DO OC – Emissões de gases estufa por grandes petroleiras e produtoras de cimento contribuíram diretamente para ao menos 213 ondas de calor extremo que causaram mortes e prejuízos pelo mundo de 2000 a 2023.
Sem a poluição atribuída à ação das 180 “carbon majors”, diz estudo publicado nesta quarta-feira (10) pela revista Nature , parte significativa desses eventos seria menos intensa ou mesmo “virtualmente impossível” de ocorrer. Metade do aumento da intensidade de todas as ondas de calor neste século também pode ser atribuída às emissões dessas 180 entidades.
A Petrobras integra a lista das quinze maiores poluidoras, que também inclui as norte-americanas ExxonMobil (que causou sozinha 51 ondas de calor) e Chevron, as britânicas British Petroleum e Shell, além das estatais Saudi Aramco (Arábia Saudita), Pemex (México), Gazprom (Rússia), National Iranian Oil Company (Irã) e CHN Energy (China).
O estudo cita ainda a antiga União Soviética (que lidera o ranking dos poluidores) e empresas de carvão e cimento chinesas e indianas. Pelo menos 50 ondas de calor resultaram diretamente do carbono emitido pelas 14 maiores “carbon majors”.
“A influência das mudanças climáticas sobre as ondas de calor aumentou, e (…) todas as grandes empresas de carbono, mesmo as menores, contribuíram substancialmente”, diz trecho do estudo, liderado por Yann Quilcaille, do Instituto de Ciência Atmosférica e Climática (IAC, na sigla em inglês) de Zurique (Suíça).
Os eventos alvo do estudo foram selecionados no banco de dados internacional de desastres EM-DAT (www.emdat.be ) a partir de critérios como mortes relacionadas, perdas econômicas relevantes, declarações de estado de emergência e pedidos de socorro internacional.
Já o marco zero no ano 2000, de acordo com os pesquisadores, foi definido em razão da existência de registros mais completos a partir desta data. As ondas de calor foram então divididas em períodos: 2000-2009 (78 ocorrências), 2010-2019 (54) e 2020-2023 (81).
Esses episódios foram então avaliados com base no protocolo estabelecido pela iniciativa World Weather Attribution, no qual a probabilidade de ocorrência é calculada a partir de dados atuais comparados ao resultado de simulações do clima anterior ao período pré-industrial.
O trabalho indicou que um quarto das ondas de calor analisadas seria “virtualmente impossível” de ocorrer sem as mudanças climáticas. Houve aumento não apenas da intensidade, mas também da probabilidade: emissões de algumas carbon majors tornaram algumas ondas de calor 10 mil vezes mais prováveis, o que equivale a dizer que elas simplesmente não ocorreriam se não fossem essas empresas.
“Devido ao aquecimento global desde 1850–1900, a mediana das ondas de calor durante 2000–2009 tornou-se cerca de 20 vezes mais provável, e cerca de 200 vezes mais provável durante 2010–2019”, diz o estudo.
A definição da parcela de responsabilidade das grandes empresas de carbono partiu de um levantamento de registros de produção e fatores de emissão de 1854 a 2023.
“No total, as emissões dessas 180 empresas representam 57% das emissões cumulativas antropogênicas totais de CO2 (incluindo uso da terra) entre 1850 e 2023. Ao considerar apenas as emissões de combustíveis fósseis e cimento, a parcela sobe para 75% das emissões cumulativas de CO2 no mesmo período.”
Foi calculado então o efeito dessas emissões para a temperatura média global ao longo do período (0,67ºC de um total de 1,3ºC) e, em seguida, o efeito estimado sobre cada uma das ondas de calor analisadas.
“As emissões das grandes empresas de carbono contribuíram para metade do aumento da intensidade das ondas de calor desde 1850-1900. Dependendo da empresa, sua contribuição individual é suficientemente alta para possibilitar a ocorrência de 16 a 53 ondas de calor que teriam sido virtualmente impossíveis em um clima pré-industrial”, diz o estudo.
Agrupadas por países, empresas sediadas nos Estados Unidos (33) e China (33), somaram 10% e 12% das emissões, respectivamente. No caso da Petrobras, o estudo indica que o conjunto de emissões da companhia contribuiu para que 22% dos eventos tivessem sua chance de ocorrência aumentada em mais de 10 mil vezes.
Para os pesquisadores, os resultados são importantes não apenas no âmbito científico, mas também em “litígios e esforços mais amplos relacionados à responsabilização corporativa”.
“Os processos legais relacionados ao clima estão proliferando, com vítimas buscando compensação por perdas e danos ou exigindo ações climáticas mais ambiciosas de corporações e nações. Embora este trabalho tenha como objetivo preencher lacunas científicas, os resultados também preenchem lacunas probatórias.”
Em comentário ao estudo na Nature, os advogados Michael Gerrard e Jessica Wentz, do Sabin Center, da Universidade Columbia, dizem que o estudo é “útil”, mas são mais céticos em relação ao caminho aberto para a litigância climática. Eles citam, por exemplo, decisões da Suprema Corte dos EUA que negaram alguns casos de litígio contra petroleiras, e o fato de que as emissões não vêm do petróleo produzido, mas da gasolina queimada nos carros – uma sutileza que frequentemente confunde juízes.
“O problema não é a fragilidade da evidência científica, mas as diversas questões legais que precisam ser resolvidas antes que os cientistas possam sentar no banco das testemunhas.”
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O post “Estudo liga emissões de petroleiras a ondas de calor pela 1ª vez” foi publicado em 11/09/2025 e pode ser visto originalmente na fonte Observatório do Clima