A perseguição da mineradora Sigma Lithium ao Observatório da Mineração via notificação extrajudicial em tentativa de intimidação e censura prévia gerou reações da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e outras 22 instituições de pesquisa.
A Abraji afirmou em nota que “rechaça a atitude da mineradora Sigma Lithium ao tentar intimidar e censurar o trabalho jornalístico, antes mesmo de ter sido publicado”.
De acordo com a associação, “o uso de notificações extrajudiciais com o intuito de intimidar o trabalho jornalístico tem se disseminado. O caso chama atenção por se tratar de uma tentativa de censura prévia, condenada veementemente pela Constituição Federal. E a ação da mineradora atinge não só a liberdade de imprensa do veículo de divulgar documentos públicos e de relevante interesse social, mas também a liberdade científica e de manifestação do pensamento dos pesquisadores envolvidos”.
A Abraji ressaltou que “se trata de uma violação a um direito fundamental e espera que a empresa não siga adiante com práticas intimidatórias, na esfera judicial ou fora dela. (…) O dever de proteger e respeitar a liberdade de imprensa se estende também às empresas e à sociedade como um todo”.
Já a ABA e dezenas de instituições de pesquisa afirmaram em nota publicada nesta segunda que “vem a público manifestar preocupação e repúdio quanto à tentativa da empresa Sigma Lithium S.A. de impedir a divulgação das análises realizadas por pesquisadores de núcleos de pesquisa consolidados, no Brasil e no exterior, sobre os impactos ecológicos e sociais de suas atividades”.
A ABA defende o direito de exercer livremente o trabalho de pesquisa, o que inclui analisar o caso de mineradoras como a Sigma, cujo processo de licenciamento foi estudado minuciosamente por pesquisadores da UFMG, Unimontes, UFVJM e London South Bank University, reunidos no projeto “LIQUIT – Local, Indigenous, Quilombola and Traditional Communities and the construction of the Lithium Valley; in Minas Gerais, Brazil: Empowering silenced voices in the energy transition”.
A nota técnica produzida pelos pesquisadores foi apresentada à Diretoria de Gestão Regional (DGR) da Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM) em Minas Gerais, no âmbito do processo de licenciamento ambiental do projeto de mineração, conforme previsto em legislação (DN COPAM 225/2018). Ao pedir o posicionamento sobre essa NT para a Sigma, o Observatório da Mineração foi alvo de notificação extrajudicial por parte da empresa.
A nota da ABA afirma que:
“A Nota Técnica foi divulgada também ao público por meio de informações à imprensa, nas quais os coordenadores dos grupos de pesquisa, bem como cientistas colaboradores, se manifestaram. Como é habitual, a mineradora poderia ter se pronunciado sobre os pontos abordados na Nota Técnica e, se necessário, com base em argumentos técnicos, apresentado seu contraponto, inclusive nos mesmos veículos de comunicação que publicaram a Nota do LIQUIT. No entanto, a empresa não respondeu ao Observatório de Mineração, que pretendia divulgar o material elaborado pelos pesquisadores de forma equilibrada, dando voz a todas as partes envolvidas, optando por intimidá-lo por meio de notificação extrajudicial com a ameaça de medidas legais caso a nota técnica do LIQUIT fosse divulgada. Vale destacar que o Observatório da Mineração não mantém qualquer vínculo financeiro ou de outra natureza com os grupos de pesquisa mencionados. Vemos essas tentativas de censura e intimidação com grande preocupação. Neste sentido, expressamos nossa indignação por tais práticas eticamente inaceitáveis, cujo objetivo é silenciar trabalhos acadêmicos críticos”.
Assinam a manifestação de repúdio, além da ABA, mais de 20 instituições científicas, incluindo a Associação Nacional dos Programas de Pós-graduação em Comunicação (Compós), Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP), Associação Brasileira de Relações Internacionais (ABRI), Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB), Associação Nacional de História (ANPUH), Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), Federação Brasileira das Associações Científicas e Acadêmicas de Comunicação (Socicom), entre outras.
O jornal Brasil de Fato publicou na semana passada uma matéria sobre o caso da Sigma .
“A Sigma não sabe lidar com narrativas de moradores, quilombolas, indígenas, que são afetados pela inflação, pela poluição sonora e do ar, pelo consumo de água, pelos rejeitos, pelo aumento da violência e uma série de outras consequências já identificadas exaustivamente não apenas por nós, do Observatório da Mineração, mas também por diversos outros atores”, explicou o diretor do Observatório, Maurício Angelo, ao jornal.
“A empresa poderia tentar responder aos questionamentos dos pesquisadores, tentar responder tecnicamente aos questionamentos, que são muito bem detalhados. É uma nota técnica de quase 40 páginas. Mas ela não quis. Ela optou por intimidar, ameaçar com processo e tentar censurar previamente”, afirmou.
A Sigma não respondeu ao pedido de comentário feito pelo Brasil de Fato sobre a notificação extrajudicial.
Imagem: Divulgação Sigma Lithium
Fonte
O post “Abraji, ABA e associações de pesquisa repudiam perseguição da Sigma Lithium ao Observatório da Mineração” foi publicado em 19/05/2025 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte Observatório da Mineração