Em pleno Dia Internacional da Mulher, as primeiras coisas que vi na internet foram tão absurdas que pareciam piada.
Primeiro, a Folha de SP noticiou numa manchete que o prefeito de Natal, um tal de Álvaro Dias (pensei que os políticos com esse nome fossem do Paraná), do PSDB, estava afrouxando as regras para conter a covid. No entanto, sabe-se lá porquê, o jornal resolveu ilustrar a notícia com a foto de Fátima Bezerra (PT), que não é negacionista como o prefeito. E tem mais: Fátima é a única governadora do Brasil, o que já demonstra uma total falta de representatividade.
Segundo, a fabricante da armas de fogo Taurus anunciou o lançamento de — rufem os tambores — um revólver cor de rosa. Agora sim a violência contra as mulheres vai acabar!
E a terceira barbaridade é imbatível. O pior presidente de todos os tempos, um misógino-mor que ficou conhecido nacionalmente depois de ameaçar uma colega deputada dizendo-lhe “Você não merece ser estuprada”, vai se filiar ao PMB (Partido da Mulher Brasileira). Bolso concluiu que é mais fácil e barato comprar um partido que criar um (o Aliança entra na conta de sua inquestionável incompetência). Depois de acabar com o nanico PSL, agora será a vez de liquidar o mais nanico ainda PMB. Lógico que a primeira medida será trocar o nome do partido, porque esse negócio de mulher não tá com nada.
Mas não é sobre nada disso que eu queria falar. 8 de março é dia de luta, de celebrar conquistas, de fazer denúncias, de tentar conter retrocessos. Como estamos no meio de uma pandemia que, pelo jeito, ainda vai ceifar vidas e atrapalhar nossas lutas por bastante tempo, é fundamental pontuar que esta crise sem precedentes atingiu mais diretamente as mulheres. Não só daqui, mas de todo mundo.
Só na questão do trabalho, a pandemia representa o retrocesso de uma década na participação feminina na força de trabalho da América Latina. Segundo o relatório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), muitas mulheres tiveram que deixar o mercado do trabalho para cuidarem de seus lares. A participação das mulheres, que foi de 52% em 2019, caiu para 46%. O órgão estima que 118 milhões de latino-americanas estão em situação de miséria, 23 milhões a mais que no ano pré-pandemia.
E não apenas as mulheres são maioria entre os desempregados, mas também entre as pessoas que desistiram de buscar trabalho . A excelente revista Gênero e Número lembra como a pandemia “escancarou séculos de desigualdades, especialmente no mercado de trabalho”. Já no terceiro trimestre do ano passado, 51% das brasileiras estavam desempregadas e 64% estavam fora da força de trabalho.
Eu estava aqui escrevendo, mas tive que parar pra comemorar o Lula elegível ! Parece que acordei de um pesadelo e voltei a sonhar! Respira, respira…
Como explica este ótimo artigo da Inesc, as mulheres negras são as mais afetadas pelas consequências da pandemia no Brasil. Por isso foi um desastre quando o auxílio-emergencial, que só foi conquistado graças à pressão do povo, já que o governo era contra, foi interrompido. Agora ele vai voltar fraquinho.
Como são as mulheres que ocupam o setor do cuidado e postos de trabalho como hotelaria, serviços, guias de turismo, comércio, trabalho doméstico, são elas as mais afetadas pela pandemia e pelas medidas sanitárias para combatê-la. Uma pesquisa recente indicou que 50% das brasileiras passaram a cuidar de alguém neste período de distanciamento social (idosos, pessoas com necessidades pessoais, monitorar as crianças que não podem ir à escola).
E não se pode esquecer também que as mulheres não apenas estão trabalhando mais durante a pandemia (pois pode ter que ser mãe em tempo integral ao mesmo tempo que trabalha fora, ou em home office), mas também a violência doméstica aumentou.
É por tudo isso, pelos castigos maiores que a pandemia traz para as mulheres, que precisamos de políticas especiais que visem justamente a recuperação feminina. Quando as mulheres penam, a sociedade inteira sofre. Só com a diminuição da desigualdade podemos ter um mundo mais justo. Isso sempre foi óbvio, mas ficou mais óbvio agora com a pandemia.
E não é que esse dia tão importante acabou com uma boa notícia? Chega logo, 2022!
O post “A PANDEMIA CASTIGA AINDA MAIS AS MULHERES” foi publicado em 8th March 2021 e pode ser visto originalmente na fonte Escreva Lola Escreva