Pessoas refugiadas e migrantes venezuelanas transferidas para o abrigo Rondon 2, em Boa Vista (RR), tiveram uma surpresa natalina. Na entrada do espaço, um grande presépio feito de materiais recicláveis que seriam jogados no lixo levou ao abrigo o espírito de Natal .
Os presépios de Natal em residências e espaços públicos são uma tradição na Venezuela. Mesmo em uma situação de necessidade de proteção internacional e falta de recursos, três moradoras do abrigo decidiram construir seu próprio presépio com os materiais utilizados no abrigo.
Trabalhado durante um mês, as venezuelanas Marileth Aellano, Nieves Gutierrez e Gerinez Perez coletaram, limparam e arranjaram os materiais recicláveis para criar a obra inspirada em memórias e esperanças. Trabalharam noite e dia no projeto até, finalmente, concluí-lo poucos dias antes do Natal.
“O Natal é uma data muito especial na Venezuela, cheia de cores e alegria”, disse Nieves, de 45 anos, a coordenadora da ação. “Quando as outras pessoas do abrigo viram o que estávamos fazendo, cada dia havia mais envolvidos trazendo copos e marmitas lavados para a nossa maquete. O melhor foi ver as crianças alegres e ansiosas para ver o presépio finalizado”.
Nieves está no Brasil desde julho, com outros dez membros de sua família, incluindo seu filho e seus irmãos, sobrinhos e pais. Há dois meses, Nieves está morando no Rondon 2, conhecido como “Abrigo de Interiorização” por ser o local em que as pessoas que farão parte do Programa de Interiorização da Operação Acolhida esperam o dia da viagem.
Operado pelo governo federal com assistência de Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), outras agências da ONU e sociedade civil, o programa de interiorização, ou realocação voluntária, já transferiu mais de 23 mil pessoas venezuelanas para 24 estados brasileiros e o Distrito Federal.
O Rondon 2, com quase 700 moradores temporários que chegam e partem, é um dos 12 abrigos administrados pelo ACNUR por meio da Associação Voluntários para o Serviço Internacional (AVSI) e outras instituições parceiras no estado de Roraima.
“O fato de ter esses elementos culturais dentro do abrigo, como o presépio, tornam essa estadia um pouco mais leve no processo até o dia da viagem”, explicou Shayla Nascimento, assistente de campo da unidade de interiorização do ACNUR.
Quando perguntadas quais são seus sonhos para 2020, as três mulheres respondem quase em uma só voz: “poder morar em algum lugar do Brasil para ter mais estabilidade, e que meus filhos possam estudar. Isso tudo é pelos nossos filhos”.
Parceria premiada
O ACNUR trabalha em parceria para responder às diversas demandas emergenciais. Desde junho de 2018, a Associação Voluntários para o Serviço Internacional (AVSI) atua em parceria com a agência das Nações Unidas, coordenando seis abrigos para venezuelanos em Roraima — com mais de 5,6 mil pessoas.
A AVSI teve um papel determinante no apoio à iniciativa do presépio das venezuelanas. Além de gerir o abrigo, a associação colaborou doando os materiais necessários, além de orientar e motivar as mulheres participantes.
Iniciativas como esta e os casamentos coletivos realizados nos abrigos, em parceria com a Justiça Itinerante, o Instituto Brasil do Bem e os cartórios do 1º e 2º Ofícios de Boa Vista, garantiram em outubro o segundo lugar à AVSI no Prêmio ACNUR de Inovação para ONGs 2019, entre 270 inscritos.
O prêmio reconhece esforços e realizações de uma prestação inovadora de serviços a refugiados e outras pessoas sob o mandato do ACNUR.
“É um reconhecimento por todo nosso trabalho. Trabalhamos em uma resposta humanitária muito desafiadora e, com o prêmio, é um indício que estamos no caminho certo”, disse Heli Mansur, gerente especial da AVSI em Roraima.
Em 2020, a AVSI passará a coordenar mais dois abrigos, e planeja aumentar o corpo de funcionários em 66%, chegando a 150 – atualmente são 95 trabalhadores, sendo que 90 deles estão em abrigos.
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