Adulto na sala
Lula fez valer seu prestígio como uma das maiores lideranças democráticas da atualidade. Após bater ponto na abertura da COP e no encerramento da Cúpula dos Povos, voltou a Belém, hoje, para um dia inteiro de conversas privadas com ministros dos países presentes na conferência e representantes da sociedade civil. Com isso, tenta destravar a adoção de um mapa do caminho que dê fim gradual ao uso de combustíveis fósseis. A presença de um presidente em negociações de uma COP não chega a ser inédita, mas é rara, e por isso mesmo dotada de força política e simbólica. “É preciso que a gente diminua a emissão de gases de efeito estufa. E se o combustível fóssil é uma coisa que emite muitos gases, nós precisamos começar a pensar como viver sem combustível fóssil”, disse Lula, para em seguida evocar uma espécie de lugar de fala. “Falo isso muito à vontade, porque sou de um país que tem petróleo. Sou de um país que extrai 5 milhões de barris de petróleo por dia.” Explicou que “não pretende impor nada a ninguém” e nem “determinar prazos”, talvez para não melindrar alguns países. “Queremos apenas dizer: é possível. E se é possível, vamos tentar construir juntos.”
“Provocação”
Em seu discurso, Lula falou que “o clima não é mais apenas uma visão acadêmica, não é mais uma visão de meia dúzia de intelectuais, não é mais uma visão de meia dúzia de ambientalistas.” Capaz da fala ter agradado os cientistas climáticos que organizam o Pavilhão de Ciências Planetárias na COP30. Horas antes, eles haviam divulgado um novo manifesto, chamando de “provocação” as propostas sobre fósseis e desmatamento apresentadas pela presidência da conferência ontem (18/11), no primeiro rascunho da Decisão Mutirão. “Os delegados parecem não entender o que é um roteiro. Um roteiro não é um workshop ou uma reunião ministerial. É um plano de trabalho real, que precisa nos mostrar o caminho, de onde estamos, para onde precisamos chegar, e como chegar lá”, afirmou Johan Rockström, do Potsdam Institute for Climate Impact Research.
Show me the money
Lula falou também de financiamento, outra pauta sensível a qualquer COP. “Nós precisamos convencer as pessoas de que os bancos multilaterais que cobram uma exorbitância de juros dos países africanos e dos países pobres da América Latina precisam transformar parte dessa dívida em investimento, para que a gente possa fazer com que a questão da transição energética seja verdadeira. As empresas petroleiras têm que pagar uma parte disso. As mineradoras têm que pagar uma parte disso. As pessoas que ganham muito dinheiro têm que pagar uma parte disso. Porque senão, quem vai sofrer é a parte mais pobre do planeta Terra.” A fala passa um recado aos delegados encarregados de negociar, dentro da Meta Global de Adaptação (GGA), as políticas que viabilizem a adaptação dos países mais pobres aos efeitos das mudanças do clima. Por ora, a negociação segue atravancada. O grupo de negociadores africanos (AGN) pede mais dois anos para chegar a um consenso sobre o número de indicadores que devem ser adotados como critério para o financiamento, sob o argumento de que não faz sentido estipular uma lista sem que antes haja uma definição sobre o valor disponível. “Seria um pouco como colocar um telhado numa casa sem que haja dinheiro para o resto da obra”, disse Pooja Dave, que tem acompanhado as negociações pela Climate Action Network. Já os países europeus relutam em falar de dinheiro no GGA, sob o argumento de que o tema deveria ser definido em outros espaços com mandato para discutir o assunto.
União Europeia ganha fóssil do dia
“Gosta de se imaginar como um verdadeiro líder climático, mas revelou-se um bloqueador de negociações profissional”. Assim a Climate Action Network descreveu a União Europeia, agraciada com o antiprêmio Fóssil do Dia, concedido aos países que mais atrapalham as negociações na COP. A CAN descreveu alguns dos itens do “menu completo” de bloqueio oferecido pela UE, começando pela trava ao financiamento público para a ação climática nos países em desenvolvimento. A rede citou ainda os esforços do bloco para que o artigo 9.1 do Acordo de Paris, que trata justamente da obrigação dos países ricos com financiamento, permaneça “o mais vago possível” e sua negativa em apoiar (com dinheiro) ações de adaptação nos países pobres. A Arábia Saudita ganhou a “menção desonrosa” do dia, por seus esforços para minar a ação climática global durante a semana – incluindo a rejeição à declaração da Corte Internacional de Justiça sobre a obrigação legal dos países com a ação climática.
Tempo de amor
No ano que vem teremos a primeira Copa do Mundo organizada por três países. E, de quebra, uma COP organizada por dois. Numa decisão no mínimo exótica, Turquia e Austrália concordaram em repartir a conferência, com a Turquia entrando com a sede e a Austrália, com a presidência. A decisão ainda precisa ser referendada pelo grupo dos Estados da Europa Ocidental e Outros, da qual os dois países fazem parte.
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O post “Belenenses: notas sobre a COP30 (dia 10)” foi publicado em 19/11/2025 e pode ser visto originalmente na fonte Observatório do Clima
