Shirlei Gonçalves Penha Alves, de 48 anos, esposa do secretário de Turismo da prefeitura de São Paulo e deputado estadual licenciado Rui Alves (Republicanos), foi nomeada , pela mesa diretora da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), para o cargo de assessora especial do Núcleo de Avaliações Estratégicas (NAE), em julho de 2024.
Fontes ligadas ao partido Republicanos, ouvidas pela Agência Pública sob anonimato, disseram que a nomeação de Shirlei Alves ocorreu após um “pedido do deputado licenciado ao presidente da Alesp”, o deputado André do Prado (PL). Na ocasião, Rui Alves teria solicitado a vaga para a esposa, “porque o rendimento da família foi reduzido, em virtude da perda dos benefícios como parlamentar.”
Por que isso importa?
- Nomeações de parentes de servidores públicos podem configurar nepotismo, ainda que indireto, o que é proibido por lei, mas há brechas jurídicas.
- Entendimentos sobre a súmula vinculante de número de 13, do STF, podem abrir margem para nomeações, porque a lei de improbidade administrativa só pune atos que tenham sido cometidos direta e intencionalmente pela autoridade nomeante.
Uma súmula do Supremo Tribunal Federal (STF) proíbe nepotismo na administração pública, incluindo a nomeação de cônjuges, companheiro ou parente até terceiro grau.
Especialistas consultados pela reportagem apontam que entendimentos jurídicos da Súmula vinculante de número de 13, do STF, podem abrir margem para que casos como o citado pela reportagem aconteçam, porque a lei de improbidade administrativa só pune atos que tenham sido cometidos direta e intencionalmente pela autoridade nomeante.
Para Gladstone Leonel da Silva Junior, professor de Direito Constitucional do programa de pós-graduação da Universidade de Brasília (UNB), contudo, “o princípio da moralidade já está ferido aí, por indicar a sua esposa para um cargo”. “No Brasil, infelizmente, é muito comum [esse tipo de indicação]. Às vezes isso não vai se dar por nepotismo, mas por influência política mesmo”, explica.
Ao ser comunicada do caso pela reportagem, a Alesp informou, por meio de nota, que “Shirlei Gonçalves Penha desenvolve atividades regulares no Núcleo de Avaliação Estratégica (NAE)” e que “abrirá apuração preliminar para avaliar o caso”. Comunicou também que “a Casa exige que todos servidores assinem documento de ciência e cumprimento à Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal (STF)”. [Leia a nota na íntegra ]
A reportagem apurou, por meio de consultas ao Diário Oficial, que a nomeação de Alves ocorreu 21 dias após o seu marido pedir licença do cargo de deputado estadual, para assumir o posto de secretário de Turismo da cidade de São Paulo, a convite do prefeito Ricardo Nunes (MDB), em junho de 2024.
Com salário de R$ 21,9 mil, Alves integra um grupo de mais de 50 servidores do NAE, cuja função é de fiscalizar serviços e a administração pública, com a finalidade de montar relatórios de análises sobre a eficiência dos serviços destinados à população paulista. O setor foi criado em 2015, quando o ex-deputado estadual Fernando Capez (PSDB) era o presidente da Alesp e foi alvo de críticas por sua baixa produtividade.
Nos dias 17 e 20 de setembro, a reportagem ligou no NAE, em diferentes horários, para tentar falar com Alves. No primeiro contato, a funcionária que atendeu o telefone não informou se a servidora estava no local. No segundo contato, um outro funcionário respondeu que Alves não estava “porque ela faz outras atividades fora também […], [mas] ela vem todos os dias.”
Como deputado, Rui Alves recebia R$ 33 mil de salário, R$ 3,5 mil de aluguel de escritório político e R$ 41 mil para o funcionamento de seu gabinete. Ao assumir a Secretaria Municipal de Turismo (Smtur), perdeu os benefícios da atividade parlamentar, segundo o portal da transparência da Prefeitura de São Paulo.
