuperar o programa e com isso minha RPPN saiu em agosto ”, relembra o proprietário.
O atual contrato da empresa que coordena o projeto, com vigência até o dia 02 de janeiro de 2021, será prorrogado, através de um termo aditivo, por mais seis meses, conforme esclarece a Secretaria de Estado do Ambiente e Sustentabilidade (SEAS-RJ).
Em conversa com ((o))eco, o atual secretário, Thiago Pampolha, reforçou que as RPPNs são um tema importante e que, após a aprovação do aditivo, o foco seria a aprovação da Fase VI do Programa.
“Já existe uma proposta preliminar para execução da Fase VI do Programa. Para isso está em andamento a autorização para a assinatura de um termo prorrogando por mais 6 meses o atual contrato, enquanto é concluída a proposta para a próxima fase, a ser submetida à aprovação na Câmara de Compensação/Fundo Mata Atlântica (CCA/FMA), garantindo assim que em meados do ano que vem possamos dar início a nova fase”, explicou o Secretário.
Uma vez elaborada, a próxima fase do projeto, que ainda será desenhada pela SEAS juntamente ao Inea, será submetida para votação na Câmara de Compensação Ambiental (CCA), um colegiado com participação de representantes de órgãos federais, estaduais, municipais e instituições da sociedade civil responsável pela aprovação de projetos financiados pelo Fundo da Mata Atlântica.
A coordenadora-executiva do projeto acredita que o momento pede por um olhar mais atento à gestão das reservas particulares. “A gente atingiu uma maturidade no que se refere à criação que agora a gente quer também trazer esse olhar mais maduro pro apoio à gestão. É muito importante que esses projetos contemplem a elaboração de plano de manejo de uma RPPN”, aponta.
Atualmente, das 98 RPPNs estaduais, apenas 6 têm Plano de Manejo, o instrumento norteador para gestão de unidades de conservação – sejam públicas ou privadas.
“Muitas vezes o proprietário quer abrir para visitação, o que é ótimo, e a gente sabe que pode gerar um retorno financeiro tanto pro proprietário quanto para região, só que não tem como a gente pensar nisso se a RPPN não tiver seu Plano de Manejo aprovado, porque a visitação precisa do plano. A lei diz que as únicas atividades que podem ocorrer sem plano de manejo são as atividades de pesquisa científica e apoio à proteção. Por isso que às vezes a gente não consegue avançar muito em visitação em RPPN, porque tem essa lacuna grande dos planos”, explica Roberta.
A coordenadora acredita que o turismo é outra frente interessante para o desenvolvimento do programa. “Acho que poderíamos inovar pensando num turismo integrado às unidades de conservação públicas”, aposta.
Uma exceção à regra, César elaborou o plano da sua reserva em tempo recorde e agora aguarda apenas a aprovação interna pelo Inea. A pressa tem explicação, já que um dos objetivos do proprietário é fomentar o ecoturismo e a educação ambiental.
“O que é ter uma reserva? Pra que serve? Só para preservar? Eu acho que a reserva pode ser um ponto de partida para uma nova era. Ou seja, disseminar nas escolas a educação ambiental, trazer crianças aqui para conhecerem árvores, animais, criar um pouco de ecoturismo trazendo pessoas que gostam de natureza, que gostam de observar pássaros… É a nova etapa. Isso foi colocado no Plano de Manejo e agora é a questão da execução”, conta César.
Os planos de César para desenvolver a educação ambiental na RPPN incluem a construção de um centro de visitantes para receber os estudantes. A ideia para a atividade surgiu da equipe da APA Macaé de Cima , unidade de conservação de uso sustentável onde a reserva está inserida.
“A ideia da trilha [interpretativa] e de trazer os estudantes para cá partiu deles. O meu sítio está muito próximo, apenas 2km do centro de Lumiar, onde existem várias escolas, tanto do município, quanto estaduais. A ideia, que partiu da APA, foi trazer essas crianças e criar uma trilha fácil, mas que fosse inteligente, colocando a leitura de QR Code com as informações da árvore, as pegadas dos bichos”, conta o proprietário.
“Isso tudo aqui tem que ser uma parceria, principalmente com a prefeitura, a Secretaria de Meio Ambiente, de Turismo, de Cultura, de Educação… todos têm que abraçar o projeto, junto com a comunidade. Eles têm que entender o que a gente vai gerar de renda para comunidade. Não é só uma reserva isolada, ela tem que se integrar na comunidade”, completa o rppnista.
Desafios e oportunidades
A manutenção do Programa Estadual de RPPNs é uma das bandeiras dos rppnistas fluminenses, que têm se organizado cada vez mais enquanto coletivo para garantir uma voz mais forte junto aos órgãos públicos. Uma das principais demandas é o repasse de parte do ICMS Ecológico recebido pelo município.
