Hoje quase esquecido, João Barbosa Rodrigues (1842-1909) foi considerado um dos maiores botânicos brasileiros de seu tempo. Ele é conhecido até hoje pelo seu trabalho sobre orquídeas e palmeiras amazônicas. Graças aos seus méritos científicos, foi por quase duas décadas diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
Nascido no Rio de Janeiro, João Barbosa Rodrigues era filho de comerciante português e mãe de ascendência indígena. Também no Rio, cursou o Instituto Comercial do Rio de Janeiro, tornando-se secretário daquela instituição. À época, fez amizade com Guilherme Schüch, o barão de Capanema, que se tornou grande incentivador e mentor de Barbosa Rodrigues. O apoio proporcionado por Capanema até o fim de sua vida influiu decisivamente nos destinos do naturalista. Acreditando no talento de Barbosa Rodrigues, Capanema não mediu esforços para incentivar a carreira do amigo.
Em 1870, Barbosa Rodrigues surpreendeu a comunidade científica ao apresentar uma obra sobre orquídeas brasileiras, em três volumes e com descrições em latim e francês. Foi graças tanto à repercussão que recebeu a obra quanto ao patrocínio de Capanema que Barbosa Rodrigues foi comissionado pelo governo brasileiro para explorar o vale do rio Amazonas. Entre outras obrigações, ele teria que completar, corrigir e aumentar o trabalho sobre palmeiras brasileiras escrito pelo naturalista alemão Carl Friedrich von Martius, que liderou uma expedição pelo Brasil entre 1817 e 1820.
Barbosa Rodrigues permaneceu por dois anos e meio na Amazônia (1872-1874). Nesse período, morando em Belém e em Óbidos, percorreu o baixo Amazonas observando, coletando e fazendo anotações sobre a utilização da flora local.
De volta à capital do império, viu-se sem rendimentos e passou por alguns empregos no comércio enquanto aguardava uma nova oportunidade científica, que finalmente surgiu a partir da ideia de Capanema de abrir um museu, o que garantiria um emprego de prestígio ao amigo.
Comissionado pelo governo imperial para abrir um museu de história natural na cidade de Manaus, Barbosa Rodrigues inaugurou o mesmo 1883. Tratava-se da primeira instituição científica da então província do Amazonas.
O Museu de Botânica da Manaus foi Idealizado para ser um centro especializado em estudos etnográficos e botânicos aplicados à medicina. Barbosa Rodrigues organizou a instituição em três seções: botânica, química e etnográfica, além de um jardim botânico para cultivar e exibir plantas. O museu inaugurou o jardim botânico em 1884 e o laboratório de química, com equipamentos importados de Paris, em 1886.
Durante este período, o botânico carioca percorreu o baixo Amazonas, observando, coletando e fazendo anotações sobre a utilização da flora local na medicina e na culinária e na habitação, registrando os nomes pelos quais as plantas eram conhecidas – e dando atenção especial às suas queridas palmeiras. Coletou também material em sítios arqueológicos e assimilou dos indígenas a arte do curare e outros saberes. Fruto de suas expedições, entre 1886 e 1887 ele produziu aquarelas de ao menos 394 plantas e 94 objetos etnográficos.
Outra iniciativa foi criar uma revista científica chamada Vellosia, onde viria a publicar suas descobertas. O periódico, no entanto, teve apenas um número publicado.
Tal publicação tinha tudo para ser esquecida pela ciência, não fosse o fato de em suas páginas Barbosa Rodrigues ter descrito os fósseis de um monstro. Tratava-se dos fósseis de um estranho jacaré com dimensões colossais. Os ossos haviam sido descobertos nas barrancas do rio Purus, de onde não se sabe como vieram parar nas mãos de Barbosa Rodrigues, que batizou o bicho com o nome científico de Purussaurus brasiliensis.
Hoje se sabe que aquela descrição fortuita – a única aventura do naturalista pelos campos da paleontologia – era a do maior jacaré, e também do maior membro da grande família dos crocodilianos, que se conhece. Estima-se que, quando vivo, um purussauro adulto atingiria 12,5 metros de comprimento (quase tanto quanto um ônibus) e talvez 8,5 toneladas – equivalente ao peso de um elefante africano e meio – ou 15 búfalos. Entre 18 milhões de 8 milhões de anos atrás, foi o predador máximo de um enorme pantanal, conhecido como lago Pegas (ver reportagem “O “tiranossauro” brasileiro ).
Apesar de suas descobertas, Barbosa Rodrigues mantinha o museu com grande dificuldade. A instituição mudou de endereço três vezes, sempre com falta de recursos, equipamentos e funcionários. Exausto e amargurado, em 1887 ele deixou o cargo de diretor ao perceber que o museu não teria futuro. De fato, teve vida efêmera, encerrando suas atividades em 1890. Após a saída de Barbosa Rodrigues, parte do acervo foi levada ao Liceu Amazonense, em Manaus, e depois transferida para o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).
De volta ao Rio, com a proclamação da República Barbosa Rodrigues foi nomeado em 1892 diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, cargo que ocuparia até a sua morte, em 1909. Durante sua longa gestão, ele se empenhou em elaborar um projeto integral para o Jardim Botânico, contemplando o arboreto, estufas e viveiros, laboratórios, biblioteca, herbário, escola de Botânica, e um museu botânico. Dada a importância de expedições de campo para a constituição de coleções representativas da flora brasileira, criou o cargo de naturalista viajante.
Barbosa Rodrigues foi o dirigente de maior prestígio da história da instituição até aquela época. Como diretor do Jardim Botânico, finalmente conseguiu publicar em 1903 sua obra sobre palmeiras, Sertum Palmarum brasiliensis , um clássico da botânica nacional. A obra foi impressa em dois volumes na Bélgica, com as mais modernas técnicas gráficas disponíveis à época. O livro reúne 174 aquarelas e textos do autor com a descrição de 389 espécies de palmeiras (de 42 gêneros) – sendo 166 delas desconhecidas da ciência.
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