A mensagem presidencial entregue por Jair Bolsonaro na quarta-feira (2/2) aos presidentes da Câmara e do Senado, na cerimônia de abertura do ano legislativo, vale tanto quanto uma nota de 17 reais. No documento, o presidente afirma que “o combate ao desmatamento ilegal e a prevenção e combate aos incêndios são pautas prioritárias do governo federal”. No Brasil real, foi registrada em 2021 a maior taxa de desmatamento da Amazônia em 15 anos e o menor número de multas por crimes contra a flora em duas décadas. Não foi por falta de recursos para a fiscalização ambiental que o governo Bolsonaro deixou o desmatamento subir pelo terceiro ano consecutivo, mostra relatório divulgado nesta semana pelo Observatório do Clima. No documento, o OC faz um balanço dos “resultados” do tal “ambientalismo de resultados” do regime, que operou com eficiência um desmonte da governança socioambiental do país que será difícil de reverter. Para não dizer que não houve boas notícias, no último dia 25, mesma data da morte do ideólogo da extrema-direita Olavo de Carvalho, um outro guru do bolsonarismo foi desmascarado: um grupo de 12 cientistas, em publicação histórica, desmontou “falsas controvérsias” do agrônomo Evaristo de Miranda, fornecedor das estatísticas criativas que embasam os disparates discursivos do regime contra as florestas e os povos indígenas. Boa Leitura.
A CONTA CHEGOU
Um relatório do OC revela que Ibama teve no ano passado R$ 219 milhões para fiscalizar, mas só liquidou (executou) 41% disso até 31 de dezembro (R$ 88 milhões). Nos governos anteriores a Bolsonaro, a liquidação dos recursos para a fiscalização foi de cerca de 90%. Como a liquidação reflete serviço realizado, esse número baixo mostra que o governo não aproveitou a verba extra que obteve do Congresso em 2021 para ampliar o número de operações de campo ao longo do ano.
Os recursos do Ibama ainda podem ser gastos em 2022, caso haja um surto de vontade de fazer o que não foi feito em 2021. Já o Inpe, responsável pelo monitoramento do desmatamento (que está ameaçado no caso do Cerrado), teve o menor orçamento nos últimos dez anos, mostrou o G1 .
Em três anos, o governo Bolsonaro deixou que 56 mil quilômetros quadrados de vegetação nativa na Amazônia e no Cerrado virassem fumaça. É metade da área de Cuba. A maior taxa de desmatamento da Amazônia em 15 anos, registrada em 2021, coincide com o menor número de multas do Ibama por crimes contra a flora das últimas duas décadas.
O próprio Bolsonaro já se gabou no mês passado de que seu governo reduziu “em 80% (sic) o número de multagens (sic)”, deixando claro mais uma vez para quem ainda tinha dúvidas de que o desmonte da fiscalização ambiental é política de governo.
Numa prévia do que vem por aí, o Estadão revelou nesta semana que a ordem para queimar helicópteros do Ibama em Manaus no mês passado partiu de um criminoso apontado como “empresário milionário de Goiânia”, que explora garimpos ilegais na Amazônia.
COMBO DA MORTE
Deputados e senadores voltaram das férias na quarta-feira (2/2) carregando na mala uma agenda de retrocessos socioambientais em série. Há pelo menos oito projetos de lei no chamado “Combo da Morte”, pautas de interesse da bancada ruralista e do Palácio do Planalto. A anistia à grilagem e a virtual extinção do licenciamento ambiental já foram aprovadas na Câmara e podem passar a qualquer momento no Senado. Outros projetos, entre eles um que prevê a liberação indiscriminada de agrotóxicos, um que libera a caça de animais silvestres e dois que destroem direitos indígenas, tramitam na Casa. O OC resumiu.
INFRALEGAL
Enquanto tramita no Senado o projeto que na prática pode acabar com o licenciamento ambiental, o presidente Jair Bolsonaro corre por fora e prepara um decreto com mudanças no licenciamento de obras de infraestrutura, retirando do Ibama a tarefa de aprovar o licenciamento de portos, hidrovias, rodovias, ferrovias e usinas térmicas. As atribuições seriam repassadas aos Estados, como presente em ano eleitoral, revelou o Estadão .
CIENTISTAS EXPÕEM MÉTODO DE MIRANDA, O FABULADOR AMBIENTAL
As táticas de desinformação espalhadas pelo “guru ambiental de Bolsonaro”, o agrônomo Evaristo de Miranda, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), foram desmontadas em um artigo científico assinado por 12 pesquisadores brasileiros, publicado na revista especializada Biological Conservation. “Por três décadas, Miranda e seu grupo se opuseram sistematicamente ao consenso científico para contribuir com os movimentos políticos que visam adiar a ação ou desmantelar as principais políticas de conservação”, aponta o estudo. O engenheiro agrônomo foi o responsável pela “contabilidade criativa” de várias “teses” usadas pelo governo para divulgar informações falsas sobre a questão ambiental, como a de que o Brasil seria o país que mais preserva o meio ambiente no mundo , repetida pelo menos 29 vezes por Bolsonaro desde o início de seu mandato, segundo a agência Aos Fatos .
JOAQUIM INSISTE EM REALIDADE PARALELA
Para não perder o costume, o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, publicou um artigo na Folha em que afirma, entre outras mentiras, que “o trabalho integrado” entre ministérios “fortaleceu o combate a incêndios e desmatamento ilegal”, no que chamou de “ambientalismo de resultados”. Dias depois, o secretário executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini, publicou artigo no mesmo jornal apontando os resultados do “ambientalismo de resultados”. O Fakebook.eco destrinchou as mentiras publicadas pelo ministro e apontou o histórico de desinformação, como o fato de ele ter escondido os dados sobre a alta do desmatamento em 2021 durante a conferência do clima de Glasgow (COP 26), em novembro.
O post “Na newsletter: a conta do desmonte e o “Combo da Morte”” foi publicado em 10th February 2022 e pode ser visto originalmente na fonte OC | Observatório do Clima