Depois de paralisar o Fundo Amazônia por birra, o governo Bolsonaro corre para criar um fundo alternativo para a região, supostamente “sem viés ideológico” – ou seja, sem recursos para ONGs. A ideia é que o fundo, a ser criado no BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), seja anunciado em caráter “preliminar” na COP25, a conferência do clima de Madri.
No último dia 4 (terça-feira), o chanceler Ernesto Araújo enviou uma carta ao representante do BID no Brasil, Hugo Flórez Timoran, convidando representantes do banco para vir a Brasília debater “aspectos substantivos referentes ao escopo de atuação daquele fundo”.
A correspondência prossegue: “Tendo em vista a expectativa de anúncio – mesmo que preliminar – do estabelecimento do Fundo já na próxima COP (em local e data por definir), proponho que a visita da delegação do BID ocorra no menor prazo possível, preferencialmente na primeira metade de novembro”.
A carta de Araújo ao BID indica que as conversas com o banco estão num estágio menos avançado do que o que foi sugerido pelo ministro do Meio Ambiente em setembro, durante sua visita a Washington em 19 de setembro.
Na ocasião, Salles reuniu-se com o presidente do banco, Luis Alberto Moreno, e na saída declarou a jornalistas que o fundo seria criado. E já delineou suas características: “É um fundo que contempla países e setor privado tanto na ponta de doação quanto no recebimento dos investimentos para desenvolvimento, pesquisa e outras atividades. Tende a ser um instrumento muito consistente de finalmente desenvolver essa oportunidade da bioeconomia na Amazônia — afirmou Salles.”
O BID não confirmou na ocasião. Segundo o OC apurou, a fala de Salles dando como favas contadas algo que acabava de ser sugerido causou mal-estar entre integrantes do banco.
No dia 21, segundo o site Poder 360 , ainda de Washington, Salles adiantou que o fundo seria anunciado numa reunião com empresários sobre bioeconomia que começa hoje (8) em Belém. A carta de Araújo ao BID também desautoriza essa intenção.
Entre os membros do comitê diretor do BID estão países que já doam para o Brasil proteger a Amazônia, em especial Noruega e Alemanha. Ambos vêm sendo esnobados há meses por Salles, que desde fevereiro vem tentando – sem sucesso – controlar a principal fonte de recursos para apoio à tal “bioeconomia”: o Fundo Amazônia.
Com um total já aplicado de R$ 3,4 bilhões, o fundo apoia hoje 103 projetos, vários deles de apoio a cadeias produtivas sustentáveis. Dezenove dos projetos do fundo visam apoiar os Estados no estabelecimento do Cadastro Ambiental Rural – ou seja, políticas públicas voltadas à regularização ambiental justamente do tal “setor privado” que o ministro diz querer beneficiar.
Salles quis mudar as regras do Fundo Amazônia de forma que o governo federal (ou seja, o ministro) pudesse definir onde e de que forma os recursos seriam gastos. Um dos objetivos era tirar todo o recurso das organizações não-governamentais, que hoje executam pouco mais de um terço da verba, e destiná-lo, por exemplo para pagar desapropriações de fazendeiros em áreas protegidas.
O ministro chegou a sofismar em mais de uma ocasião que, se ele não pudesse mexer no fundo, não seria uma doação de fato. Como os doadores não toparam a mudança, o ministro deixou o Fundo Amazônia mofando e botou sua renegociação no gerúndio (“estamos discutindo”). Enquanto isso, partiu para o exterior em setembro, enquanto o petróleo misterioso chegava às praias do Nordeste, para tentar captar recursos de outras fontes para o Fundo Amazônia “do B”.
Procurado, o BID não havia se manifestado até o fechamento deste texto.
Republicado do Observatório do Clima através de parceria de conteúdo. |
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