A reportagem tentou contato com Shirlei e Rui Alves, mais de uma vez, por telefone e WhatsApp. Eles não atenderam nossas ligações nem responderam os questionamentos até a publicação.

Nomeada duas vezes para cargos diferentes
No dia 16 de julho de 2024, a mesa diretora da Alesp havia anunciado Shirlei Alves como nova assessora parlamentar especial, no lugar de Erlon da Silva Lopes, que foi exonerado do cargo de assessor especial da Secretaria Geral da Assembleia Legislativa.
Lopes já havia atuado como chefe de gabinete do deputado e foi levado para exercer a mesma função na Smtur, após a posse de Rui Alves, onde trabalha até hoje.
Dez dias após assumir o lugar que era de Lopes, em 26 de julho, a esposa do deputado licenciado foi exonerada do cargo, mas empossada novamente para a mesma função no dia 31. O seu remanejamento para o Núcleo de Avaliações Estratégicas ocorreu no dia seguinte, em 1 de agosto, em mais um ato assinado pela mesa diretora.
Desde então, Alves tem dado expediente no setor. Segundo apuração publicada em novembro de 2024 pelo jornal O Estado de São Paulo, o NAE seria conhecido internamente como local de “cabide de empregos”, por empregar mais pessoas do que o necessário e ter baixa produtividade.
Gladstone Junior, da Universidade de Brasília (UNB), explica que, embora o cargo exercido por Alves seja de livre nomeação e exoneração, ela “está submetida aos princípios da administração pública”, que são a “moralidade, legalidade, impessoalidade, eficiência e publicidade”.
André Saddy, professor de Direito Administrativo da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), explicou que as atribuições e carga horária dos servidores são definidas de acordo com o regimento interno do órgão empregador.
“Mesmo sendo 40 horas semanais, como a maioria dos cargos, tendem a ser, o órgão pode estabelecer como aquela carga horária vai ser exercida. Se ela vai ser exercida em casa, com trabalho de uma vez por semana, duas vezes por semana no local, se ela vai ser completamente exercida no local, isso são os atos internos da entidade ou do órgão que vão determinar.”
Pastor da Igreja Universal e secretário de Turismo
Rui e Shirlei Alves estão casados há 23 anos, têm três filhos e um neto. O casal veio de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, onde mantiveram uma sociedade em uma empresa no ramo educacional, chamada Ateliê Vogue, inapta desde 2018 por omissão de declarações, segundo a Pública apurou.
Além das funções políticas, Rui Alves também é pastor da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), atribuição ressaltada em boa parte das publicações em suas redes sociais, com divulgação de campanhas e pregações pelo estado de São Paulo.
Foi somente em 2022 que ele tentou a sua primeira candidatura política, embalada pela ascensão do partido Republicanos que, na ocasião, tinha Tarcísio de Freitas como um dos favoritos à corrida eleitoral pelo governo paulista e vivia o seu melhor momento. Mesmo sem grande notoriedade política, o pastor obteve 91 mil votos e foi eleito por quociente partidário.
Por meio da Smtur, a prefeitura de São Paulo informou que o “deputado Rui Alves está à frente da Secretaria Municipal de Turismo desde 27 de junho de 2024. A pedido do prefeito Ricardo Nunes, o foco da sua atuação tem sido no aprimoramento das políticas públicas para o setor de turismo, com o objetivo de consolidar cada vez mais a capital como principal destino turístico da América Latina.”

O Republicanos, partido de Rui Alves e do governador Tarcísio de Freitas, informou que “não tem conhecimento sobre a nomeação ou transferência de servidores” e ressaltou “que as nomeações para funções na Alesp e na Secretaria Municipal de Turismo são de competência dos respectivos órgãos, sobre os quais o partido não exerce qualquer controle ou interferência”.
Fonte
O post “Esposa de secretário de Turismo e deputado licenciado assume cargo de confiança na Alesp” foi publicado em 23/10/2025 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte Agência Pública
