Gustavo Barreto trabalha nas Nações Unidas há dez anos. Atualmente, faz parte da equipe da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) na Síria, atuando como Oficial de Informação Pública do ACNUR em Damasco, capital do país.
Em entrevista ao ACNUR no Brasil, ele contou sobre os desafios de trabalhar em uma das operações humanitárias mais complexas do mundo.
Leia a entrevista na íntegra a seguir.
Por que você se tornou um trabalhador humanitário?
Desde muito cedo eu tinha essa vontade, de uma forma ou de outra. Ainda adolescente, eu já participava de diversas iniciativas voluntárias. Acho que o resto foi uma consequência de não ter desistido de fazer o que eu gosto, que é estar onde as pessoas mais precisam.
Você trabalha no ACNUR há quanto tempo?
Depois de ter atuado no escritório do secretário-geral das Nações Unidas por dez anos, me juntei ao ACNUR em agosto deste ano, no meu primeiro posto internacional.
Toda a minha experiência na ONU foi decisiva para compreender a complexidade e importância da Organização, sobretudo da sua ação diplomática e trabalho humanitário.
Pode nos contar um pouco sobre o seu trabalho? Como é o seu dia a dia?
Eu moro na capital Damasco, onde está o maior escritório dos seis que o ACNUR possui na Síria. O setor de Informação Pública tem diversas funções na comunicação. A principal é contar o que estamos fazendo em todo o país e também a história das pessoas que conseguimos alcançar com nosso apoio humanitário.
Esse trabalho mobiliza a equipe dos seis escritórios. Todo dia supero obstáculos para contar estas histórias de incrível resiliência e superação que são difíceis até mesmo de ouvir.
Você pode nos contar um pouco sobre o impacto que a crise na Síria tem na vida de milhões de pessoas e como você presencia isso diariamente?
A operação do ACNUR na Síria é uma das mais complexas do mundo. Cerca de 12 milhões de pessoas (o que representa bem mais da metade da população) precisam do apoio da ONU e de seus parceiros humanitários. Em muitos casos, trata-se de um apoio que salva vidas diariamente: atendimento médico em locais de difícil acesso e fornecimento de comida. Quase 5 milhões de pessoas precisam de abrigo, por exemplo.
Percebo a urgência da situação e a importância do nosso trabalho, sobretudo quando vejo que alguns bairros pelo país estão quase que completamente destruídos. Quando encontramos as pessoas, no entanto, a esperança é renovada: são pessoas que possuem uma força inspiradora. Elas certamente nos ajudam a dar perspectiva ao nosso trabalho. Os sírios são um povo fantástico, muito parecido com os brasileiros.
Você se recorda de algum episódio específico ou pessoa que tenha te marcado?
Neste pouco tempo em que estou aqui na Síria já consigo me recordar de inúmeras situações que me marcaram. Uma delas é de uma refugiada somali que foi atendida pelo ACNUR e, posteriormente, se tornou nossa voluntária. Ela teve os estudos interrompidos por conta do conflito e, agora, aos 22 anos, vai se inscrever para o nono ano – um atraso, portanto, de 6 ou 7 anos.
Quando a conheci, fiquei extremamente impressionado com a sua vontade de estudar e ajudar a comunidade somali. Isso foi profundamente impactante. É uma experiência que te proporciona uma outra perspectiva de mundo. Eu me sinto ajudando e, ao mesmo tempo, aprendendo.
Qual foi o seu melhor dia de trabalho? E o pior?
Eu gosto muito do meu trabalho porque sei o quão importante é a presença do ACNUR na Síria. É muito gratificante.
Os piores dias não tem a ver com meu trabalho, e sim com a distância do Brasil. Todo dia eu me lembro da minha família e da minha esposa. Todos os dias em que estou aqui não estou com minha família. Ainda assim, todos os dias são gratificantes. É difícil de explicar, mas é exatamente como me sinto e, certamente, muitos dos meus colegas também.
Qual é a parte mais gratificante do seu trabalho? E a mais desafiadora?
O mais gratificante é ver a reação positiva das pessoas beneficiadas pelo nosso trabalho. Eu acredito que é para isso que estamos aqui.
A parte mais desafiadora é certamente perceber os limites que temos ao realizar nosso trabalho.
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