Como o mundo inteiro já sabe, o jornalista britânico Dom Phillips (que contribuía para o The Guardian e morava em Salvador) e o indigenista Bruno Pereira “desapareceram” na Amazônia no dia 5 de junho, penúltimo domingo, enquanto trabalhavam (Bruno iria se reunir com lideranças indígenas; Dom estava escrevendo o livro Como Salvar a Amazônia?).
Hoje as informações sobre os corpos encontrados estiveram muito confusas . Durante o dia, foi dito que os corpos estavam numa árvore, mas já foram desmentidas (ou já foi dito que era preciso esperar a perícia). O excrementíssimo presidente da república afirmou que havia indícios de que “maldades” tinham sido feitas com os corpos. Mas até agora não há confirmação. Imaginem como as famílias devem estar se sentindo.
Aliás, é revoltante que ninguém do governo tenha entrado em contato com as esposas de Dom e Bruno, Alessandra Sampaio e Beatriz Matos, respectivamente. Beatriz, inclusive, é servidora pública e antropóloga. E a primeira declaração de Bolso foi no sentido de culpá-los, inventando que eles tinha partido numa “aventura” , quando estavam ali a trabalho. É que o miliciano que cumpre uma carga horária de menos de 3 horas por dia não sabe o que é trabalho.
É preciso lembrar outras falas de Bolsonaro também. Durante a campanha, Bolso avisou que não deixaria um centímetro quadrado a mais de terra para os indígenas. No seu primeiro pronunciamento antes do segundo turno das eleições de 2018, ele disse: “Vamos botar um ponto final em todo o ativismo no Brasil”. Ninguém deu atenção a esse discurso criminoso e autoritário. A execução de Bruno Pereira e Dom Phillips veio 3,5 anos depois.
Nesses 3,5 anos de completo desgoverno (foi preciso ser acionado judicialmente para que as forças nacionais dessem início às buscas de Dom e Bruno!), Bolso acabou com a fiscalização, incentivou a invasão de suas terras, motivou o garimpo, a pesca e a caça ilegais. Escalou para ministro do meio ambiente Ricardo Salles, um inimigo confesso do meio ambiente, que declarou naquela reunião fatídica de abril de 2020: “Precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de Covid, e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas”.
É o que Bolso vem fazendo com a Amazônia e com outros lugares imprescindíveis da natureza (que ele quer transformar em resorts turísticos com cassinos, como Fernando de Noronha e Jericoacoara): passando a boiada.
Como aponta a jornalista Eliane Brum num ótimo artigo para o New York Times, desde que Bolso chegou ao poder, ele justifica a exploração da Amazônia com um discurso nacionalista. Ao eliminar a fiscalização, ele deu sinal verde para que milicianos matem indígenas, queimem a floresta, e até executem um jornalista inglês e um servidor da Funai. Em 2019, numa conferência de imprensa, quando Dom Phillips perguntou a Bolso sobre crimes ambientais, o presidente miliciano respondeu: “A Amazônia é do Brasil, não sua”.
Segundo o Greenpeace Brasil , o desaparecimento de Dom e Bruno é apenas a ponta do iceberg, já que a ausência e a omissão do governo vem incentivando o aumento de crimes ambientais. Atividades criminosas como a pesca ilegal, a extração de madeira, o garimpo e o narcotráfico se alastram pela região.
O Vale do Javari, na fronteira com o Peru e a Colômbia, onde Dom e Bruno “desapareceram”, é a segunda maior terra indígena do Brasil. A região tem 85 mil km2 (maior que a Áustria) e conta com 6.300 indígenas de 26 grupos diferentes.
Dois meses antes, em abril, a Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari) relatou à Funai e à Força Nacional a caça e pesca ilegais dentro do território indígena. Havia pelo menos seis grupos de caçadores em embarcações de médio porte. Algumas tinham oito integrantes armados. A Univaja indicou o local e muitos dos nomes dos integrantes das quadrilhas. Um deles é o de “Pelado”, suspeito do desaparecimento de Bruno e Dom, que foi preso semana passada. Ele vinha ameaçando indígenas desde 2018.
A sensação de desespero não é unicamente das famílias de Dom e Bruno. É de todos nós. Ninguém mais aguenta o Brasil de Bolsonaro.
O post “QUEREMOS JUSTIÇA PARA DOM PHILLIPS E BRUNO PEREIRA” foi publicado em 13th June 2022 e pode ser visto originalmente na fonte Escreva Lola Escreva