
A Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa da Câmara dos Deputados vai analisar as sugestões colhidas em audiência pública sobre a interdição abusiva de pessoas idosas, a fim de transformar as contribuições em propostas de aprimoramento legislativo e institucional.
O debate, realizado nesta quarta-feira (5), abordou o uso indevido de processos de interdição, muitas vezes motivados por interesses financeiros de familiares, e ainda mecanismos para proteger pessoas com plena capacidade cognitiva.
A interdição é um processo legal destinado a proteger os interesses de indivíduos que não possuem capacidade de discernimento. Por meio dela, a Justiça declara a incapacidade da pessoa para gerir atos da vida civil e nomeia um curador para representá-la e tomar decisões em seu nome.
Essa medida é aplicada em casos de doenças mentais, deficiências ou dependência química, por exemplo. Embora seja um instrumento protetivo e deva ser excepcional, o que se observa, segundo especialistas, é uma distorção de seu uso.
O advogado e professor do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa Rafael Carneiro observou que, na prática, herdeiros têm buscado antecipar a gestão de patrimônio por meio de processos indevidos.
Carneiro citou caso divulgado na imprensa em que a reação dos filhos a um litígio financeiro foi um processo de interdição contra o pai. A tentativa infrutífera não gerou nenhum tipo de consequência legal.
O deputado Eriberto Medeiros (PSB-PE), que sugeriu o debate, lamentou que uma ferramenta de proteção venha sendo usada como forma de violência. “Casos vêm à tona em que pais e mães lúcidos e ativos são interditados, apenas porque seus filhos, parentes ou terceiros desejam controlar seus bens e silenciar suas opiniões.”
Preconceito etário
A procuradora de Justiça do Rio Grande do Norte Iadya Gama Maio criticou a estrutura judicial atual, que falha em proteger a autonomia do idoso. “A máquina judicial brasileira ainda impera sob a lógica da incapacidade presumida da idade”, declarou. “Vivemos o que eu denomino de paternalismo jurídico etário, uma estrutura que infantiliza o idoso, o despoja de sua voz e reduz a velhice à tutela”, afirmou.
Iadya Maio destacou ainda a “negação da humanidade processual”, que ocorre quando a Justiça não escuta a pessoa idosa e decide apenas com base em laudos médicos.
Por sua vez, o professor de direito Paulo Roberto Barbosa Ramos, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), disse que envelhecimento não deve ser confundido com incapacidade. “O envelhecimento não é motivo para interdição. Motivo é a incapacidade da pessoa para gerir seus atos – trabalhar com seus recursos, suas finanças, seus negócios – em razão de uma doença severa que a torne incapaz de exprimir a sua vontade”, explicou.

Sugestões
Para coibir o uso indevido e fraudulento da interdição, os especialistas apresentaram algumas propostas:
- tipificação criminal específica da conduta, com penalidades mais duras e multas;
- exclusão de herdeiros que tomam medidas de interdição abusiva;
- criação de equipes multidisciplinares no Poder Judiciário para realizar avaliação biopsicossocial da pessoa idosa, que vá além do laudo médico;
- fiscalização permanente pelo Judiciário, com visitas periódicas aos alvos dos processos de interdição para saber se estão sendo bem cuidados;
- incentivo à autotutela, para que a pessoa idosa, prevendo a diminuição futura de sua capacidade, defina previamente quem cuidará dela e como seus bens serão tratados;
- revisão institucional, a fim de promover a interlocução entre Judiciário, Legislativo, bancos e cartórios para eliminar exigências indevidas de termos de curatela que forçam idosos a serem declarados incapazes para receber benefícios; e
- ratificação, pelo Brasil, da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos, que está pronta para ser votada pelo Plenário da Câmara (PDC 863/17 ).
O deputado Eriberto Medeiros informou que buscará agilidade no projeto referente à convenção.
Fonte
O post “Comissão analisará sugestões para combater interdição abusiva de pessoas idosas” foi publicado em 05/11/2025 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte Câmara notícias – Câmara dos Deputados
