Depois do massacre na creche de Saudades, Santa Catarina, no dia 4 de maio, já foram quatro ataques a escolas que a polícia conseguiu impedir! Quatro!
Hoje foi a Delegacia Especial aos Crimes Cibernéticos que deflagrou a Operação Shield , junto com a Polícia de Imigração e Alfândega dos EUA, e foi atrás de vários indivíduos (a notícia não diz quantos) que pretendiam atacar uma escola em Brasília (o nome da escola não foi divulgado). Além dos dois órgãos citados, a Agência de Investigação de Segurança Interna (Homeland Security Investigations), a Coordenação do Laboratório de Inteligência Cibernética do Ministério da Justiça e Segurança Pública, a Divisão de Inteligência Policial (DIPO) e a Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos – (DRCC) também participaram do caso.
Ano passado, por causa da pandemia, tivemos um ano relativamente tranquilo em matéria de ataques virtuais. Vimos que várias vereadoras negras e trans foram (e continuam sendo ) ameaçadas de morte depois de terem sido eleitas. Porém, pra felicidade geral da nação e grande frustração desses grupos de ódio, não tínhamos um massacre desde Suzano, em março de 2019. 2021 começou com tudo, no entanto.
Creio que esse número altíssimo de ataques só em maio de 2021 (um massacre e quatro planos que ainda bem que foram abortados a tempo) revela como certos jovens antissociáveis estão inquietos e ansiosos. O que membros de chans (fóruns anônimos) mais fizeram no ano passado foi invadir palestras online para divulgar imagens nazistas e pornográficas e mensagens de ódio. Descobri recentemente que esse “fenômeno” internacional tem até nome — chama-se zoombombing (por causa da plataforma Zoom).
A vereadora Larissa Gaspar, do PT de Fortaleza, foi alvo de um desses ataques esta semana. Na presença de mais de cinquenta assistentes sociais e psicólogxs, ela promovia uma plenária virtual do seu mandato. A live foi atacada por hackers que proferiram xingamentos misóginos às mulheres e feministas, além de promoverem o nome de Bolsonaro.
Mas, recapitulando: no dia 4 de maio de 2021 o país inteiro foi pego de surpresa com o hediondo massacre numa creche em Saudades, SC, cidade com menos de 10 mil habitantes. Um rapaz de 18 anos, Fabiano Kipper Mai, invadiu uma escola para crianças de 6 meses a 2 anos de idade e matou duas professoras e 3 bebês. Feriu ainda um outro bebê, que sobreviveu. A preocupação de Fabiano, mesmo depois de ter tentado o suicídio, foi saber quantos ele matou.
O delegado do caso declarou que Fabiano agiu sozinho. Parte da mídia reportou errado. “Agir sozinho”, ou seja, cometer o ato sem ajuda, não quer dizer que ele não foi encorajado ou auxiliado durante o planejamento de vários meses. O que se sabe é que ele tentou insistentemente conseguir armas de fogo, não conseguiu, e desistiu dos seus alvos iniciais (ex-colegas) e partiu para os mais vulneráveis possíveis (bebês com menos de 2 anos de idade).
Segundo o delegado Jerônimo Marçal Ferreira, Fabiano era (é; está vivo, preso em Chapecó, e será julgado por cinco homicídios triplamente qualificados e uma tentativa) uma pessoa “”extremamente isolada e com muita dificuldade de se relacionar com as pessoas. Isso fez com que ele fosse cada vez mais se isolando desse nosso mundo e entrando num outro mundo, consumindo conteúdo online de muita violência, de muito ódio, e tendo contato com pessoas com pensamento parecido, com muito ódio, rancor, frustrações, e ele foi cada vez mais alimentando dentro dele esse sentimento de ódio, de raiva, e começou, nos últimos tempos, a trabalhar para materializar esse ódio”.
Não sei quanto a vocês, mas pra mim esse “outro mundo” parece ser a descrição exata de chans.
