O grupo Atlas, que faz parte da Atlas Lithium Corporation , uma empresa norte-americana com sede na Flórida, está nas últimas etapas do seu projeto para começar a extração de lítio no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais.
Enquanto afirma que pretende produzir “lítio ambientalmente responsável” , a Atlas Lítio Brasil tem requerimentos que incidem sobre uma área de proteção ambiental, a APA Chapada do Lagoão, em Araçuaí.
Segundo o levantamento mais recente do Observatório dos Vales e do Semiárido Mineiro, da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), a Atlas no Brasil tem 85 processos minerários registrados na região do semiárido mineiro. Deste total, 71 são para extração de lítio.
Este projeto , em fase de implantação, ameaça a área que é meio de vida e subsistência de comunidades tradicionais, especialmente quilombolas, e de pequenos produtores rurais, ambas já afetados pela escassez hídrica na região.
Os projetos “Atlas Lithium” ganharam, em 6 de junho de 2023, tratamento como empreendimento prioritário do governo de Minas Gerais para explorar lítio, quartzo e minério de ferro. A Atlas Lítio Brasil foi fundada em 2013, mas foi uma filial criada em 03 de agosto de 2023 que recebeu um enquadramento da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sede) de MG como “prioritário” dois meses antes mesmo da sua fundação.
É com esse CNPJ de 2023 que o grupo pediu o licenciamento ambiental no governo mineiro para extração, antes de ter a concessão de lavra do governo federal, e que concentra o registro de suas operações na Fazenda Calhauzinho em Araçuaí, uma das cidades alvo da cobiça internacional pelo lítio, que é usado, principalmente, na fabricação de baterias de carros elétricos.
O mesmo aval oficial do governo mineiro na área econômica também determinou que os processos de licenciamento ambiental do grupo Atlas deveriam “ser igualmente prioritários”.
A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) afirma que o processo de licenciamento avalia os impactos ambientais do empreendimento e as medidas mitigadoras e compensatórias propostas, não importando a data do registro da empresa.
“A questão do registro formal da empresa não está vinculada à análise do licenciamento ambiental, que foca exclusivamente na viabilidade ambiental do projeto”, disse a Semad em nota ao Observatório da Mineração.
Procuradas para comentar a concessão da prioridade antes da criação da empresa e os avais dados para a Atlas, as demais secretarias de Desenvolvimento Econômico (Sedes) e Social não responderam aos pedidos de esclarecimento da reportagem até o momento.
Desde 2017, quando a Superintendência de Projetos Prioritários (Suppri) passou a operar, centenas de projetos de mineradoras receberam tratamento VIP de vários governos de Minas Gerais, com o objetivo principal de acelerar a aprovação de licenças. O arcabouço legal que permite a classificação de projetos prioritários para o governo de MG inclui controvérsias desde que as premissas foram criadas e validadas pela Assembleia do Estado. Para ser considerado prioritário um projeto precisa possuir “relevante função ambiental, social e econômica”. No entanto, o histórico de decisões aponta que o fator econômico tem preponderado enormemente sobre o socioambiental.
O projeto da Atlas está inserido na corrida de empresas estrangeiras no Jequitinhonha que tem provocado impactos negativos nas comunidades locais, como mostrou o Observatório da Mineração em outubro de 2024. A reportagem já citava o projeto da Atlas, que diz ter “o maior em tamanho e amplitude” projeto de exploração de minerais estratégicos no Brasil.
Foto de destaque: Isis Medeiros
Emaranhado de empresas da Atlas inclui nomes similares e sedes em paraíso fiscal
Outras duas empresas do grupo Atlas receberam prioridade do governo Romeu Zema: a Apollo Resources, companhia estrangeira com sede no paraíso fiscal das Ilhas Marshall no Pacífico Norte e a Júpiter Gold Corporation e sua subsidiária brasileira, a Júpiter Mineração.
O grupo Atlas concentra um emaranhado de diversas empresas de mineração no Brasil, vinculados ao mesmo sócio, Marcelo Figueiredo Fogaça.
Além da Atlas Lítio Brasil, consta ao redor de Fogaça a “Atlas Lithium”, criada em julho de 2024 também com sede na Ilhas Marshall, a “Atlas Recursos Minerais”, igualmente de julho de 2024, a “Athena Resources Corporation”, criada em novembro de 2023 e a “Lithium Valley Mining Corporation”, ambas domiciliadas no mesmo endereço nas Ilhas Marshall, a “Athena Litio Ltda” e a “Mineração Júpiter” – diferente da Júpiter Gold -, as duas últimas com sede no Brasil.
