Depois de revelarmos com exclusividade como a Vale e a CSN estão expondo os seus trabalhadores ao risco de contágio pelo coronavírus ao manter as operações funcionando e os funcionários aglomerados, perguntamos às outras maiores mineradoras do país o que elas estão fazendo para conter a pandemia e preservar a saúde dos seus “colaboradores”.
Afinal, a mineração está
espalhada de norte a sul do Brasil e concentra centenas de milhares de
trabalhadores em muitas cidades que vivem em função das mineradoras. São as
empresas que ditam o ritmo da vida nesses lugares, são elas que empregam boa
parte das pessoas e são elas que mandam na política local.
Das 14 mineradoras procuradas, mais da metade ficou em silêncio. A Anglo American, que tem a principal operação em Conceição do Mato Dentro (MG) e opera um dos maiores minerodutos do mundo, que corre por 529 quilômetros e 33 municípios até chegar a São João da Barra (RJ), disse que não iria comentar.
Só a Anglo American tem 2,2 mil
empregados próprios e conta com uma capacidade de produção atual de 26,5
milhões de toneladas de minério de ferro por ano.
Sequer responderam aos pedidos da
reportagem: ArcelorMittal, Usiminas, Nexa, CBMM, Alcoa e Cia. Brasileira de
Alumínio (CBA).
Responderam: Kinross, AngloGold
Ashanti, Gerdau, Mosaic Fertilizantes, Hydro e Serabi Gold. A Jaguar Mining
disse que a resposta ficaria a cargo do Instituto Brasileiro de Mineração
(IBRAM), que representa mais de 130 mineradoras e também foi procurado pela
reportagem.
De acordo com o IBRAM, “todas as
empresas associadas estão agindo para proteger a saúde e a segurança de seus empregados,
bem como das demais pessoas que tenham contato com as empresas, como
fornecedores, comunidades e outros”.
Perguntei ainda ao International Council on Mining and Metals (ICMM), uma associação internacional dedicada à “mineração segura e sustentável” que tem entre as suas associadas a Vale, BHP, Hydro, Anglo American, Alcoa e AngloGold, como eles estavam acompanhando a situação.
De acordo com a declaração de Tom Butler, CEO da ICMM, encaminhada como resposta, o consórcio está “ajudando os seus membros a responder ao Covid-19 ao compartilhar as melhores práticas entre as associadas”. Leia na íntegra as respostas das mineradoras.
Entidades pedem a paralisação das atividades
Uma nota assinada por dezenas de organizações sindicais, estudantis, científicas, movimentos sociais e partidos políticos questiona a portaria do Ministério de Minas e Energia que considerou a mineração atividade essencial após a publicação das minhas duas reportagens sobre a Vale e a CSN .
De acordo com a nota , uma portaria não tem efeito para dar interpretação mais flexível do que as normas restritivas do Decreto 10.292/2020. “Os governos a nível municipal, estadual e federal que deveriam exigir mudanças quanto a essa situação, ora colaboram, ora se acovardam frente aos interesses econômicos das grandes mineradoras. Assim, junto com essas empresas, colocam a vida de seus trabalhadores, familiares e todo município em risco”, afirmam.
Para as organizações, passou da hora de ser garantido aos trabalhadores e trabalhadoras da mineração o direito ao isolamento social. “Exigimos a paralisação imediata das grandes mineradoras para barrar o vírus e salvaguardar nossas cidades”, afirma a nota .
Como mostrei anteriormente, a portaria, assinada em um sábado às 19:30, foi articulada entre o Ministério de Minas e Energia e o IBRAM. Questionado sobre o dia e hora em que a portaria foi publicada, após as reportagens, o MME respondeu que “isso nada mais revela do que o regime de atenção integral que o MME vem dedicando ao problema sanitário atualmente vivenciado pelo mundo”.
Esta semana, o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, Helder Salomão (PT/ES), pediu ao Procurador-Geral do Trabalho, Alberto Bastos Balazeiro, a anulação da portaria e a paralisação imediata das atividades de mineração enquanto a pandemia durar.
“Pode contar com a mineração”, diz a indústria
O IBRAM tem se agarrado à tese de que a mineração é uma atividade essencial, argumento criticado por especialistas. Questionado, o sindicato de mineradoras disse para mim que “na visão do IBRAM, os minérios precisam continuar a ser produzidos e fornecidos para as indústrias de transformação e para o agronegócio. Sem estes insumos, poderá haver repercussão em desabastecimento de equipamentos e produtos”.
Para tentar convencer a sociedade, o IBRAM acabou de lançar a campanha “A Mineração está com você!” , afirmando que a população “pode contar com a mineração” porque ela é “a indústria que produz insumo para todas as indústrias”.
À
reportagem, o IBRAM disse, no entanto, que “as operações devem seguir as
recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), das autoridades e a
legislação brasileira, sempre preservando a saúde e a segurança das pessoas”.
Para movimentos sociais , além de não cumprir com as tais recomendações, as mineradoras deveriam respeitar o direito ao isolamento social dos seus funcionários resguardando a estabilidade no emprego e a garantia de remuneração integral. Muitas empresas, como a CSN, se negam a negociar com os trabalhadores. Outras, como o nosso levantamento mostra, preferem ficar em silêncio.
Questionado, o IBRAM disse que as mineradoras estão “sempre receptivas ao diálogo com qualquer representante dos trabalhadores, das autoridades, das comunidades, dos municípios e outros. O desafio de superar a pandemia exige união e esforços do conjunto da sociedade”.
37,4
mil acidentes trabalhistas em 7 anos
Nota do MAM – Movimento pela Soberania Popular na Mineração lembra que o setor da mineração é “a principal protagonista de crimes socioambientais no país e é reconhecida pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) como um dos mais perigosos do mundo para o trabalho, proporcionando elevados índices de mortes e invalidez dos seus trabalhadores”.
Segundo dados da Frente Sindical Mineral, 37.478 acidentes trabalhistas foram gerados pelas mineradoras entre 2012 e 2018. Já o Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho (AEAT) de 2016, da Secretaria de Previdência, revelou que o setor da indústria extrativa mineral brasileiro mata 3 vezes mais que os outros setores.
Em Minas Gerais, principal estado extrativista do Brasil, o MAM e mais de 180 entidades e organizações civis assinaram uma “Plataforma Estadual de Emergência: Reivindicações ao governador Romeu Zema frente a pandemia do coronavírus ”.
O documento reivindica medidas
básicas do governo Romeu Zema (Novo) para as áreas de saúde, trabalho, redução
dos custos de vida e educação. Requer, ainda, que o governo adquira
Equipamentos de Proteção Individual (EPI), acelere os testes e os estenda a
todos que apresentem sintomas, dê assistência de saúde às comunidades rurais e
invista mais recursos no SUS.
No momento, Minas Gerais já registra 655 casos e 15 mortes por Covid-19. Em todo o Brasil, são 17.857 casos confirmados e 941 mortes . Os dados, no entanto, estão muito subnotificados em função do Brasil ser um dos países que menos realizou testes em sua população. Os relatos dos estados indicam que a situação real pode ser dezenas de vezes pior .
O post Perguntamos às maiores mineradoras do Brasil o que estão fazendo para evitar a pandemia. Metade ficou em silêncio. apareceu primeiro em Observatório da Mineração .
Fonte
O post “Perguntamos às maiores mineradoras do Brasil o que estão fazendo para evitar a pandemia. Metade ficou em silêncio.” foi publicado em 10th April 2020 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte Observatório da Mineração