PRESS RELEASE
Para o Brasil cumprir seus compromissos internacionais de redução de emissões de gases de efeito estufa, a Petrobras vai ter que mudar. Dois documentos lançados nesta terça-feira (16/9) começam a responder como. Eles dão as primeiras direções de um mapa do caminho para transformar a maior companhia brasileira, fazendo-a transitar de uma empresa de óleo e gás para uma gigante de energia. Isso aumentaria a geração de empregos e reduziria o risco – para a Petrobras e para o Estado brasileiro, que tem forte dependência da receita de exportação de petróleo – de choques causados por reduções bruscas no consumo global de óleo na próxima década.
O primeiro documento, “Questões-Chave e Alternativas para a Descarbonização do Portfólio de Investimentos da Petrobras ”, foi produzido pelos economistas Carlos Eduardo Young e Helder Queiroz, da UFRJ. Ele dá subsídios ao segundo, “A Petrobras de que Precisamos ”, produzido pelas 30 organizações do Grupo de Trabalho em Energia do Observatório do Clima. Ambos buscam iniciar um debate sobre transição energética justa que o governo brasileiro tenta postergar.
Embora o mundo tenha concordado em 2023, na Conferência do Clima de Dubai, em fazer uma transição para longe dos combustíveis fósseis começando nesta década, e embora o próprio Brasil tenha escrito em sua meta climática (NDC) para 2035 que apoiaria um processo que levasse a um calendário para essa eliminação, na prática a teoria é outra: o país vem expandindo fortemente sua produção de óleo e gás, e se tornou cada vez mais dependente da exportação de óleo cru – que ultrapassou a soja como principal produto exportado pelo país, com 13% do total das vendas brasileiras ao exterior.
Desde a crise de 2016, a Petrobras vem desinvestindo em áreas como distribuição e biocombustíveis e se concentrando em exploração e produção, e seu plano de negócios 2025-2029 prevê investimentos de US$ 111 bilhões, dos quais apenas US$ 9,1 bilhões vão para energias de baixo carbono. Segundo o estudo “A Petrobras de que Precisamos”, esse plano vai contra a Estratégia Nacional de Mitigação do Brasil, que integra o Plano Clima e prevê uma neutralização de emissões do país até 2050, e também contra a proposta de NDC do Observatório do Clima para o Brasil, que propõe redução de 80% nas emissões do setor de energia.
Além disso, ao dobrar a aposta na expansão de hidrocarbonetos – o Brasil hoje é o oitavo maior produtor de petróleo do mundo e quer se tornar o quarto maior na próxima década – o Brasil expõe a Petrobras, e sua balança comercial, ao risco de um estouro da “bolha de carbono”: à medida que os eventos climáticos extremos se agravam, e que o mundo adia a saída dos fósseis, reduções bruscas no consumo podem ocorrer a partir de 2030, com o encalhe maciço de ativos. Em português claro, pode ser que a Petrobras faça investimentos em expansão que resultem em óleo que não poderá ser vendido no mercado internacional pela falta de clientes.
O melhor, afirmam ambos os documentos, é iniciar desde já uma real transição energética para a Petrobras, diversificando seu portfólio. Isso necessariamente precisa vir acompanhado de políticas públicas que reduzam a dependência do governo do caixa altamente volátil da renda do petróleo.
“A Petrobras, e o setor de petróleo e gás natural como um todo, não podem ser considerados como meros instrumentos de soluçãopara o problema macroeconômico que abarca a questão fiscal no país. Não obstante a importância dos recursos financeiros arrecadados com royalties, impostos e demais participações governamentais é importante recordar o risco associado à dependência das administrações públicas (federal, estaduais e municipais) posto que a atividade petrolífera é caracterizada pela extração de recursos esgotáveis e cujos preços são extremamente voláteis”, afirmam Young e Queiroz, da UFRJ.
Segundo “A Petrobras de que Precisamos”, a transformação da empresa passa pelos seguintes pontos:
- Aumento dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento e inovação de biocombustíveis e hidrogênio de baixo carbono;
- Retorno do investimento em distribuição e terminais de recarga para o consumidor final — seja recomprando a BR Distribuidora, seja criando uma nova estrutura;
- Alinhamento do plano de negócios da Petrobras aos objetivos mais ambiciosos do Acordo de Paris, da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil e da Estratégia Nacional de Mitigação (Plano Clima), como requisito mínimo, idealmente buscando ir além dessas metas;
- Priorização a investimentos nas fontes de baixo carbono, de modo a diversificar o core business da empresa; entre elas, o hidrogênio verde, os biocombustíveis de segunda e terceira geração (segundo Queiroz e Young, a expansão dos biocombustíveis gera mais do que duas vezes mais postos de trabalho e renda do trabalho do que a extração e o refino de petróleo), e o combustível sustentável de aviação (SAF);
- Realocação dos investimentos planejados em novas refinarias para ampliar participação de novos combustíveis na matriz energética, que deverá estar atrelada à redução da demanda interna de derivados de petróleo e gás.
O documento do Grupo de Trabalho em Energia do OC propõe o congelamento da expansão da extração em novas fronteiras, como a Foz do Amazonas, e a concentração da produção que precisar subsistir em áreas já em produção, como o pré-sal, onde novas descobertas continuam a ser feitas (a britânica BP fez neste ano, na bacia de Santos, sua maior descoberta em 25 anos em qualquer lugar do mundo).
“A Petrobras é uma empresa sem dúvida muito importante para o país, mas que necessita internalizar a crise climática com muito mais vigor do que fez até agora”, afirma Suely Araújo, coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima e uma das autoras de “A Petrobras de que Precisamos”. “Seu plano de negócios pode e deve ser ousado na perspectiva da diversificação de atividades, com destaque para investimentos em energias de baixo carbono e na transição energética. Sem perder a sua relevância para o mercado e para o país, a Petrobras de que precisamos tem de assumir o papel de agente de transformação no setor de energia, pautada pela inovação tecnológica e pela descarbonização e considerando as devidas salvaguardas socioambientais”, prossegue Araújo.
Young, da UFRJ, diz que é razoável imaginar que o Brasil ainda precisará de petróleo por algum tempo, mas que “não faz sentido” que o óleo tenha se tornado a principal commodity de exportação do Brasil.
“A Petrobras que eu quero é uma Petrobras pública, que atinja os objetivos do desenvolvimento nacional, que mantenha, sim, uma atividade importante, mas sem uma expansão que tenha o objetivo de exportar e gerar caixa”, diz. Ele afirma que a empresa também precisa usar seus dividendos para financiar a mitigação – na forma do controle do desmatamento – e a adaptação. “É preciso aumentar o investimento em transição energética e também em mitigação. Uma Petrobras mais ativa no combate ao desmatamento e também na adaptação climática.”
Sobre o Observatório do Clima – Fundado em 2002, é a principal rede da sociedade civil brasileira com atuação na agenda climática. Reúne hoje 162 integrantes, entre organizações socioambientais, institutos de pesquisa e movimentos sociais. Seu objetivo é ajudar a construir um Brasil descarbonizado, igualitário, próspero e sustentável. O OC publica desde 2013 o SEEG, estimativa anual das emissões de gases de efeito estufa no país.
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O post “Estudos sugerem rota para descarbonizar a Petrobras” foi publicado em 16/09/2025 e pode ser visto originalmente na fonte Observatório do Clima