A eventual tramitação simultânea dos projetos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) e da Lei Orçamentária Anual (PLOA) poderia trazer “evidente prejuízo” ao processo orçamentário. A opinião é de Otávio Gondim, consultor de Orçamentos do Senado. Para ele, as condicionantes indicadas na LDO “precisam ser consideradas na elaboração da peça orçamentária”.
Gondim avalia que o Congresso Nacional não precisaria esperar a aprovação do novo arcabouço fiscal para votar o projeto da LDO (PLN 4/2023). O consultor lembra que o texto enviado originalmente pelo Poder Executivo (PLP 93/2023) traz um dispositivo que autoriza a inclusão no Orçamento da União de despesas condicionadas à aprovação do novo arcabouço.
Ele reconhece, no entanto, que mudanças aprovadas pela Câmara dos Deputados no PLP 93/2023 podem tornar o Orçamento de 2024 “virtualmente desequilibrado”. “Haverá um resgate de pisos constitucionais, pressionando o limite de despesas discricionárias. Sem a autorização para utilização da inflação projetada para 2023, o PLOA estará esvaziado de recursos para financiar despesas que não digam respeito a saúde e educação”, explica Gondim.
Leia os principais pontos da entrevista:
Agência Senado — O Poder Executivo pediu ao Congresso Nacional que só vote o projeto da LDO após a apreciação do novo arcabouço fiscal pela Câmara dos Deputados. Isso é mesmo necessário?
Gondim — De forma geral, não haveria um grande constrangimento à tramitação do PLDO independentemente da aprovação do novo arcabouço fiscal. Antevendo essa possibilidade, o Executivo fez constar do projeto um artigo que autorizaria a inclusão no PLOA de despesas primárias condicionadas à aprovação da lei complementar que irá inaugurar a nova âncora fiscal. Estima-se que essa providência resultaria em algo em torno de R$ 172 bilhões, cuja fonte de recursos poderia ser alterada no caso da aprovação do novo arcabouço fiscal nos moldes propostos.
Agência Senado — Por que então adiar a votação da LDO?
Gondim — Evidentemente que o Congresso poderia denegar a autorização solicitada pelo Executivo, bem como incluir receitas e despesas propostas pelo Executivo que estivessem fora do cálculo da meta de resultado primário, como o encontro de contas entre entes federativos e a compensação de obrigações recíprocas com demais credores com o emprego de precatórios. Isso naturalmente demandaria a revisão da meta de resultado primário disposta na LDO por força da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Mas mesmo a adoção da banda de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB) para a meta de resultado primário, novidade para 2024, não é díssona do arcabouço normativo vigente.
Agência Senado — Em que pontos o novo arcabouço impacta na elaboração do Orçamento?
Gondim — Na verdade, o problema maior estaria na definição do gatilho incorporado no relatório da Câmara para que autorizações dependessem da efetiva observância de diferença na inflação relativa ao segundo semestre de 2023 como pressuposto à ampliação do teto de gastos para despesas primárias. A alteração incorporada no substitutivo da Câmara torna o Orçamento para 2024 virtualmente desequilibrado: de saída, haverá um resgate de pisos constitucionais afastados pela Emenda Constitucional 95 (teto de gastos em vigor), pressionando o limite de despesas discricionárias, que, com o advento da EC 95, passaram a sofrer não mais do que atualização monetária. Dentre elas, destacam-se o mínimo para ações e serviços públicos de saúde (que voltarão a comprometer 15% da Receita Corrente Líquida — RCL), para a manutenção e o desenvolvimento do ensino (18% da arrecadação de impostos) e para as emendas impositivas, individuais (2% da RCL de 2022) e de bancadas estaduais (1% da RCL de 2023). Com os novos patamares e sem a autorização para utilização da inflação projetada para 2023, o PLOA estará esvaziado de recursos para financiar despesas discricionárias do Poder Executivo que não digam respeito aos mínimos de saúde e de educação.
Agência Senado — Esse ponto foi mantido pelos senadores?
