Por António Vitorino*
Com frequência, quando falamos de migrantes, nos deparamos com nós mesmos falando sobre momentos de extrema dificuldade, presos numa narrativa de crise. Aqueles que estão detidos na Líbia, traficados dentro de caminhões, procurando novas vidas longe de Estados falidos, conflitos e desastre.
Nesta quarta-feira (18), Dia Internacional dos Migrantes, lembramos dessas pessoas e reiteramos a necessidade de respeitar os direitos e a dignidade para todos. É um dia reservado pelas Nações Unidas para reconhecer um número estimado de 272 milhões de migrantes que são membros integrais da nossa sociedade hoje.
Mas é também um dia para reconhecer a generosidade e hospitalidade das comunidades que abraçam as pessoas que chegam com pouco ou nada além de seus próprios nomes. Na Colômbia, na Alemanha e ao redor do globo, temos visto exemplos de comunidades que estão compartilhando suas casas e vidas com aqueles menos afortunados. Muitas das comunidades nas quais os migrantes chegam também são frágeis, limitadas em recursos e lutando para florescer.
Neste ano, a Organização Internacional para as Migrações (OIM) escolheu focar na coesão social, em reconhecimento não apenas aos migrantes, mas também às comunidades nas quais eles podem e vão prosperar. Nossa sociedade não é estática; nossas redes de comunidade estão constantemente se quebrando e se reconstruindo quando se deparam com mudanças, seja em razão de recessão econômica, envelhecimento populacional ou tensões por visões políticas diferentes.
Com frequência, quando falamos sobre migração, nós debatemos se é bom ou ruim, se custa muito ou se dá pouco retorno e contribuições precisas que os migrantes trazem para nossas vidas. Mas ver a migração como uma prática contábil é reduzi-la a uma fração de um todo. É uma parte crescente —e muitas vezes desafiadora— e integral da nossa sociedade, enriquecendo-a de maneiras múltiplas e intangíveis.
Com frequência, esquecemos que os migrantes já são, silenciosamente, parte das nossas vidas, suas contribuições entrelaçadas em nossas interações diárias. Alguns acadêmicos estão estudando para conseguir novas habilidades. Outros são trabalhadores buscando potencializar suas experiências para um salário melhor ou uma maior variedade de oportunidades. Outros integram famílias que se uniram a seus entes queridos, para cuidar deles e começar um novo capítulo em suas vidas.
Muitos migrantes cruzaram a fronteira mais próxima por oportunidades em países não muito diferentes dos seus. Na verdade, mais e mais vemos trabalhadores rotineiramente cruzando fronteiras, morando em um país e trabalhando no outro. Outros cruzam continentes e oceanos, dando passos gigantes —e assumindo riscos gigantes— para se unir a novas sociedades com diferentes línguas, práticas religiosas, comidas e normas culturais. Eles assumem grandes riscos para serem bem-sucedidos entre nós.
Migrantes precisam mudar para lidar com os desafios de se adaptar a um novo ambiente social e cultural e respeitar valores —igualdade de gênero, por exemplo— das comunidades que agora eles integram. Respeito mútuo por crenças diversas é um dos pilares da coesão social que trabalha para o benefício de todos.
As comunidades que prosperam são aquelas que abraçam a mudança e se ajustam a ela. Migrantes são um elemento integral e bem-vindo para essa mudança. Migrantes podem se tornar —com surpresa frequente— campeões de resiliência quando os tempos são difíceis, quando a comunidade experimenta choques inesperados, incluindo de mudança ambiental a desastres, de desemprego a turbulências políticas.
Mas as comunidades não podem se adaptar sozinhas. Elas precisam do apoio de governos e de organizações como a OIM para garantir provisão adequada de serviços públicos, orientação e apoio de idioma, investimento em capital humano e ampliar o fortalecimento da infraestrutura comunitária.
Hoje, o clima político é desafiador, e com frequência os migrantes se tornam bodes expiatórios para todos os males da sociedade, em vez de serem um dos elementos de cura. Assim, neste dia, precisamos constantemente lembrar a comunidade internacional da realidade —contemporânea e histórica— de que, quanto melhor administrada a migração, sociedade fechadas podem se tornar abertas e tensões políticas podem desaparecer.
Se estamos vivendo, trabalhando, amando ou construindo, façamos isso juntos.
*Diretor-geral da Organização Internacional para as Migrações (OIM)
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