Plantas, animais, uma corrente marinha que corre ao longo das costas chilena e peruana, uma geleira na Groenlândia, uma cordilheira na Antártica, a universidade de Berlim e até mesmo uma cratera na lua recebem o seu nome. Hoje, no entanto, além de especialistas ou fãs da história da ciência, poucos se lembram do naturalista prussiano Alexander von Humboldt. Em 2019 comemorou-se o 250º aniversário do nascimento deste explorador, geógrafo e cientista que fez observações e elaborou reflexões ainda fundamentais em muitos campos da pesquisa, da geologia ao estudo do clima.
Quase desconhecido hoje, Humboldt era uma celebridade em sua época, a ponto de seus contemporâneos o chamarem de homem mais famoso do mundo depois de Napoleão. Nasceu em Berlim em 14 de setembro de 1769, em uma família aristocrática rica e morreu na mesma cidade, em 1859. Durante sua vida, Humboldt teve relações com os homens mais importantes de sua época, de escritores como Goethe ao presidente americano Thomas Jefferson.
Ele era uma figura eclética, com muitos interesses. Os estudiosos concordam que sua contribuição mais importante é ter compreendido a profunda interconexão dos sistemas naturais, do clima à natureza e às sociedades humanas.
Como o historiador alemão Andrea Wulf escreve em seu livro A invenção da natureza: A vida e as descobertas de Alexander von Humboldt, devemos a Humboldt o conceito de “natureza” como o entendemos hoje. Ou seja, as origens do pensamento ecológico estão nas páginas de seu Cosmos: Um Esboço da Descrição Física do Universo, obra monumental em cinco volumes que publicou entre 1845 e 1862.
A celebridade de Humboldt começou a ser construída entre 1799 e 1804, quando ele empreendeu uma fantástica viagem às antigas colônias espanholas do Peru e de Nova Granada (atuais Equador, Colômbia e Venezuela). Humboldt foi o primeiro naturalista-viajante, pesquisador que saiu ao mundo em busca de espécimes da flora e da fauna (e da geologia) para criar coleções que viriam a formar boa parte dos acervos de pesquisa dos grandes museus de história natural europeus (no caso de Humboldt, suas coleções estão na Universidade Humboldt de Berlim).
O mais perto que Humboldt chegou do Brasil foi no alto rio Orinoco, onde descobriu que o canal Casiquiare permitia uma ligação entre as bacias do Orenoco e do rio Negro. Humboldt não chegou a penetrar nas selvas da antiga colônia do Brasil por não ter conseguido obter permissão da metrópole portuguesa para tanto. Apesar disso, encantado com a majestade e a exuberância amazônicas, foi Humboldt que começou a usar o termo Hileia para denominar a maior floresta equatorial do planeta.
O exemplo de Humboldt foi seguido por uma legião de naturalistas-viajantes ao longo do século 19, que exploraram as selvas, desertos, cordilheiras e litorais das Américas, África, Ásia e Oceania.
Apenas para citar o exemplo brasileiro, as aventuras de Humboldt influenciaram e impulsionaram as viagens de Auguste de Saint-Hilaire, Spix e Martius, Wied-Neuwied e tantos outros. O naturalista dinamarquês Peter Lund, por exemplo, conta em suas cartas como a leitura dos relatos de viagem de Humboldt foi decisiva para a sua vinda ao Brasil em 1835, onde descobriu os primeiros fósseis do tigre dentes-de-sabre ao lado dos restos dos homens de Lagoa Santa (MG) – e de onde nunca mais saiu, morrendo em Minas Gerais em 1880.
Uma das conquistas mais famosas e quase lendárias de Humboldt foi a subida, na companhia do botânico francês Aimé Bonpland, ao vulcão Chimborazo, no Equador, considerada na época (com seus mais de seis mil metros) a montanha mais alta do mundo. Os dois exploradores documentaram mudanças na vegetação durante o empreendimento, à medida que a altitude aumentava, das florestas tropicais à base da montanha, até o ponto em que as árvores deram lugar a rochas e líquens. Dessa maneira, lançaram as bases para a ideia de que o princípio que molda as diferentes comunidades de plantas e animais em diferentes altitudes e latitudes é o clima, um conceito que não era de todo óbvio na época.
Embora o trabalho de classificação de Humboldt e Bonpland não seja preciso pelos padrões atuais, a comparação ainda serve para estabelecer uma conclusão básica: em 200 anos os efeitos induzidos pelas mudanças climáticas são visíveis e impressionantes.
Na era do Antropoceno, ou seja, os últimos 250 anos, período geológico mais recente na história da Terra durante o qual a humanidade se tornou o principal agente modificador do clima, da geografia e da vida no planeta, torna-se cada vez mais inevitável enfrentar o impacto dramático do homem no meio ambiente e na natureza.
Neste sentido, o conteúdo central do pensamento de Humboldt parece premonitório: tudo está conectado. Na rede de relacionamentos que distingue a vida no planeta Terra, nada do que fazemos permanece sem consequências.
Leia Também
Site reúne informações sobre a viagem do naturalista Alexander Von Humboldt
Vida das Aves: Humboldt e eu escalando o pico das Agulhas Negras
O post Por que um cientista nascido há 250 anos ainda é relevante no século 21? apareceu primeiro em ((o))eco .
O post “Por que um cientista nascido há 250 anos ainda é relevante no século 21?” foi publicado em 12th January 2020 e pode ser visto originalmente na fonte ((o))eco