Gondim — Essa imperfeição foi corrigida no Senado, mas a sua rejeição na Casa iniciadora trará constrangimento para o governo, que se verá na contingência de apresentar um projeto de lei orçamentária que não contemplará sequer o mínimo para manter políticas públicas plurais. Terá, assim, de iniciar 2024 pedindo nova autorização com base no teto revisto pela inflação efetivamente medida no ano corrente. Portanto, o impacto mais relevante da não aprovação provavelmente será na tramitação do PLOA, mais do que na do PLDO.
Agência Senado — O projeto da LOA deve ser enviado até 31 de agosto. Caso a LDO não tenha sido votada até lá, teríamos LOA e LDO tramitando concomitantemente no Congresso. Em que medida essa situação afeta o processo orçamentário?
Gondim — Sobre a tramitação concomitante dos dois projetos de lei, o evidente prejuízo está em que o Orçamento será elaborado sem seus condicionantes. É papel constitucional da LDO orientar a elaboração da lei orçamentária anual, além de dispor sobre outras matérias que a afetam. É o caso de requisitos para a concessão de incentivos fiscais e demais alterações previstas na legislação tributária com impacto direto sobre a previsão de receitas. A LDO também autoriza concessão de vantagens ou aumento de remunerações, realização de concursos, nomeações e demais medidas que ampliem os gastos com pessoal, que comprometem sensível parcela das despesas obrigatórias. Há ainda os conteúdos incluídos na LDO por determinação da LRF, como a própria previsão de meta de resultados primário e nominal, que limitam as despesas públicas, e que, portanto, precisam ser consideradas na elaboração da peça orçamentária.
Agência Senado — Sem a LDO aprovada, o projeto da LOA chegaria incompleto ao Congresso?
Gondim — Nesse caso, na falta de esteio bastante, e em caso de não aprovação tempestiva da LDO, o Executivo pouco poderá fazer além de considerar, quando do encaminhamento do PLOA, as medidas propostas (e não aprovadas) no PLDO. Isso acabará por ser replicado pelo Congresso quando das apreciação do Orçamento, até a efetiva aprovação do PLDO, que regimentalmente deve preceder à do PLOA, ainda que os projetos tramitem simultaneamente.
Gondim avalia que o Congresso Nacional não precisaria esperar a aprovação do novo arcabouço fiscal para votar o projeto da LDO (PLN 4/2023). O consultor lembra que o texto enviado originalmente pelo Poder Executivo (PLP 93/2023) traz um dispositivo que autoriza a inclusão no Orçamento da União de despesas condicionadas à aprovação do novo arcabouço.
Ele reconhece, no entanto, que mudanças aprovadas pela Câmara dos Deputados no PLP 93/2023 podem tornar o Orçamento de 2024 “virtualmente desequilibrado”. “Haverá um resgate de pisos constitucionais, pressionando o limite de despesas discricionárias. Sem a autorização para utilização da inflação projetada para 2023, o PLOA estará esvaziado de recursos para financiar despesas que não digam respeito a saúde e educação”, explica Gondim.
Leia os principais pontos da entrevista:
Agência Senado — O Poder Executivo pediu ao Congresso Nacional que só vote o projeto da LDO após a apreciação do novo arcabouço fiscal pela Câmara dos Deputados. Isso é mesmo necessário?
Gondim — De forma geral, não haveria um grande constrangimento à tramitação do PLDO independentemente da aprovação do novo arcabouço fiscal. Antevendo essa possibilidade, o Executivo fez constar do projeto um artigo que autorizaria a inclusão no PLOA de despesas primárias condicionadas à aprovação da lei complementar que irá inaugurar a nova âncora fiscal. Estima-se que essa providência resultaria em algo em torno de R$ 172 bilhões, cuja fonte de recursos poderia ser alterada no caso da aprovação do novo arcabouço fiscal nos moldes propostos.
Agência Senado — Por que então adiar a votação da LDO?