O programa de ICMS Ecológico do estado do Rio de Janeiro transfere uma alíquota do imposto recolhido (2,5% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, o ICMS) aos municípios. O repasse é feito a partir dos índices obtidos por cada um deles em campos como gestão dos resíduos sólidos, coleta e tratamento de esgoto, e áreas protegidas — e é aí que entram as RPPNs. A presença das reservas no município acumula pontos positivos para o cálculo do Índice Final de Conservação Ambiental (IFCA), que reflete no valor que será recebido pela prefeitura. Quanto melhor o índice, maior a fatia do repasse que a cidade recebe.
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Em 2020, o programa do ICMS Ecológico realizou o repasse de R$229 milhões a 88 municípios, dos 92 do estado. Um decreto estadual (nº 46.884/2019 ) publicado em dezembro de 2019 promoveu mudanças na metodologia que orienta o cálculo do índice, entre elas o aumento da pontuação das RPPNs.
“Com a nossa organização, nós pretendemos fazer chegar a nossa voz de rppnistas para o governo também do município de Nova Friburgo. O estado já fez o seu papel, pelo menos em parte, em função da criação da lei do ICMS Verde. Uma parte do que as RPPNs proporcionam na elaboração do cálculo da transferência desses recursos para o município, deveria retornar para as RPPNs”, reforça Bernardo Furrer. “O município deveria ter a obrigação de transferir esses recursos para RPPN, para que isso se traduza na sustentabilidade das RPPNs”.
O rppnista destaca os custos envolvidos não apenas na criação de uma reserva, mas na sua manutenção e gestão, e que a política de repasse do município poderia servir de incentivo para os proprietários ainda em dúvida sobre transformar seus imóveis em RPPNs assim como ajudaria aqueles que já possuem reservas a implementarem serviços de uso público, como trilhas sinalizadas.
“É para isso que serviria esse repasse, mas o município de Nova Friburgo ignora completamente isso. Nós já estivemos em duas legislaturas, com dois prefeitos que não tiveram a menor sensibilidade a isso. Nós temos esperança que com a próxima gestão, haja uma sensibilidade maior”, critica o médico e rppnista.
Ele aponta ainda que o estado poderia cobrar o município a respeito. “Apesar de não ter ingerência direta na gestão dos recursos, ele pode, politicamente, mostrar a importância disso para os políticos de Nova Friburgo, porque ele faz o repasse para o município. Ele pode dizer ‘olha, esse recurso que a gente está transferindo para o município, não é para ser aplicado com outras finalidades, é para ser aplicado na gestão do meio ambiente’. E as RPPNs fazem parte desse processo. A gente espera, com esse grupo de rppnistas, que hoje tem RPPNs e que está agregando um grupo de pessoas que quer ter futuramente as suas RPPNs, que a gente possa levar essa questão”.
A reportagem tentou entrar em contato inúmeras vezes com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano Sustentável de Nova Friburgo, tanto por e-mail quanto por telefone. As perguntas feitas por ((o))eco tinham como objetivo esclarecer a visão da prefeitura sobre as RPPNs e a possibilidade de fomentá-las através do repasse de parte do ICMS aos rppnistas. Tentativas de contato também foram feitas com o prefeito eleito Johnny Maicon (Republicanos-RJ), mas também não houve retorno.
Atualmente, apenas três municípios do estado do Rio de Janeiro possuem leis específicas para o repasse de parte do imposto aos proprietários de RPPNs: Varre-Sai, Rio Claro e Aperibé.
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“É muito importante que a gente continue a ter esse apoio para as atuais e para as novas RPPNs, porque nós temos um potencial muito grande. As áreas protegidas voluntariamente hoje no Rio são proporcionalmente muito pequenas e aqui em Nova Friburgo nós temos um potencial gigantesco em termos de possibilidade de preservação em áreas privadas”, ressalta Bernardo. “A gente precisa ter a parceria do órgão público, do governo, traduzido nos órgãos ambientais, para poder avançar na preservação do meio ambiente”, acrescenta.
“O caminho hoje para facilitação da criação de RPPNs é você fazer o máximo para desburocratizar e desonerar os proprietários que tenham esse interesse”, completa Bernardo.
César faz coro à fala e diz mais, que não basta apenas juntar os rppnistas, mas é preciso multiplicar essa ideia da unidade de conservação privada com outros interessados na preservação da natureza. “Sejam pessoas que estudam, pessoas que gostam, acho que tem uma comunidade muito grande interessada na preservação e que podemos motivá-los a nos ajudar também”, comenta César.
Potencial no estado do Rio
Um estudo encomendado pelo Programa Estadual de RPPNs e desenvolvido pelo Instituto Terra de Preservação Ambiental (ITPA) aponta que o potencial para criação de novas reservas no estado ainda é grande. De acordo com o levantamento, existem pouco mais de 568 mil hectares de remanescentes de Mata Atlântica no estado ainda não protegidos por nenhum tipo de unidade de conservação, o que equivale a cerca de 13% do território fluminense.
