A diretora executiva da COP30, Ana Toni, conversou com o OC na noite desta quinta-feira (26/6), pouco antes da plenária final que chancelou o resultado da Conferência de Bonn, na Alemanha. Parecia aliviada. Preparatória para a COP30, a reunião técnica teve participação de representantes de quase 200 países sob forte calor e risco de impasse na primeira semana. Apesar de ter a dimensão do desafio que precisará enfrentar até novembro para conseguir algum avanço em um contexto geopolítico cada vez mais próximo da distopia, a economista afirma que “as coisas andaram” e acredita que os objetivos até agora foram alcançados. Veja abaixo os principais trechos da entrevista:
BALANÇO DE BONN
“Foram duas semanas muito agitadas. A nossa percepção é que, apesar de o começo da reunião ter sido muito duro, já que demorou muito para aprovar a agenda, no final da semana as coisas andaram, as negociações andaram. Estamos aprovando a maioria dos textos, logicamente com colchetes, com opções, mas são textos que agora a gente tem, e antes não tinha nem os textos para negociação. Então está andando, andou bastante, acho que até a atmosfera aqui está mais leve, os negociadores realmente trabalhando muito, adiantaram muito o trabalho deles. Foram duas semanas muito importantes, primeiro para acelerar as negociações e deixar mais claro quais serão os nossos grandes desafios. Segundo, para a presidência da COP30, foi um momento muito importante, a gente sentou com todas as delegações para ouvir também as expectativas para a COP30, o que cada um deles espera. Tivemos a oportunidade de esclarecer também muitas coisas, debater o famoso relatório sobre financiamento. Então, assim, o balanço geral é que foram duas semanas muito produtivas. Entregaram textos que a gente precisava para essa etapa da trajetória até Belém.”
DECISÃO DE CAPA
“O Brasil sempre teve um posicionamento de que não quer falar de decisão de capa porque a gente quer realmente olhar para as negociações, os temas que estão na negociação. Quando a gente fala de algum outro texto, todo mundo abandona os textos ou as salas de negociações e vai para o outro tema que se coloca na mesa. Esse não é um tema que está decidido pelas partes para ser negociado, e o compromisso do Brasil é a gente finalizar os textos que estão aí para negociação.”
CAUSA DO AQUECIMENTO
“A causa do aquecimento global – logicamente, 75% da causa das emissões são combustíveis fósseis – já foi tratada em Dubai, na COP 28, e temos o Balanço Global. Aqui vai ter um debate, já está tendo uma negociação do que fazer agora para o diálogo do Balanço Global. Então, não é mais uma questão do quê, é o como. E acho que o como é um é um pacote de decisões. Uma delas é, obviamente, na negociação. A gente tem que dar resposta de como vamos implementar o Balanço Global. Trouxemos isso como coração da nossa agenda de ação, a agenda de ação inteira da presidência da COP 30 é baseada na implementação do Balanço Global na área de energia, na área de florestas, oceano, agricultura, nas áreas sociais e obviamente na área de financiamento. Então a gente está totalmente imbuído, como presidência da COP, na implementação do Balanço Global, em que a transição para o fim dos combustíveis fósseis, de maneira ordenada, justa e equitativa, é um dos grandes temas.”
BALANÇO GLOBAL
“O tema de combustíveis fósseis foi uma decisão ampla do Balanço Global em Dubai, na COP28: 198 países já acordaram diversas coisas, entre elas o famoso parágrafo 28, que fala em triplicar energia renovável, duplicar eficiência energética e transitar para o fim dos combustíveis fósseis. Tem outros parágrafos que falam em reflorestamento, combate ao desmatamento, financiamento, adaptação. Então a gente pegou o Balanço Global como um grande arcabouço da nossa agenda de ação para andar em todos esses temas.E eu acho que a gente vai conseguir muita coisa nesse caminho até Belém.”
