DO OC – O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, mais uma vez deu exemplo e se destacou na defesa do fim da economia fóssil. Nesta quarta-feira (20/9), em seu discurso na Cúpula da Ambição Climática , em Nova York, Petro reforçou o papel que desempenhara na Cúpula da Amazônia , realizada no mês passado em Belém, e foi além: lembrou que seu país é o quinto maior exportador de carvão do mundo, e um grande exportador de petróleo – e que nada disso justifica a insistência nesse modelo econômico.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, e o presidente do Chile, Gabriel Boric, também foram vozes contrárias aos fósseis. Já o Brasil, representado pela ministra Marina Silva (Meio Ambiente e Mudança do Clima), anunciou finalmente a correção da meta de redução de emissões do país, desfazendo a “pedalada climática” do governo Bolsonaro. Marina leu discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que adoeceu e não pôde comparecer.
O encontro, na Semana do Clima de Nova York, foi organizado por Guterres para que países, empresas e governos subnacionais pudessem mostrar soluções para a crise do clima. Países que tinham algo a anunciar em termos de aumento de ambição foram convidados a falar na abertura. Sintomaticamente, dos dez maiores emissores do planeta, apenas três – Brasil, Canadá e União Europeia – compareceram.
“As pessoas poderiam dizer ‘o Petro é um suicida, o país vive disso’. Mas o país não pode viver disso, porque petróleo, gás e carvão na atmosfera significam que ninguém mais poderá viver no planeta – nem as pessoas do meu país”, afirmou o presidente colombiano, que começou seu discurso lembrando que 60% das exportações da Colômbia são provenientes de combustíveis fósseis, o alicerce da economia há 40 anos. “Apoio a tese de acelerar as metas, o que significa uma mudança nas estruturas econômicas do meu próprio país. Mas não é apenas no meu país, é do mundo. Em torno do petróleo, carvão e gás, há um negócio. Move-se um imenso capital, que chamo de capital fóssil”, discursou.
Destacando o lobby das grandes petrolíferas, Petro criticou o peso desses interesses na definição de metas climáticas, defendendo que o objetivo real de todos os países deveria ser “tender a zero em curto prazo a produção e a demanda de petróleo, carvão e gás”.
O presidente colombiano afirmou ainda que “as grandes chaminés” que precisam se apagar estão nos Estados Unidos, na Europa, na China e na Índia, jogando luz também sobre a necessidade de responsabilização de grandes emissores de países em desenvolvimento (e provavelmente causando arrepios na diplomacia brasileira). Ele lembrou que a transição demanda dinheiro e redirecionamento de investimentos para a energia limpa, e sustentou que a maioria desses recursos precisa vir de fundos públicos, apresentando mais uma vez sua proposta de abatimento da dívida pública para financiamento da ação climática.
O secretário-geral da ONU abriu o evento com uma de suas cada vez mais previsíveis (nem por isso menos verdadeiras) frases de efeito. “A humanidade abriu os portões do inferno”, disse, destacando as décadas de atraso para a substituição dos fósseis e demandando, mais uma vez, o fim dos subsídios à produção de petróleo, gás e carvão.
Gabriel Boric, presidente do Chile, assim como Petro, denunciou como os interesses das grandes empresas petrolíferas atrasam a ação climática. “Ainda que, aqui, declaremos nossas boas intenções, se não formos capazes de submeter esses grupos às vontades das comunidades nacionais, expressas pelas lideranças e ativistas aqui presentes, não vamos chegar às nossas metas. A crise climática é a crise dos combustíveis fósseis. Então, temos que parar de queimar combustíveis fósseis – e isso significa que também precisamos reagir ao greenwashing que essas empresas realizam permanentemente”, discursou.
Já o destaque da participação brasileira foi o anúncio da correção da meta climática do país. O discurso de Lula, lido por Marina Silva, comunicou à comunidade internacional a retomada da ambição apresentada em 2015. Em 2020, o governo Bolsonaro havia atualizado a NDC brasileira (na sigla em inglês para Contribuição Nacionalmente Determinada) e, através de um golpe contábil, diminuído sua ambição, violando as regras do Acordo de Paris. A mobilização da sociedade civil, incluindo o processo movido por seis jovens ativistas na Justiça , apoiado tecnicamente pelo OC, denunciou a pedalada e cobrou do governo Lula sua resolução.
“À custa de muita pressão da sociedade civil e de uma ação na Justiça, o Brasil finalmente anunciou à comunidade internacional que corrigirá a infame pedalada climática e retomará a ambição da NDC de 2015″, disse Stela Herschmann, especialista em Política Climática do Observatório do Clima. “É muito pouco do ponto de vista da emergência climática e fica muito aquém do que o Brasil poderia entregar em cortes de emissões em 2030.Porém, dada a tragédia dos últimos quatro anos e do tempo de ação climática que o país perdeu ao eleger um governo negacionista em 2018, essa volta ao passado é um passo adiante, especialmente considerando a vergonhosa falta de ambição de outros grandes poluidores.”
O discurso de Lula frustrou, porém, por não fazer referência ao limite absoluto de emissões, de 1,2 bilhão de toneladas de CO2e em 2030, como combinado na resolução do CIM (Comitê Interministerial para Mudança do Clima) que determinou a correção da pedalada. Sem uma referência a emissões absolutas, o Brasil ainda corre risco de “pedalar” nas metas sempre que atualizar seu inventário de emissões.
“Esperamos que, quando o Brasil entregar a atualização da NDC à Convenção do Clima, nos próximos dias, ela contenha a referência a um teto absoluto de emissões, de forma a evitar confusões futuras com mudanças em base de cálculo”, disse Herschmann. (LEILA SALIM)
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