Ontem vimos cenas deploráveis e inéditas de terroristas invadindo e destruindo o Palácio do Planalto, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Foi uma das maiores tentativas de golpe à democracia que o Brasil já viveu.
Durante toda a semana passada notava-se, entre os bolsonarentos, uma mudança de rumo. Em vez de acampamentos em frente a quartéis generais em várias cidades (acampamentos patrocinados pelo agronegócio e compostos em boa parte por militares reformados e familiares, e que foram removidos apenas hoje, em sua maioria), a palavra de ordem virou “guerra santa”. Em código, os idólatras do messias fujão mencionavam a “festa da Telma” (em vez de “selva”, palavra que milicos costumam usar como saudação).
Os bolsogolpistas achavam que, dando o pontapé inicial (invadindo as sedes dos três poderes), o exército iria finalmente agir, dando o golpe militar e instalando a tão pedida intervenção. No mínimo, as cenas de guerra seriam suficientes para que as forças armadas assumissem o poder, prendessem ou matassem o Lula, e decretassem estado de sítio. Os caminhoneiros ajudariam bloqueando estradas e parando o país. Para que tudo desse certo, pediam um ou dois milhões de “manifestantes” em Brasília. Foram uns 4 mil em quarenta ônibus fretados de todo o país.
Era pouca gente, mas tudo bem. Com os golpistas acampados e, principalmente, com a conivência das forças armadas e da polícia militar, essa gente seria suficiente. E foi. Primeiro a PM escoltou os golpistas até perto da Praça dos Três Poderes. Só faltou carregar no colo. Em seguida, com imensa facilidade, os terroristas derrubaram os obstáculos (acho que tinha três grades móveis lá) mantidos por uma dúzia de PMs, que tentaram responder com gás de pimenta (bala de borracha, jamais! Isso é só em protesto de professor ou no MST!). E da praça passaram a depredar e saquear os prédios pela frente. No caminho, agrediram uns oito jornalistas e roubaram seus equipamentos.
O governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), bolsonarista de carteirinha, nada fez para impedir a destruição anunciada. Seu secretário de segurança, o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, não estava em Brasília — estava em Orlando, de férias, e teve pelo menos uma reunião com seu ex-chefe Jair. Ibaneis mandou exonerar Anderson, que ainda pode ser preso, se voltar ao Brasil. Ibaneis pode ser impeachado. Hoje foi cassado por três meses (sua vice, mais bolsonarista ainda, ficou no lugar, mas Lula já havia decretado intervenção federal no DF). O MDB discute expulsar Ibaneis do partido.
Ontem Lula, em discurso duro , disse de Bolso: “Esse genocida não só provocou isso, não só estimulou isso, como, quem sabe, está estimulando ainda pelas redes sociais, lá de Miami”. Felizmente, Lula passou o domingo em Araraquara, SP, trabalhando, vendo o que poderia ser feito com a destruição da cidade causada pelas chuvas. Se tivesse estado no Palácio do Planalto, poderia ter sido assassinado pelos bolsogolpistas. Não haveria polícia para protegê-lo. Talvez os PMs participassem da execução.
A tentativa de golpe ontem em Brasília aconteceu dois anos e dois dias depois da invasão do Capitólio nos EUA, comandada por Trump. Há várias diferenças, lógico. Biden ainda não havia sido empossado quando o ataque ao Capitólio ocorreu; Lula, sim (um domingo antes). O Capitólio estava trabalhando, cheio de congressistas; o nosso Congresso, não (já que era um domingo e, além do mais, os deputados estavam em recesso). Lá invadiram e destruíram apenas um prédio; aqui, foram três. Lá houve cinco mortes; aqui, graças, nenhuma. Mas, o principal: lá a polícia tentou conter os terroristas; aqui, tirou selfie com eles.
Só no início da noite a Força Nacional conseguiu tirar os terroristas dos prédios e começar a prendê-los. Ontem foram 200. Hoje, mais 1.200. Os mesmos bolsogolpistas agora reclamam que assim (punindo), Lula não vai pacificar o país, e que eles estão sendo tratados como a Alemanha dos anos 30 (aquela que Bolso tanto admira, a ponto de inventar um avô nazista que lutou por ela) tratava seus desafetos. Deputados e senadores bolsonarentos — muitos dos quais instigaram a tentativa de golpe — pedem uma CPI contra “prisões ilegais”. Mas pelo jeito o que vai sair mesmo é uma CPI para investigar os atos golpistas, com poder de chegar até o mandante-mor, seu Jair.
Entretanto, a maior narrativa da extrema-direita agora é que foram esquerdistas infiltrados os autores do terrorismo. Os “manifestantes pacíficos” nunca quebraram ou roubaram nada! Pelo contrário, tentaram impedir e capturaram os infiltrados! Merecem ser condecorados. Óbvio ululante que ninguém cai nessa, mas essas mentiras deslavadas não são pra gente. São pra eles. Eles precisam seguir acreditando, contra todas as evidências, que são cidadãos de bem, não vândalos saqueadores que aniquilam patrimônio público e urinam e defecam em cima de móveis.
Ontem a democracia brasileira foi golpeada, mas sobreviveu. Tirando uma minoria, todo o país está revoltado com o que viu (até os terroristas, que negam tudo). A maior parte da mídia chamou os apoiadores de Bolso de golpistas, terroristas, criminosos, vândalos, não “manifestantes”. Eles precisam ser punidos, seus patrocinadores também. Devem ser presos e condenados a pagar o que destruíram. E aumentam as chances de Bolso ser preso, pois seus laços com os golpistas são óbvios (o editorial do Miami Herald , por exemplo, leva o título “Bolsonaro se esconde na Flórida enquanto apoiadores violentos fazem seu serviço sujo no Brasil”).
Eles perderam as eleições ano passado. E ontem perderam mais uma vez.
O post “ONTEM BOLSONARO PERDEU MAIS UMA VEZ. A DEMOCRACIA VENCEU” foi publicado em 9th January 2023 e pode ser visto originalmente na fonte Escreva Lola Escreva