Pela primeira vez, os países-membros do Comitê de Negociação Intergovernamental (INC, na sigla em inglês) concordaram em iniciar a elaboração de um texto comum
A penúltima rodada de negociações para um tratado global contra a poluição plástica terminou nesta terça-feira no Canadá com alguns avanços, mas ainda sem perspectiva de um acordo vinculante. A delegação brasileira, que vinha demonstrando postura pouco ambiciosa, passou a defender que haja algum acordo com obrigações e tratou de plásticos tidos como “problemáticos”, mas não demonstrou a intenção de apoiar o estabelecimento de metas para cortes na produção.
Pela primeira vez, os países-membros do Comitê de Negociação Intergovernamental (INC, na sigla em inglês) concordaram em iniciar a elaboração de um texto comum para ser apresentado na quinta e última rodada de tratativas, marcada para novembro, na Coreia do Sul. As negociações acontecem no âmbito das Nações Unidas.
“A questão crítica da redução da produção de plástico e de polímeros não recebeu a devida atenção nos debates do tratado, ficando em segundo plano”, disse ao Valor Lara Iwanicki, gerente-sênior da Oceana, organização internacional focada na preservação dos oceanos. “Para alcançar um consenso significativo na INC-5, será necessário um esforço muito maior”, completou ela, que participou das reuniões no Canadá.
Na sua avaliação, encarar a produção de plástico como a “raiz” do problema é um desafio que ainda está longe de ser endereçado com ações concretas. O Brasil, quinto maior fabricante do mundo, tem sérias ressalvas a medidas que limitem a atividade, tanto pela importância econômica da indústria petroquímica nacional quanto pela proximidade entre o atual governo e as cooperativas de catadores de material reciclável.
A poluição plástica é um dos principais desafios ambientais da atualidade. Um relatório da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) estima que 21 milhões de toneladas de microplásticos foram para o meio ambiente somente em 2022.
Os debates em torno de limites para a produção se dividem em três grupos. A coalizão de “alta ambição”, capitaneada pela União Europeia, conta com países desenvolvidos, como Canadá e Noruega, mas também com nações do Sul Global, casos de México, Chile e Peru, entre outras. Na quarta rodada, por exemplo, os peruanos propuseram um corte de 40% na produção até 2040, considerando os patamares de 2025.
“Esta é uma das primeiras propostas concretas de redução, mas ainda pode ser insuficiente para manter o aumento da temperatura global abaixo de 1,5 grau”, explicou Iwanicki.
Na outra ponta da mesa estão alguns dos principais produtores globais de petróleo – matéria-prima para a produção das resinas que dão origem ao plástico. Liderado pelo Irã, o grupo conta ainda com Rússia, Arábia Saudita e Qatar, entre outros. Representantes destes países atuam para que um eventual tratado não afete seus negócios.
No meio do caminho, o Brasil vem tentando mediar os interesses dos atores antagônicos, mas é criticado por organizações ambientais pela falta de ambição para um acordo que limite a produção. Representantes do governo brasileiro argumentam que as energias estão sendo depositadas em um acordo viável, ou seja, reconhecem que um consenso para metas de produção dificilmente acontecerá até novembro.
Ainda assim, o Brasil demonstrou compromisso com um tratado legalmente vinculante e organizou consultas informais sobre polímeros e produtos plásticos considerados problemáticos juntamente com a delegação do Reino Unido. O país também teve sua delegação ampliada, com o ingresso de representantes dos ministérios do Planejamento e do Desenvolvimento, além do Ibama.
Um manifesto de organizações da sociedade civil foi entregue à delegação brasileira, pedindo mais ambição do país, reconhecido internacionalmente pela agenda ambiental. O documento – assinado inclusive por associações de catadores de material reciclável – diz que os objetivos só serão alcançados se o tratado “considerar todo o ciclo de vida” do plástico, ou seja, se afetar também a produção.
Outro avanço verificado no Canadá foi o acordo em torno do trabalho intersessional, ou seja, as reuniões que são realizadas no intervalo entre as rodadas de negociação para discutir critérios técnicos. O Brasil votou contra uma proposta para que os polímeros plásticos primários (PPP) fossem incluídos nessas reuniões, apesar de ter apoiado a realização dos encontros intermediários.
Este debate, se fosse realizado, poderia agilizar a definição de critérios para identificar quais polímeros poderiam ser eliminados ao longo do tempo. Os PPPs são usados como base para a produção de uma grande variedade de materiais plásticos.
O post “
” foi publicado em 02/05/2024 e pode ser visto diretamente na fonte Frente Ambientalista