Ontem o professor e jornalista Maurício Falavigna escreveu um texto muito bacana sobre o sucesso que foi o discurso do Lula na 27a Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas, a COP 27, no Egito. Reproduzo aqui seu texto (leia também a análise de Jamil Chade).
Foi além da afirmação de um governo eleito democraticamente, que ainda sofre resistência militar para assumir em janeiro. Ultrapassou significativamente a temática ambiental. Transgrediu em muito a mera retomada, modesta e aliviada, do papel do Brasil no cenário global.
Internamente, o presidente Lula, de maneira comedida mas com todas as palavras necessárias, fez um mea culpa nacional que até hoje não ouvimos dos responsáveis pelo caos. Foi a Nação se retratando dos anos de desmando, desregulamentações ambientais, ganância, banditismo e exploração desenfreada que gerou desmatamento, incêndios, invasões irregulares, morte de povos originários e tentativas de assassinato de ecossistemas. Foram anos de números boicotados, falseados ou elipsados. Lula espezinhou com desprezo o último governo e se comprometeu, como na campanha, de assumir diretrizes opostas em sua administração. Falou com a legitimidade do mundo civilizado ante a uma ameaça fascista. Deixou claro que sua vitória foi a salvação de nossa democracia e de nosso patrimônio ambiental – e, dessa forma, com o protagonismo dado a Amazônia, de toda a humanidade.
No entorno das questões ambientais, Lula também não deixou de inseri-las dentro de um sistema global, frisando a responsabilidade dos países ricos no desastre iminente. Cobrou acordos feitos e não cumpridos. Inseriu o combate à fome, à desigualdade, ao armamentismo e ao belicismo, à exploração desenfreada. Lembrou que a fome não é nossa, mas de 900 milhões de habitantes neste planeta. Passou pelas áreas da agricultura, segurança alimentar, povos originários, democracia participativa, combate à desigualdade.
Desigualdade não somente em condições de vida e diferenciações de renda, mas também política. Lula condenou desde as formas de exploração de recursos até as tentativas de mediação e de governança global. Atacou a ONU e seu Conselho de Segurança, dando ênfase ao famigerado poder de veto por quem detém o poder de fato. Falou de integração dos países que possuem as maiores florestas tropicais, Brasil, Indonésia e Congo. Falou de continentes explorados há séculos, lembrou a integração regional da América do Sul e o histórico de colaboração com a África. Deixou claro que essas cobranças e posturas serão estendidas durante seu mandato. Reafirmou a Amazônia como a “capital” deste debate, oferecendo a sede da COP em 2025. Mostrou que sua presença pode ser encantadora e popular globalmente, mas será também incômoda. Lula falou como a liderança do país que possui um patrimônio ambiental de importância mundial (e ainda afirmou a soberania brasileira na Amazônia). Falou como uma voz dos países em desenvolvimento, que ocupam parcela importante na economia global. Falou como um símbolo dos continentes mais pobres e explorados, que querem desenvolvimento e dignidade.
Falou com o orgulho que já tivemos e ansiamos em recuperar. Deixou claro que, apesar da resistência de uma elite escravagista e retrógrada, de um contexto global de guerra e de afirmações do poderio econômico, há a esperança racional e necessária de um Brasil e de um mundo mais inclusivo e mais justo.
Quem o ouviu e acreditou em suas ideias, sai com a cabeça erguida depois de anos. E sai com o desejo, e até mesmo com a certeza, de que o Brasil voltou.
O post “O BRASIL VOLTOU” foi publicado em 17th November 2022 e pode ser visto originalmente na fonte Escreva Lola Escreva