FINANCIAMENTO
“A questão de financiamento está presente desde a Convenção sobre Mudança do Clima. No Acordo de Paris e em todas as COPs houve grande debate sobre financiamento. Não será diferente na reunião de Belém, na COP30. Isso é bem-vindo porque o financiamento é parte dos meios de implementação e é um tema vital para a implementação. Temos que entregar um relatório da presidência da COP30 e da presidência da COP29 falando ou sugerindo como mobilizar 1,3 trilhão de dólares para os países em desenvolvimento. Tivemos aqui em Bonn duas sessões muitíssimo interessantes ouvindo as partes com sugestões muito concretas de como mobilizar esse recurso também com sociedade civil, bancos também fizeram sugestões, recebemos 116 propostas, já ajudando muito as duas presidências com ideias de como mobilizar todo esse recurso. Vamos abrir mais, provavelmente com mais um momento de submissões e escuta, e esses insumos ajudarão a presidência da COP30, junto com a presidência da COP29, a fazer um relatório, o chamado roadmap Baku-Belém para US$ 1,3 trilhão, e trazer para as partes. Obviamente, depende de todas as partes o que fazer com esse relatório e como dar concretude à implementação ou não deste relatório ou de partes dele. Mas o que é muito importante é que, sim, debater financiamento é uma parte vital da COP30 e isso é bem-vindo. Foi assim em todas as COPs e acho que estamos chegando num momento em que falamos dessa mobilização de maneira concreta, com instrumentos econômicos específicos, reforma dos bancos multilaterais, novas fontes de recurso, mudanças estruturais, dívida, então serão diversos temas a serem debatidos e isso mostra que está todo mundo virando a página de negociação para implementação, e isso é muito bom.”
INFRA EM BELÉM
“A gente chegou aqui em Bonn com diversos questionamentos sobre Belém. Havia muitas dúvidas sobre segurança, transporte, saúde, se Belém tem essa capacidade ou não, pouca gente sabia o tamanho de Belém, pouca gente sabia o que já foi feito, e tinha, lógico, o problema ou as dúvidas sobre acomodação. Conversamos com todo mundo, com todas as delegações, mas agora o debate não é Belém, não é sobre a capacidade de Belém para receber todo mundo, mas sim um problema específico dos custos de acomodação. Esse tema, como você falou, estava muito aqui nos corredores, todo mundo muito preocupado com os custos e acho que o governo brasileiro foi o primeiro a falar que está também preocupado, tem tomado ações. O governo federal, junto com o governo estadual e o município, tem debatido com os donos dos hotéis, com a Embratur, com os proprietários de casas, com diversas plataformas, e acho que o nosso empenho é logicamente para que todos sejam muito bem-vindos a Belém e a custos razoáveis. Custos razoáveis é o que todo mundo quer para a COP. O secretário Valter [Correia] veio aqui e prometeu que a gente vai colocar essa essas informações na plataforma de acomodação no fim deste mês ou começo do próximo mês, e esse é o comprometimento do governo brasileiro. Vamos cumprir. Saímos de um debate de dúvidas sobre Belém muito amplo para uma dúvida específica agora, que é o preço de acomodação. Então acho que sanamos a maioria dos questionamentos.”
OBJETIVOS
“A gente sai feliz daqui de Bonn, tendo atingido os objetivos. Lançamos a nossa agenda de ação, tivemos um excelente retorno de muitos, também teve a London Climate Action Week, a semana do clima de Londres, em que tivemos muitos feedbacks assim, um retorno positivo sobre a agenda de ação. A gente não queria novos temas na agenda, isso também foi conseguido. E agora, com a ajuda de todos, estamos vendo a aceleração dos textos, como eu falei, em colchetes, com opções, mas eles estão acontecendo e isso também é bem-vindo. Então eu acho que a gente sai cansado, mas satisfeito aqui de Bonn. Foram duas excelentes semanas.”
FÓSSEIS
“A questão dos fósseis está dada. Está todo mundo debatendo isso. Não tem bala de prata para resolver o problema. É um tema que empresas estão debatendo, governos e países produtores. Têm que entrar os consumidores, países consumidores, têm que entrar as energias alternativas, tem o tema da segurança energética. Isso é um debate muitíssimo importante e nossa obrigação é aprofundar esse debate e não polarizar. Temos que aprofundar e caminhar para a frente, ver quais são as alternativas, ver como é que a gente soluciona, porque esse é um problema de todos, não é um problema de um só, não é só dos produtores, é também dos consumidores, é de quem sente a consequência da mudança do clima. Então, a gente tem que encontrar soluções e eu sinto aqui que tem uma vontade de pensar em soluções. E isso é muito importante para a COP 30, não só colocar quais são os problemas, mas principalmente focar em soluções.”
O post “As coisas andaram”, diz CEO da COP30 sobre Bonn apareceu primeiro em OC | Observatório do Clima .
O post ““As coisas andaram”, diz CEO da COP30 sobre Bonn” foi publicado em 27/06/2025 e pode ser visto originalmente na fonte OC | Observatório do Clima