Um novo relatório divulgado hoje pela Coalizão Florestas & Finanças, com apoio de parceiros da sociedade civil global, alerta que a corrida mundial por uma transição energética justa está sendo perigosamente minada pelo financiamento extrativista.
Intitulado “Mineração e Dinheiro: Falhas Financeiras na Transição Energética” , o relatório revela que, entre 2016 e 2024, grandes bancos injetaram US$ 493 bilhões em empréstimos e subscrição de títulos para empresas de mineração de minerais de transição, enquanto investidores detinham US$ 289 bilhões em ações e títulos até junho de 2025. Esses fluxos apoiaram empresas ligadas ao desmatamento, grilagem de terras, contaminação e violações de direitos trabalhistas.
Minerais como cobalto, níquel, lítio e cobre estão em alta demanda devido ao seu papel nas tecnologias atuais de energia renovável, mas a forma como são minerados e financiados está longe de ser limpa, verde, sustentável ou justa.

Bancos Grandes, Riscos Maiores
O relatório identifica JPMorganChase, Bank of America, Citi e BNP Paribas como os maiores bancos a financiar operações de mineração destrutivas. Do lado dos investimentos, BlackRock, Vanguard e Capital Group detinham bilhões em títulos e ações de gigantes da mineração como Glencore, Vale e BHP.
Apesar dos compromissos públicos com a sustentabilidade, a pontuação média de políticas ambientais, sociais e de governança (ESG) para mineração entre 30 grandes instituições avaliadas pela Florestas & Finanças foi de apenas 22%. Muitas não tinham qualquer política para evitar o financiamento de rompimentos de barragens de rejeitos, grilagem de terras indígenas ou desmatamento, apesar de a mineração ser um setor notoriamente de alto risco.
“Este deve ser um alerta para todos os formuladores de políticas, banqueiros e investidores: não se pode construir um futuro energético justo atropelando direitos, deslocando comunidades e destruindo a biodiversidade”, disse Stephanie Dowlen, campaigner da Rainforest Action Network, membro da Coalizão Florestas & Finanças. “Uma Transição Justa precisa de finanças que não recompensem mais o mau comportamento e a impunidade corporativa.”

Comunidades e Ecossistemas na Linha de Frente
Com base em estudos de caso da Indonésia, Brasil, República Democrática do Congo (RDC) e Austrália, o relatório documenta o impacto humano e ambiental da expansão desenfreada da mineração de minerais de transição. Quase 70% das minas de minerais de transição se sobrepõem a terras indígenas ou comunidades tradicionais, e 71% estão localizadas em regiões de alta biodiversidade já sob estresse climático e social. A pesquisa relaciona a mineração de minerais de transição ao desmatamento, poluição, violações de direitos indígenas, práticas laborais inseguras, novas usinas a carvão, colapsos fatais de barragens de rejeitos e destruição de ecossistemas — apesar de serem publicamente promovidas como parte de uma transição energética “verde” ou “sustentável”.
- Na Indonésia, as operações de níquel do Grupo Harita são movidas a carvão e a má gestão dos rejeitos resultou na contaminação de fontes de água que afetam comunidades.
- A Vale, no Brasil, continua operando com impunidade corporativa após matar centenas de pessoas em dois rompimentos de barragens e causar o pior desastre ambiental do país.
- A mineração de cobalto na RDC explora trabalhadores e desloca comunidades em razão da expansão e da poluição.
- A mineração de alumínio (bauxita) na Austrália está se expandindo pelo território indígena Noongar, desmatando habitats críticos e ameaçando os mananciais de água de Perth.

Princípios Globais e Demandas por Política
A Coalizão Florestas & Finanças alerta que, sem reformas urgentes, a transição energética consolidará um modelo explorador e de alto risco que mina as metas climáticas, ambientais e de desenvolvimento. O relatório pede que governos, bancos e investidores alinhem o capital a uma transição justa, equitativa e sustentável através de:
- Respeito aos direitos humanos — incluindo processos de Consentimento Livre, Prévio e Informado (CLPI), normas trabalhistas e proteção a defensores de direitos humanos.
- Proteção da natureza — excluindo o financiamento a empresas ligadas ao desmatamento, destruição da biodiversidade, poluição da água e gestão insegura de resíduos.
- Fortalecimento da responsabilidade — por meio de diligência devida em direitos humanos e meio ambiente, rastreabilidade das cadeias de suprimento, transparência e mecanismos de reparação.
- Alinhamento com os marcos climáticos e ambientais — exigindo planos de transição climática credíveis e corte no financiamento a combustíveis fósseis.
- Estabelecimento de linhas vermelhas — excluindo clientes com violações repetidas ou não resolvidas de direitos, danos ambientais ou falha em remediar danos.

Encruzilhada para o Clima, a Natureza e a Justiça
A corrida para garantir minerais de transição está sendo apresentada como essencial para a ação climática. No entanto, o modelo econômico atual que impulsiona a demanda é baseado em superconsumo, concentração corporativa e exploração de pessoas e ecossistemas marginalizados.
“A mineração é uma das principais causas da crise climática e agora se apresenta como parte central da solução para o problema na transição energética sem mudar seu modelo de exploração e cadeia de valor mundialmente. Esta é uma contradição gritante que não pode mais ser ignorada pelos tomadores de decisão”, comenta Maurício Angelo, Diretor Executivo do Observatório da Mineração, doutorando em Ciências Ambientais pela Universidade de São Paulo e mestre em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília.
O financiamento descontrolado da extração está transformando a transição energética em mais um capítulo da longa história de danos da mineração — um em que países de baixa renda arcam com os maiores custos enquanto as economias mais ricas colhem os benefícios.
“A mineração tem uma longa e sórdida história, causando danos graves e afetando desproporcionalmente algumas das populações mais marginalizadas do mundo”, disse Gabriela Sarmet, do Observatório da Mineração, membro da Coalizão Florestas & Finanças. “O fato de bancos e investidores terem injetado tanto dinheiro na Vale no Brasil após não um, mas dois colapsos catastróficos de barragens mostra que o lucro é mais importante do que a vida.”

Leia o relatório completo disponível em inglês.
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O post “Expondo as falhas financeiras na (in)justa transição energética: novo relatório revela bilhões em financiamento de mineração de alto risco” foi publicado em 03/09/2025 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte Observatório da Mineração