Um lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), espécie símbolo do Cerrado, foi capturado na cidade São José dos Campos, interior de São Paulo, na madrugada na última quarta-feira (5), após ter percorrido várias ruas e avenidas centrais do município.
São José dos Campos é uma cidade de grande porte, com pouco mais de 700 mil habitantes, e está localizada no Vale do Paraíba, região de Mata Atlântica. Segundo Rogério Cunha de Paula, biólogo e analista ambiental do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Carnívoros (Cenap/ICMBio), o avistamento de lobos-guarás nesta região não é raro, devido ao estado de devastação em que o bioma se encontra.
“O lobo não é uma espécie florestal e a Mata Atlântica nunca foi o bioma original dela. Então o lobo ocupa, com algumas exceções, áreas desmatadas com alguma recuperação, áreas florestais que não se recompuseram totalmente e formam capoeiras, áreas campestres. São José dos Campos tem muitas áreas que parecem savânicas”, explica o biólogo.
De fato, a região do Vale do Paraíba, intensamente desmatada para uso de atividades agropecuárias, passou por um intenso processo de urbanização e industrialização entre 1960 e 1980, levando ao abandono de muitas áreas antes usadas para atividades agropastoris. Desde então, a Mata Atlântica na região iniciou um processo espontâneo de regeneração.
O lobo-guará figura na categoria de Vulnerável na Lista de Espécies Ameaçadas do Ministério do Meio Ambiente, embora conste também no catálogo da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) como Quase Ameaçada. Números estimados baseados em estudos de algumas áreas de ocorrência contabilizam 24 mil indivíduos sobreviventes em todo o Brasil, sendo cerca de 9 mil em diferentes porções de Mata Atlântica.
Animal sob stress
O lobo-guará capturado em José dos Campos foi flagrado por moradores por volta das 4h30 e capturado pelo Corpo de Bombeiros cerca de uma hora depois, quando o movimento de carros e pessoas já começava a se intensificar. O animal, de porte adulto, não tinha ferimentos.
Segundo Rogério de Paula, na época seca é comum os lobos saírem de seus territórios em busca de alimentos e, ao se depararem com queimadas ou outras pressões antrópicas, se aproximarem cada vez mais das periferias das cidades. De acordo com o analista, a hipótese mais provável é que, ao chegar na região periférica, o animal se perdeu ou foi acuado por cachorros, entrando cada vez mais na zona urbana. “Nas análises que a gente faz no sangue de animais achados nessas condições, a gente vê que o índice dos hormônios do stress são muito grandes”, diz.
Mas, segundo Rogério de Paula, o problema maior não são nem os riscos que o animal enfrenta em sua visita à cidade, mas o local em que é levado para a soltura.
“Ele vai ser capturado e vai ser levado para uma área totalmente diferente da área que ele vivia, e os lobos têm uma relação muito forte com o ambiente, uma fidelidade espacial, que a gente fala. Ele não é nômade, não fica buscando novas áreas […] daí o ser humano interfere e leva ele pra uma área totalmente diferente, que ele não conhece nada, com outras ameaças, outros cheiros, outras relações com outros indivíduos. Então, essas intervenções que a gente faz é que são o grande problema, mais do que o bicho estar na cidade”, diz.
O caso do animal capturado em solo joseense exemplifica a preocupação do analista do Cenap. O lobo-guará foi solto pela Polícia Ambiental na Serra do Mar, bem longe de sua possível área de ocorrência.
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