DO OC – A China, maior poluidor climático do mundo, anunciou enfim nesta quarta-feira (24) sua NDC, o compromisso de corte de emissões de gases de efeito estufa no Acordo de Paris. O presidente Xi Jinping fez uma aparição por videoconferência na cúpula de líderes sobre clima organizada pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, e pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sede da organização, em Nova York. E declarou que seu país reduzirá emissões em 7% a 10% até 2035 “em relação ao pico”.
Xi disse mais: que seu país quer aumentar a fatia de renováveis de 10% para 30% do consumo de energia, expandir em seis vezes a capacidade instalada em energia solar, para 3.600 gigawatts (para comparação, a matriz elétrica brasileira inteira tem 200 gigawatts), atingir 24 bilhões de metros cúbicos em estoque florestal, e eletrificar os transportes.
Trata-se de um compromisso enigmático, como todo o mais que envolve o gigante. Afinal, ninguém sabe ao certo se a China atingiu o pico de emissões no ano passado (com 15,8 bilhões de toneladas de CO2 equivalente, ou 32% do total mundial) ou se o atingirá este ano. Portanto, é impossível neste momento traduzir a meta em toneladas de carbono reduzidas, e a linha de base poderá variar. Uma análise do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) mostrou que a China teria condição de reduzir emissões em pelo menos 30%, o que seria compatível com uma trajetória de 1,5oC de aquecimento. Sua NDC, portanto, não está alinhada com a meta de temperatura do Acordo de Paris.
Por outro lado, o anúncio chinês merece ser comemorado, por três motivos: é uma sinalização positiva para a COP30; é a primeira vez que a China admite metas de redução absolutas e para toda a economia; e os chineses têm o hábito de prometer menos do que costumam entregar no mundo real.
Xi repisou a antiga linha chinesa das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, que costuma brandir toda vez que alguém cobra liderança chinesa em corte de emissões. Por esse princípio, caro aos países em desenvolvimento, as nações ricas devem arcar com a fatia do leão da ação climática, já que foi sua industrialização a principal causadora da crise. Apesar de já serem o maior usuário e o maior fornecedor do mundo de tecnologias de energia renovável, os chineses hesitam em ocupar o centro do palco da liderança política no clima, justamente por medo de perderem o status de país em desenvolvimento e serem forçados a abrir a bolsa e contribuir com financiamento.
No total, 101 países marcaram presença no evento de quarta-feira em Nova York. Destes, 47 apresentaram novas NDCs e 51 prometeram submetê-las até o fim do ano. Essas nações respondem, juntas, por 68% das emissões de gases de efeito estufa do planeta. O governo brasileiro comemorou a presença de quatro dezenas de chefes de Estado e governo – além de Xi, desfilaram no púlpito a comissária da UE, Ursula von der Leyen, que anunciou os números da NDC que o bloco jurou entregar até novembro; os presidentes da França, Emmanuel Macron, do Chile, Gabriel Boric, e do Quênia, William Ruto; os premiês da Espanha, Pedro Sánchez, e da Austrália, Anthony Albanese, e o eterno líder da Turquia, Recep Erdogan.
Sentida foi a ausência de Narendra Modi, da Índia. O terceiro maior emissor do mundo segue magoado com o atropelo da COP29, na qual os países em desenvolvimento ficaram com pouco financiamento climático, e está catimbando com a NDC. A Rússia, quarto maior emissor, mandou um representante, já que Vladimir Putin não pode viajar à ONU por ter um mandado de prisão do Tribunal Penal Internacional.
Lula, o anfitrião, fez mais um discurso correto, porém pouco inspirado. “Em um mundo em que graves violações se tornaram corriqueiras, deixar de apresentar a NDC parece um mal menor. Mas, sem o conjunto das NDCs, o mundo caminha no escuro”, afirmou, repetindo o discurso da véspera na Assembleia Geral “Só com o quadro completo saberemos como e em que ritmo estamos indo. Os países aqui reunidos estão cumprindo o seu dever, mas há outros que não o fizeram
negacionismo que enfrentamos não é apenas climático, mas também multilateral.” O resultado, afirmou, é um “círculo vicioso de desconfiança e paralisia.”
O evento desta quarta-feira na ONU sedimentou um segredo de polichinelo: as NDCs apresentadas em 2025 serão insuficientes para colocar o mundo numa trajetória de aquecimento de 2oC – que dirá 1,5oC, como preconiza o Acordo de Paris. Setembro era a data final da prorrogação da apresentação das NDCs, cujo prazo era 10 de fevereiro. NDCs apresentadas depois desta quarta-feira não poderão ser incluídas no relatório-síntese que a UNFCCC, a Convenção do Clima da ONU, apresentará em outubro para estimar o tamanho da lacuna de ambição.
Caberá à COP de Belém responder politicamente a esse hiato entre o que está sendo prometido e o que deveria ser alcançado (segundo a ciência, 60% de redução de emissões em 2035 em relação a 2019). Como a COP fará isso é um mistério. Na quinta-feira, o presidente da conferência, André Corrêa do Lago, reuniu ministros e chefes de delegação em Nova York para mais uma rodada de consultas aos países sobre este e outros temas espinhosos, como um calendário para a saída dos combustíveis fósseis.
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O post “China apresenta meta climática enigmática” foi publicado em 26/09/2025 e pode ser visto originalmente na fonte Observatório do Clima