São várias empresas com nomes similares mas CNPJ’s diferentes e domiciliadas em alguns casos no Brasil e outros no paraíso fiscal das Ilhas Marshall, sendo boa parte criada em 2023 e 2024.
O Observatório da Mineração tentou, desde o fim de fevereiro, diversos contatos com vários emails de representantes da Atlas. Deixamos recado em telefone fixo e celulares, mas não obtivemos qualquer resposta de seus representantes no Brasil ou fora do Brasil sobre os assuntos tratados nesta matéria. O espaço segue aberto para manifestação.

Licenças federais e estaduais incluem uma guia de utilização da ANM, procedimento questionado no TCU
A licença operacional para a Atlas foi concedida em 25 de outubro do ano passado por dez anos para exploração de 1,5 milhão de toneladas/ano de lítio. E já ganhou um pedido de expansão da área de extração apenas um mês depois de ter sido expedido o certificado da primeira autorização com o aval do Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM). O novo protocolo na Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) do processo foi registrado em 22 de novembro de 2024.
Na ANM, o processo minerário que é citado na liberação operacional do governo de Minas Gerais está na fase de requerimento de lavra. 11 meses antes da licença operacional de outubro de 2024, a empresa conseguiu uma guia de utilização na agência reguladora do governo federal para extrair 300 mil toneladas de lítio.
Como revelou com exclusividade o Observatório da Mineração, o uso desta brecha pela ANM, que permite o uso das guias antes mesmo do aval ambiental, está sendo contestada por sua ilegalidade em uma auditoria do Tribunal de Contas da União.
De acordo com a Semad, em nota, “o empreendimento já possui a licença para as fases de instalação e operação, e a ampliação da licença foi solicitada em 20 de dezembro de 2024, estando em análise. A Semad realizou vistoria técnica em 11 de outubro de 2023 e, recentemente, em 20 de fevereiro de 2025, a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) visitou as áreas de ampliação para as avaliações iniciais”.
Embora não tenham respondido ao Observatório, em outubro de 2024 o CEO da Atlas Lithium, Marc Fogassa, comentando a obtenção da licença de operação , afirmou que isso demonstrava “um compromisso inabalável com o desenvolvimento de uma operação ambientalmente responsável e sustentável” no Jequitinhonha. Rodrigo Menck, membro do Conselho de Administração da empresa, disse que a planta de processamento de lítio da Atlas é “projetada para possivelmente atingir a menor pegada ambiental em sua classe”.
A Atlas recebeu, em janeiro deste ano, a recomendação do banco de investimentos americano H.C. Wainwright como uma das principais escolhas para 2025 . A análise diz que a Atlas deve começar a produção este ano e que a empresa pode “se tornar um participante significativo na cadeia global de suprimentos de lítio”. Além disso, o banco citado espera que “as operações de baixo custo da Atlas no Brasil criem lucros significativos de longo prazo, ao mesmo tempo em que oferecem diversidade geopolítica para grandes empresas de lítio”.
A Atlas recebeu investimentos significativos de US$ 50 milhões de dólares das chinesas Chengxin e Yahua e mais US$ 30 milhões de dólares da japonesa Mitsui.
Projeto da prefeitura quer reduzir limites da APA e comunidades foram ignoradas no processo
Existe um projeto da prefeitura de Araçuaí para reduzir a área da APA Chapada do Lagoão e potencialmente favorecer mineradoras, o que foi questionado pelo Ministério Público de Minas Gerais, ambientalistas e pesquisadores.
O projeto está em tramitação e as comunidades quilombolas que serão impactadas por essa mudança e pelo interesse minerário de empresas como a Atlas não foram consultadas até o momento, como exige a lei.
No fim de 2024 houve uma tentativa do governo de Romeu Zema (Novo), via Decreto , de favorecer mineradoras e atropelar os direitos dos povos originários e comunidades tradicionais ao tentar determinar como deve funcionar a consulta prévia, livre e informada (CPLI) em Minas Gerais.
O decreto atribuía ao próprio empreendedor a condução da consulta em projetos da iniciativa privada, o que, segundo a Defensoria Pública da União (DPU), poderia comprometer a imparcialidade e pressionar os atingidos. Esse decreto foi suspenso no Supremo Tribunal Federal em janeiro deste ano.
Fonte
O post “Projeto do grupo americano Atlas para explorar lítio no Jequitinhonha recebeu prioridade do governo Zema em MG antes do registro da filial da empresa” foi publicado em 18/03/2025 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte Observatório da Mineração