Gondim — Evidentemente que o Congresso poderia denegar a autorização solicitada pelo Executivo, bem como incluir receitas e despesas propostas pelo Executivo que estivessem fora do cálculo da meta de resultado primário, como o encontro de contas entre entes federativos e a compensação de obrigações recíprocas com demais credores com o emprego de precatórios. Isso naturalmente demandaria a revisão da meta de resultado primário disposta na LDO por força da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Mas mesmo a adoção da banda de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB) para a meta de resultado primário, novidade para 2024, não é díssona do arcabouço normativo vigente.
Agência Senado — Em que pontos o novo arcabouço impacta na elaboração do Orçamento?
Gondim — Na verdade, o problema maior estaria na definição do gatilho incorporado no relatório da Câmara para que autorizações dependessem da efetiva observância de diferença na inflação relativa ao segundo semestre de 2023 como pressuposto à ampliação do teto de gastos para despesas primárias. A alteração incorporada no substitutivo da Câmara torna o Orçamento para 2024 virtualmente desequilibrado: de saída, haverá um resgate de pisos constitucionais afastados pela Emenda Constitucional 95 (teto de gastos em vigor), pressionando o limite de despesas discricionárias, que, com o advento da EC 95, passaram a sofrer não mais do que atualização monetária. Dentre elas, destacam-se o mínimo para ações e serviços públicos de saúde (que voltarão a comprometer 15% da Receita Corrente Líquida — RCL), para a manutenção e o desenvolvimento do ensino (18% da arrecadação de impostos) e para as emendas impositivas, individuais (2% da RCL de 2022) e de bancadas estaduais (1% da RCL de 2023). Com os novos patamares e sem a autorização para utilização da inflação projetada para 2023, o PLOA estará esvaziado de recursos para financiar despesas discricionárias do Poder Executivo que não digam respeito aos mínimos de saúde e de educação.
Agência Senado — Esse ponto foi mantido pelos senadores?
Gondim — Essa imperfeição foi corrigida no Senado, mas a sua rejeição na Casa iniciadora trará constrangimento para o governo, que se verá na contingência de apresentar um projeto de lei orçamentária que não contemplará sequer o mínimo para manter políticas públicas plurais. Terá, assim, de iniciar 2024 pedindo nova autorização com base no teto revisto pela inflação efetivamente medida no ano corrente. Portanto, o impacto mais relevante da não aprovação provavelmente será na tramitação do PLOA, mais do que na do PLDO.
Agência Senado — O projeto da LOA deve ser enviado até 31 de agosto. Caso a LDO não tenha sido votada até lá, teríamos LOA e LDO tramitando concomitantemente no Congresso. Em que medida essa situação afeta o processo orçamentário?
Gondim — Sobre a tramitação concomitante dos dois projetos de lei, o evidente prejuízo está em que o Orçamento será elaborado sem seus condicionantes. É papel constitucional da LDO orientar a elaboração da lei orçamentária anual, além de dispor sobre outras matérias que a afetam. É o caso de requisitos para a concessão de incentivos fiscais e demais alterações previstas na legislação tributária com impacto direto sobre a previsão de receitas. A LDO também autoriza concessão de vantagens ou aumento de remunerações, realização de concursos, nomeações e demais medidas que ampliem os gastos com pessoal, que comprometem sensível parcela das despesas obrigatórias. Há ainda os conteúdos incluídos na LDO por determinação da LRF, como a própria previsão de meta de resultados primário e nominal, que limitam as despesas públicas, e que, portanto, precisam ser consideradas na elaboração da peça orçamentária.
Agência Senado — Sem a LDO aprovada, o projeto da LOA chegaria incompleto ao Congresso?
Gondim — Nesse caso, na falta de esteio bastante, e em caso de não aprovação tempestiva da LDO, o Executivo pouco poderá fazer além de considerar, quando do encaminhamento do PLOA, as medidas propostas (e não aprovadas) no PLDO. Isso acabará por ser replicado pelo Congresso quando das apreciação do Orçamento, até a efetiva aprovação do PLDO, que regimentalmente deve preceder à do PLOA, ainda que os projetos tramitem simultaneamente.
Fonte: Agência Senado
O post “LDO precisa ser considerada na elaboração do Orçamento, diz consultor” foi publicado em 26/07/2023 e pode ser visto original e