Bolso fechou o
debate da Band no domingo com chave de ouro, fazendo o que faz o tempo todo: mentindo. Insinuou que o atual presidente do Chile, Gabriel Boric, era um terrorista queimador de metrô. Criou uma crise diplomática com uma nação hermana.
Pedi pra minha
correspondente no Chile escrever sobre isso. Publico o texto da jornalista
Isabela Vargas , mãe da Gabriela e feminista, que integra a coordenação do coletivo Mujeres por la Democracia Santiago de Chile, e que organizou os protestos do #EleNao no Chile. Fala, Bela!
O Chile foi o assunto mais comentado do Twitter e nos principais meios de comunicação no início dessa semana. O motivo não foi o plebiscito mais importante na história recente do país que votará no próximo domingo, 4 de setembro, o texto da nova constituição, elaborado numa assembleia constituinte escolhida pelo povo chileno. Nada disso… Quem colocou o Chile nos assuntos mais comentados foi o presidente do Brasil com mais uma de suas
declarações desastrosas .
No debate realizado pela rede de TV Band, em suas considerações finais,
Bolsonaro atacou o candidato que lidera as pesquisas de intenções de voto nessas eleições, o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva. Bolsonaro criticou a afinidade de Lula com lideranças de esquerda no continente citando Maduro (Venezuela), Fernández (Argentina), Petros (Colombia) e Gabriel Boric, presidente do Chile, quem – segundo Bolsonaro – incendiou o metrô de Santiago.
A acusação infundada não me surpreende. Com bastante frequência vejo tweets de bolsonaristas tentando assustar os eleitores brasileiros usando imagens antigas do estalido social que sacudiu o Chile em outubro de 2019 como se fossem atuais. Na época, as manifestações foram marcadas pelo confronto direto dos manifestantes com a polícia chilena, os Carabineros de Chile.
Quem queimou o metrô?
Um dos eventos mais marcantes foi o incêndio do metrô de Santiago, que até hoje não teve um desfecho porque a investigação ainda está em curso. O ataque ao metrô sempre foi motivo de suspeitas porque os protestos começaram com os estudantes que reclamavam do aumento dos preços das passagens. A forma de luta era pular as catracas e entrar no metrô em grupos.
Rapidamente, os jovens ganharam a simpatia e a solidariedade dos demais usuários desse serviço de transporte. Na mesma medida em que eles ganhavam apoio e visibilidade, a equipe de segurança do metrô e os Carabineros intensificavam o uso de força física contra os manifestantes.
No dia em que eclodiu o estalido, várias estações do metrô foram palco dos protestos. Por conta disso, o metrô fechou mais cedo e encerrou suas atividades muito antes das 23:00 horas naquele dia. Naquela mesma noite, do 18 de outubro de 2019, um incêndio em série destruiu várias estações do metrô.
A partir disso, o governo decretou Estado de Emergência e qualificou o incêndio como atentado terrorista. Quando Bolsonaro se refere a Boric como autor dos incêndios, não só está mais uma vez mentindo, como também comete um grave deslize diplomático.
É mentira que o atual presidente do Chile tenha relação com os incêndios do metrô de Santiago. E aí reside a maior ironia desta mentira bolsonarista. Todas as evidências, até o momento, indicam que os responsáveis pela queima dos vagões foram justamente
integrantes da polícia chilena .
Uma
reportagem da emissora La Red , exibida em maio deste ano, incluiu imagens das câmeras de segurança que mostram claramente o ingresso dos policiais na estação de metrô. A equipe entra, revisa a estação, desce até onde estão os carros e, quando os policiais saem, as imagens captam fumaça, indicando que o fogo já tinha começado. Depois da reportagem, dois funcionários dos Carabineros foram identificados e indiciados pelo Ministério Publico, que investiga os eventos daquele 18 de outubro de 2019.
Como o governo do Chile reagiu às declarações de Bolsonaro?
Obviamente, o governo do Chile respondeu imediatamente após as declarações de Bolsonaro, que repercutiram nas redes sociais. A ministra de relações exteriores, Antonia Urrejola, se manifestou no dia seguinte, durante uma atividade do governo, numa coletiva.
Ela afirmou que as acusações são graves “não só porque acusam ao presidente e ao governo de atos gravíssimos e delitos, mas também a todos os chilenos e chilenas que têm como presidente a Gabriel Boric”.
Além da declaração, o ministério divulgou uma nota oficial e convocou o embaixador do Brasil no Chile, Paulo Roberto Soares Pacheco, para prestar esclarecimentos sobre o acontecimento.
A porta-voz do governo, Camila Vallejo,
também se referiu às declarações do presidente brasileiro. “Lamentamos que a relação bilateral com o Chile tenha sido usada politicamente na campanha presidencial brasileira. É injustificável que o presidente Bolsonaro tenha acusado nosso presidente, democraticamente eleito, ao dizer falsidades graves”, afirmou em declaração veiculada em redes sociais e nos canais oficiais do governo chileno.
A mentira como método
Nada disso parece abalar o mandatário brasileiro, que reafirmou suas declarações logo após a repercussão negativa. Totalmente indiferente às criticas, no dia seguinte, ele
voltou a insistir na mentira.
A reação do governo chileno foi firme e necessária, especialmente no contexto atual que o país vive, em que deve decidir se enterra da uma vez por todas a constituição do ditador Augusto Pinochet, ídolo de Bolsonaro, e abre caminho rumo a um novo Chile, onde a nova carta magna começa a reescrever a história do pais exatamente assim: “O Chile é um estado social e democrático de direito. É multinacional, intercultural, regional e ecológico”.
Eu voto
#Apruebo e, por isso, no próximo dia 4 de setembro votarei para aprovar o texto da nova constituição. Também votarei aqui no consulado chileno no próximo dia 2 de outubro para eleger Lula presidente e recuperar a dignidade do nosso povo brasileiro. Os chilenos já mostraram que isso é possível e eu acredito neles.