O estudo identificou também as quatro Regiões Hidrográficas com os maiores índice de áreas prioritárias para conservação – Guandu, Piabanha, Baía de Guanabara e Baixo Paraíba do Sul – e os principais municípios que seriam estrategicamente os pontos focais para atuação do projeto de RPPNs. No mapeamento foi identificado um território de 220.460 hectares distribuído em 16 municípios com potencial e relevância para criação de RPPNs.
Os municípios de Petrópolis, Teresópolis, Sumidouro e Sapucaia, na Região Hidrográfica de Piabanha, são os que concentram a maior extensão em hectares de áreas naturais remanescentes sem a proteção de unidades de conservação: 70.255 hectares.
A coordenadora-executiva do projeto de RPPNs do estado, Roberta Guagliardi, reforça que a linha de atuação de sensibilização para criação é uma das mais importantes do programa. “A gente percorre o estado divulgando o que é RPPN, tirando dúvidas. A gente já realizou mais de 104 palestras em 64 municípios, dos 92 do estado. Eu acho que essa linha de fomento à criação tem que continuar, para impulsionar novas reservas”, comenta. “A gente tem esse potencial e ainda é possível criar bastante RPPN no estado”, conclui a coordenadora.
Dono de duas reservas vizinhas no município de Nova Friburgo, Bernardo sonha com o dia em que haverá um corredor de RPPNs e unidades de conservação públicas para garantir a proteção dos remanescentes da Mata Atlântica. “Nós aqui, na Reserva Ecológica do Rio de Lumiar, nós estamos no coração da Mata Atlântica da região serrana do estado do Rio. Nós estamos na RPPN, nós estamos dentro do perímetro da APA Macaé de Cima, nós estamos no entorno do Parque Estadual dos Três Picos . Isso mostra os múltiplos interesses para que essa área seja preservada. E a criação de um mosaico de RPPNs aqui na região, que pode ser em áreas contíguas ou não, mas áreas que sejam relativamente próximas e possam apontar para que essas áreas no caminho possam eventualmente se incorporar, isso pode trazer um grande potencial para preservação aqui da região. Eu tenho um sonho, que é o sonho de ver essa área com uma preservação mais consolidada e acho que as RPPNs têm um papel muito grande para colaborar com a gestão pública nesse processo”, aposta o médico rppnista.
“Pode ser um pequeno terreno, desde que tenha uma proteção. E acho que várias pessoas conseguindo proteger, preservar mais, você tem a ligação dessas reservas, que faz com que os animais possam circular de uma área para outra”, reforça César, que também acredita no potencial de multiplicação das reservas, desde que o poder público apoie os proprietários e fomente a iniciativa.
Estratégia fundamental para Mata Atlântica
De acordo com dados da Fundação SOS Mata Atlântica, cerca de 80% dos remanescentes de toda Mata Atlântica estão dentro de propriedades privadas. O número deixa claro porque as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) são uma estratégia fundamental para conservação do pouco que sobrou do bioma, estimado em aproximadamente 12% de sua cobertura original.
Dezoito estados brasileiros já possuem legislações próprias para implementação das reservas particulares, mas destes apenas dez de fato aplicam as respectivas regulamentações no reconhecimento de RPPNs em seus territórios. Além do Rio, estão na lista Alagoas, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Santa Catarina e São Paulo.
“É um ato voluntário nosso de querer uma reserva, mas o fato de colocar ela para sempre protegida, feita em cartório, nos dá a garantia de que, se eu vender, se eu morrer, isso vai ficar para sempre. O planeta vai ter essa reserva para sempre”, comemora o rppnista fluminense César Raibert.
RPPNs como ferramenta de restauração florestal
Além de proteger as florestas remanescentes, as reservas privadas também podem ajudar a recuperar áreas degradadas. De acordo com um decreto estadual publicado em 2017 (nº 40.909/2017), é possível criar RPPNs também em áreas destinadas à restauração florestal, desde que essas não ultrapassem 30% da área total da unidade de conservação.
Na RPPN Rio Bonito de Lumiar, Bernardo testemunha a regeneração natural de uma antiga área de pasto, hoje uma capoeira em fase de crescimento para se tornar uma floresta. Em outra porção da reserva, em parceria com a cervejaria Lumiarina, foi iniciado um reflorestamento com mudas nativas.
Na RPPN Raibert, César também investiu no reflorestamento dentro da sua propriedade em Lumiar. No seu caso, a recuperação de um trecho de mata ciliar do rio Macaé. “Quando eu comprei [o imóvel], havia floresta na parte mais alta do sítio, de difícil acesso, mas essa parte aqui toda, inclusive beirando o rio, era pasto e lavoura, o que dava muita erosão. A gente perdia muita terra com as enchentes. Então a primeira coisa seria plantar e recompor a mata ciliar. Foram mais de mil árvores que eu plantei, em toda a extensão do rio Macaé”, conta o dono da RPPN Raibert.
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O post “Reserva particular, patrimônio coletivo” foi publicado em 17th December 2020 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte ((o))eco