Pesquisadores e ambientalistas alertam que o Pampa, as matas com araucárias e ambientes aquáticos são escanteados no enfrentamento das emergências globais da mudança do clima e da perda de biodiversidade. Manifesto público foi enviado ao governo de Joe Biden (Estados Unidos) durante a Cúpula de Líderes sobre o Clima. A mobilização desde a Região Sul pode se tornar permanente.
Ambientes típicos dos estados sulistas estão desaparecendo num ritmo alarmante e sem a devida atenção pública brasileira e externa. Pampa, florestas com araucárias e ambientes aquáticos mantêm grande variedade de animais e plantas únicos e elevados estoques de carbono, ajudando no combate à crise climática.
Coordenador técnico da ONG Curicaca, Alexandre Krob comenta que a conservação e o uso realmente sustentável desses ambientes não são levados a sério em agendas nacionais ou internacionais. E que isso acirra a concorrência desses “ambientes abertos” com ações de conservação focadas em florestas.
“Todo mundo pensa que o Brasil é apenas a Amazônia e isso é um erro geográfico, ecológico e político. Outros biomas e ecossistemas têm papel muito importante para a biodiversidade e para o controle do aquecimento global”, ressaltou o agrônomo. Afinal, não faltam motivos para que essas regiões recebam mais atenção.
O Pampa foi reconhecido como um bioma em 2004. Antes, integrava a Mata Atlântica. Domina a metade sul do Rio Grande do Sul. Tem mais de 3.500 tipos diferentes de plantas. Seus ambientes abrigam animais ameaçados de extinção e são parada de aves migrando pelo continente. O subsolo estoca grandes quantidades de carbono, ajudando a segurar as pontas da crise climática.
Mas tais serviços estão em xeque. O bioma já perdeu 2 milhões de hectares para pastagens artificiais, grãos, eucaliptos e pinus. É a maior taxa de destruição se comparada a das outras grandes regiões naturais. O plantio de soja com agrotóxicos saltou 189% entre 2000 e 2015. É o principal motor da destruição do Pampa no Brasil, mostra o MapBiomas.
Nas elevações do Sul e Sudeste, campos com imponentes araucárias atraem aves como papagaio-charão e gralha-azul e também muita gente. Todos buscando belas paisagens e pinhões, base de pratos e festas típicas. Serrarias e agropecuária reduziram essas matas a 3% do que foram um dia. Mesmo dizimado, o pinheiro-brasileiro é alvo de projetos para manejo comercial.
Peixes, aves migratórias, crustáceos e até espécies desconhecidas pela Ciência vivendo em lagoas, rios e córregos entremeados ao Pampa e matas com araucárias da mesma forma merecem mais estudos e proteção, pediram pesquisadores e ambientalistas em manifesto enviado ao governo Joe Biden durante a Cúpula de Líderes sobre o Clima, em abril.
A carta que tem mobilizado mais cientistas e ONGs para influenciar políticas conservacionistas lembra que esses ambientes têm grande potencial para um uso comercial sustentável e restauração ecológica.
Boiada verde
A pecuária extensiva no Pampa ajuda a conservar pastagens e outras plantas e animais nativos, além de ser um contraponto à carne produzida com a destruição de outros biomas. O rebanho bovino cresceu 22% na Região Norte apenas desde 2004, mas a maioria do gado pisoteia o Cerrado, conforme o InfoAmazonia.
“No Brasil, desmatam florestas para por pasto e gado. E onde tem pasto nativo apto à pecuária, se elimina o pasto para plantar soja e árvores exóticas”, pondera Pedro Develey, diretor-executivo da Save Brasil.
A ONG integra um esforço que associa pecuária e conservação de pastagens naturais. A carne certificada produzida em 243 fazendas no Brasil rende mais aos pecuaristas e chega a supermercados do Rio Grande do Sul e São Paulo. A iniciativa alcança Argentina e Uruguai, onde a carne também é exportada.
“O gado criado em campos nativos tem carne mais macia e saborosa. Uma pastagem natural bem manejada é tão produtiva e lucrativa quanto uma lavoura de soja. Isso fez muitos pecuaristas abrirem porteiras para ambientalistas, algo raro no país. Agora cada um destes fazendeiros é um ‘guarda parque’”, detalhou Develey.
A estratégia cabe como uma luva num bioma que tem apenas 3,3% em unidades de conservação federais e estaduais e abriga mais de 570 tipos de pássaros. 120 deles só vivem em campos conservados e 23 estão ameaçados de extinção.
Por motivos como esse, o ex-secretário Executivo da Convenção sobre Diversidade Biológica das Nações Unidas, Bráulio Dias, defende que a restauração de ambientes como as florestas com araucárias e campos nativos pode amarrar políticas e ações de combate à mudança do clima e da perda de biodiversidade.
“Além da Amazônia, os demais biomas enfrentam grandes desafios para sua conservação. A mudança climática afeta a biodiversidade, enquanto conservar dará mais chances para a natureza se adaptar às alterações do clima. Restauração ajuda as duas agendas, pois sequestra carbono e restabelece a conectividade entre ecossistemas”, ressaltou o professor da Universidade de Brasília (UnB).
Que ações como essas se tornem logo uma realidade, evitando o desaparecimento de ambientes tão ricos à cultura e à natureza brasileiras.
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O post “Barrados no baile das políticas climáticas e de biodiversidade” foi publicado em 10th May 2021 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte ((o))eco