DO OC – A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (2/12) a conversão em lei da Medida Provisória 1.308/2025. A MP cria a LAE (Licença Ambiental Especial), uma espécie de licenciamento “expresso” justamente para as obras que demandariam análise mais demorada – grandes projetos de infraestrutura como hidrelétricas e estradas na Amazônia.
Presente de Luiz Inácio Lula da Silva ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), a MP buscou acelerar a implementação da LAE, jabuticaba ao licenciamento criada por Alcolumbre para acelerar a liberação da perfuração de petróleo da Foz do Amazonas, de interesse do senador. Em troca, o governo esperava manter os 63 vetos de Lula aos pontos mais críticos do PL 2.159, o PL da Devastação, que destruiria o licenciamento ambiental no Brasil.
O governo e o país perderam duas vezes: Alcolumbre traiu Lula ao pautar a derrubada dos vetos do PL da Devastação no Congresso num acesso de birra por ter perdido a indicação de Rodrigo Pacheco para o STF. E, nesta terça-feira, um constrangido Lindbergh Farias, líder do PT na Câmara, teve que defender a aprovação do relatório do bolsonarista Zé Vítor (PL-MG) para a MP da Devastação. A união entre o governo e a extrema-direita em torno do projeto foi notada (e ironizada) por parlamentares da oposição.
Com a MP aprovada, completa-se o trio de medidas que tornam o licenciamento ambiental letra morta no país. A derrubada dos vetos de Lula ao PL da Devastação já havia estendido a LAC (Licença por Adesão e Compromisso, ou autolicenciamento) a empreendimentos de pequeno e médio porte – que representam mais de 90% do total dos licenciamentos estaduais e municipais; a mesma lei também havia concedido isenções em série de licenciamento, que vão da atividade rural à pavimentação de estradas na Amazônia; e, agora, a Licença Ambiental Especial completa o quadro com a LAE, que já vale para grandes hidrelétricas e agora passa a valer para qualquer obra considerada “estratégica” por decreto.
“Estamos votando o PL da Devastação parcelado em duas vezes”, disse a deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG). A federação PSOL-Rede e o PSB foram os únicos partidos a orientar votação contrária ao texto de Zé Vítor na Câmara.
Apesar de ter rejeitado a maioria das 833 emendas ao texto propostas por deputados e senadores (que reconstituíam o PL da Devastação original e que perderam sentido depois que os vetos de Lula foram derrubados), o parecer do relator piora a MP.
Uma das novidades do parecer é o aumento das dispensas de licenciamento que já existiam no PL. Dragagem de hidrovias e até mesmo em rios poderão pular a licença ambiental. Antenas de telecomunicação que não causem “significativo impacto” (que o parecer não define o que seja) também entram no rol das isenções.
A versão mais recente do parecer, apresentada nesta terça-feira, tem um artigo sob encomenda para liberar por LAE a pavimentação da BR-319 (Porto Velho-Manaus), cuja licença prévia foi concedida ilegalmente pelo Ibama no governo Bolsonaro e hoje encontra-se suspensa na Justiça. É consenso entre os estudiosos da área que o asfaltamento da 319 inviabilizará o controle do desmatamento – as emissões projetadas nos próximos 25 anos são de 8 bilhões de toneladas de gás carbônico equivalente , quatro vezes mais do que a emissão bruta anual do Brasil inteiro.
O texto do deputado propõe, sem citar o nome da estrada, que “são consideradas estratégicas as obras de reconstrução e repavimentação de rodovias preexistentes cujos trechos representem conexões estratégicas, relevantes na perspectiva da segurança nacional, do acesso a direitos sociais fundamentais e da integração entre unidades federativas”. E que, quando a autoridade licenciadora já tiver se manifestado pela viabilidade ambiental da obra, os estudos para sua instalação devem ser apresentados em no máximo 90 dias. O PSOL tentou apresentar um destaque à votação para excluir a BR-319 do texto, mas foi derrotado.
Nenhum dispositivo é tão exótico, porém, quanto um dos artigos do parecer que regula a Licença por Adesão e Compromisso – que não faz parte da MP da LAE e sim do PL original. Nele o relator, deputado por Minas Gerais, define que algumas atividades de mineração poderão ser autolicenciadas: a extração de areia, cascalho, brita e garimpo de diamantes.
“Deixa o garimpeiro trabalhar!”, clamou o deputado bolsonarista Delegado Caveira, do PL do Pará, num dos discursos mais “inspirados” da noite. Durante toda a votação, parlamentares favoráveis ao fim do licenciamento – alguns, como Kim Kataguiri (União-SP), igualmente temerosos da opinião pública e fazendo questão de dizer que o PL da Devastação “não é o PL da devastação” – capricharam na retórica e nas fake news: um acusou Marina Silva de queimar o Pantanal, outro disse que Lula “concordou com 85%” do PL do licenciamento, já que vetou apenas parte dele; outro, ainda, papagaiando o trumpismo ao mentir que acordos internacionais como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que garante a indígenas a consulta prévia e informada em relação a empreendimentos que os afetem – e que o texto de Zé Vítor tentou flexibilizar –, são imposições “de europeus” que não os adotam (seis dos 23 países que ratificaram a 169 são europeus).
“Em etapas, o Congresso vai condenando o país a ter uma legislação sobre licenciamento frouxa que insitucionaliza o descontrole ambiental. É lamentável assistir às sessões de votação dos vetos ao PL da Devastação e da MP da Licença Ambiental Especial, em que os parlamentares expõem suas facetas e o enorme desserviço que prestam à sociedade. Esses votos tenebrosos contra a segurança, a saúde e o meio ambiente como um todo precisam ser respondidos pela população nas urnas no próximo ano”, diz Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima.
A MP da Devastação deve ser votada nesta quarta-feira no plenário do Senado, oficializando o fim do licenciamento ambiental no Brasil.
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O post “Governo e bolsonaristas se unem por MP da Devastação” foi publicado em 03/12/2025 e pode ser visto originalmente na fonte Observatório do Clima
