A Associação Ambiental e Cultural Zeladoria do Planeta , organização social que representa a sociedade civil no Conselho Estadual de Meio Ambiente (Copam) de Minas Gerais, com assento em oito colegiados do órgão consultivo e direito a voto no Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), pagou R$ 8 mil para a criação de um estudo que resultou na redução da área APA (Área de Proteção Ambiental) Chapada do Lagoão, no Vale do Jequitinhonha.
O diretor da ONG, Fernando Benício de Oliveira Paula, assim como a sua esposa, Neide Nazaré de Souza, são citados na Operação Rejeito, deflagrada pela Polícia Federal semana passada em MG, ação que revelou o maior esquema de corrupção envolvendo o setor mineral no estado envolvendo o alto escalão da ANM , a própria PF, ex-deputados e dezenas de empresas.
O projeto sancionado pela Prefeitura de Araçuaí em 27 de maio deste ano teve como base um relatório técnico executado pela Arcos Verdes Engenharia Consultoria Ambiental .
Um dos representantes da consultoria também confirmou a contratação em audiência pública que discutia o projeto do executivo municipal na Câmara de Vereadores de Araçuaí.
O relatório serviu como base para o projeto de lei que reduziu a área da APA de 24,8 mil hectares para 10,7 mil hectares, apesar das críticas de ambientalistas, movimentos sociais e de uma ação do Ministério Público de Minas (MPMG).
O MPMG conseguiu uma decisão favorável contra o projeto de lei em abril, mas na 2ª instância da Justiça mineira a suspensão da tramitação do projeto foi anulada em decisões após recurso apresentado pela Prefeitura de Araçuaí.

Como mostrou o Observatório da Mineração em março deste ano , em uma série de reportagens sobre o interesse de mineradoras na região da APA, a medida atende aos interesses das empresas, incluindo o grupo americano Atlas, que recebeu prioridade do governo mineiro antes mesmo da criação da filial da empresa no estado .
Em 28 de agosto deste ano, atendendo uma ação da Federação das Comunidades Quilombolas do Estado de Minas Gerais (N’golo), a Justiça Federal suspendeu o licenciamento ambiental da expansão do projeto da Atlas por não ter sido realizada a consulta prévia dos quilombolas, fato também apontado nas reportagens do Observatório da Mineração . A empresa recorreu da decisão, mas a suspensão foi mantida pelo TRF 6 em decisão do dia 8 deste mês.
O Ministério Público Federal (MPF) também recomendou (leia a íntegra ) que a Agência Nacional de Mineração (ANM) suspenda e revise as autorizações de pesquisa e extração de lítio em Araçuaí (MG) e cidades vizinhas.
Segundo o MPF, existiam cerca de 6.275 processos em distintas fases para exploração de minérios na região e o inquérito civil que investigou o caso também apurou que a consulta prévia, livre, informada e de boa-fé de comunidades indígenas, quilombolas e tradicionais não foram realizadas antes da liberação dos projetos pela ANM. A recomendação é resultado de um inquérito civil que apura o desrespeito aos direitos étnico-raciais e territoriais dessas populações diante do avanço da mineração na região.
A aproximação da Zeladoria do Planeta com as mineradoras interessadas na extração de lítio no Vale do Jequitinhonha, no entanto, já era pública antes mesmo da Operação da PF e CGU. Em novembro de 2023, a Sigma Lithium recebeu o Prêmio Gestão Ambiental, ação Zeladoria do Planeta , “reconhecendo sua atuação em meio ambiente e sustentabilidade”.