No dia 6 de maio, dois dias depois do massacre em Saudades, SC, um adolescente de 15 anos se preparava para cometer um atentado em escolas de Cabo Frio , região dos Lagos no Rio de Janeiro. Foram encontrados na casa do jovem botas nazistas, martelo, bombas caseiras, facas, um caderno com ilustrações nazistas. O laboratório de crimes cibernéticos entrou em contato com a delegacia de Cabo Frio, que foi capaz de detê-lo antes do massacre. Ele admitiu. Os pais não faziam ideia dos planos do filho.
No dia 10 de maio, Genilson Rodrigues Santana, 19 anos, foi preso pela polícia civil em SP, pois tinha planos de executar um ataque numa escola. Ele havia sido detido ano passado, quando planejava atacar uma escola no dia 13 de março. Esta é a data do massacre de Suzano, em 2019! Genilson iria fazer um massacre comemorativo. Foi preso e liberado logo em seguida, alegando insanidade mental. Desta vez, foi denunciado por corrupção de menores, já que estava tentando convencer menores de idade a realizarem atentados, e ficará em prisão preventiva.
Porque é isso que eles fazem: recrutam jovens. Às vezes é para cometer um atentado, mas há outros estágios antes disso. Por exemplo, gravar um vídeo com seu rosto dizendo ser meu filho . Ou fazer um vídeo dizendo que eu abusei sexualmente dele no banheiro de um congresso escolar. Foi o que integrantes do chan comandado por Marcelo fizeram para serem aceitos (sem sucesso, já que ambos são pardos e nordestinos. Com esse perfil, pra obter reconhecimento num fórum neonazista, só cometendo massacre mesmo).
No dia 15 de maio (semana passada), a polícia civil fez uma busca e apreensão na casa de uma adolescente (nome, idade, escola não foram divulgadas). A garota escreveu mensagens em suas redes sociais prometendo matar colegas e familiares. Na casa, foram encontradas facas e um facão. Ao depor, ela alegou que não tinha intenção de seguir com o plano. Os pais, estupefatos, não sabiam o que estava acontecendo.
A delegada do caso, Danielle Aguiar Carvalho, disse à imprensa: “O comportamento dos adolescentes tem mudado, sobretudo com o panorama atual e requer atenção dos familiares. Os pais e familiares precisam ser diligentes na condução da educação e na fiscalização dos atos de seus filhos. Conhecer o comportamento deles nas redes sociais e grupos de Whatsapp. É importante que se faça essa fiscalização e que se esteja atento a qualquer mudança de comportamento”.
Sim, os pais precisam saber o que os filhos fazem na internet. Tudo passa pela educação. Por isso seria muito útil pra sociedade se as escolas oferecessem espaço pra jovens combaterem o bullying e falarem de suas angústias, da raiva que sentem, das imposições do mundo, do “outro mundo” online, da masculinidade frágil e tóxica, de questões de gênero, raciais, de sexualidade.
E quanto às polícias, elas estão de parabéns por finalmente fazerem o que pedimos há tantos anos: que usem a estrutura e a inteligência que têm para monitorar chans que são verdadeiros criadouros de terroristas misóginos e impedir que eles ajam. E as várias polícias de cada estado (e também as internacionais) troquem informações e possam agir em conjunto.
Ainda não sabemos com certeza se esses assassinos eram frequentadores de chans. Sabemos que, assim que cometeram seus atos hediondos, viraram ídolos nos chans. Falta saber se foram encorajados nos chans, se houve planejamento nesses espaços. No entanto, o fato de que quatro ataques em estados diferentes quase aconteceram em maio é um alarme de que está havendo um planejamento pra isso nos chans, ou de que toda essa máquina de ódio começa a render frutos.
É terrível. Nosso país já está tão destruído, com o pior presidente da história, com o presidente mais genocida para combater uma pandemia que ele continua negando, e ainda por cima isso.
O post “DEPOIS DO MASSACRE NA CRECHE, QUATRO ATENTADOS EM ESCOLAS FORAM IMPEDIDOS PELA POLÍCIA SÓ EM MAIO” foi publicado em 21st May 2021 e pode ser visto originalmente na fonte Escreva Lola Escreva