Ao contrário do reconhecimento da entidade, pesquisadores, como mostrou o Observatório da Mineração em maio deste ano , apontam que o empreendimento da mineradora canadense em Araçuaí, mesma cidade inserida na polêmica redução da APA patrocinada pela ONG, e Itinga, tem uma lista de problemas como violações graves de direitos humanos, irregularidades no licenciamento ambiental, deficiências nos estudos de impacto ambiental e a utilização de tecnologias ultrapassadas que provocam um dano socioambiental 30 vezes maior do que outras tecnologias existentes.
Zeladoria também atuou a favor de mineradora na Serra do Curral, aponta investigação
As ações da Zeladoria do Planeta são citadas na Operação Rejeito especialmente no despacho que autorizou a deflagração da fase ostensiva da investigação da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU).
Parte da decisão (veja a íntegra do trecho abaixo) trata do favorecimento da Fleurs Global Mineração Ltda no esquema bilionário de corrupção com a liberação de áreas que deveriam ser protegidas por questões ambientais e de patrimônio cultural tombados, envolvendo a longa teia de interesses minerários na Serra do Curral, em BH, a Zeladoria do Planeta é citada como beneficiária de R$ 5 mil.

Fernando Benício de Oliveira Paula, diretor da entidade e Neide Nazaré de Souza, que seria sua esposa, segundo o documento, receberam o valor após encontros com outros alvos da investigação para aprovar os pleitos da empresa em uma das reuniões da Câmara de Atividades Minerárias (CMI). Neide Nazaré também tinha assento junto com Fernando Benício, como titular e suplente em colegiados do Copam.
“Senhor presidente, no cumprimento de nossas obrigações estatutárias na defesa do meio ambiente, estivemos presentes ao empreendimento realizando visita técnica para verificar, principalmente, se o empreendimento afetaria o mosaico natural da Serra do Curral, que é o que se entende do pico Belo Horizonte, patrimônio do povo de Minas Gerais. Observadas todas essas instâncias, da distância, dos impactos, nós consideramos também tecnicamente que o empreendimento está apto para operar“, afirma Fernando Benício na sua primeira intervenção sobre o processo da Fleurs na reunião citada pela investigação que acabou sendo aprovado no Conselho.
ONG afirma que não é alvo da operação e que desconhece citação de beneficiária de R$ 5 mil
Em nota enviada ao Observatório da Mineração, a Zeladoria do Planeta nega que seja alvo da Operação Rejeito, apesar da decisão judicial que bloqueou os bens de Fernando Benício e determinou o seu afastamento das suas funções no Copam.
Além disso, a entidade também nega que Neide Nazaré de Souza seja investigada ou envolvida, apesar da citação do seu nome no despacho judicial.
“A título de esclarecimento, desde que as notícias começaram a circular na mídia, a Associação Ambiental e Cultural Zeladoria do Planeta não tem ciência sobre nenhuma investigação em que seja objeto. Todavia, está sempre à disposição para colaborar com as investigações. No que se refere aos conselhos ocupados, as informações se encontram nos canais públicos oficiais de informação, bem como as reuniões do COPAM que são gravadas e disponibilizadas no canal do SISEMA no YouTube. Em relação à Senhora Neide Nazaré de Souza, não há ciência de que esteja sendo investigada ou envolvida na referida operação. A Zeladoria do Planeta se coloca à disposição para demais esclarecimentos“, afirma em nota Gustavo Bleme, presidente em exercício da Zeladoria do Planeta.
Em comunicado no seu site, a ONG informa que desde que a investigação foi deflagrada, Fernando Benício se afastou “voluntariamente de todas as suas atividades na instituição em 17 de setembro de 2025, como medida preventiva de governança e em respeito aos princípios da transparência e da responsabilidade socioambiental que orientam nossas ações”.
A reportagem também fez contatos e pediu posicionamentos para a Secretaria Estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais (Semad), pasta que coordena as atividades do Copam, para a Arcos Verdes, empresa que fez o estudo técnico que propôs a redução da APA, além das empresas Atlas Lithium e Sigma Lithium, e a Prefeitura de Araçuaí.
Até o fechamento desta reportagem, os citados ainda não tinham retornado o pedido de posicionamento. O espaço continua aberto para suas declarações.
O post ONG citada na Operação Rejeito pagou estudo que reduziu mais de 50% de APA no Jequitinhonha, favorecendo mineradoras de lítio apareceu primeiro em Observatório da Mineração .
Fonte
O post “ONG citada na Operação Rejeito pagou estudo que reduziu mais de 50% de APA no Jequitinhonha, favorecendo mineradoras de lítio” foi publicado em 26/09/2025 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte Observatório da Mineração