NOTA DO OBSERVATÓRIO DO CLIMA
A carta enviada à comunidade internacional nesta segunda-feira (10/3) pelo presidente da COP30, André Corrêa do Lago, traz um alívio e uma preocupação. O alívio é saber que as negociações do Acordo de Paris agora estão na mão de profissionais que entendem o tamanho do buraco em que a humanidade está metida na conjunção infeliz da aceleração da emergência climática com o maior retrocesso geopolítico global em 36 anos. A preocupação é ver que a única solução real para a crise do clima – a eliminação gradual, justa e equitativa dos combustíveis fósseis – ainda não consta na lista de prioridades da conferência de Belém.
O documento de 11 páginas traz a visão da presidência brasileira sobre o processo da COP30 e faz um chamado a todos os países pelo trabalho conjunto (“mutirão”, cuja origem tupi potyrõ é lembrada pelo embaixador) contra a mudança climática. Deixa claro que o Brasil enxerga a COP30 como uma conferência diferente das outras: a primeira da fase “pós-legislativa” do acordo do clima, cujo livro de regras foi finalizado no ano passado em Baku com a definição sobre os mercados de carbono. Promete “estimular uma reflexão coletiva” sobre as NDCs, as insuficientes metas climáticas nacionais que precisam ser entregues neste ano, mas que não têm espaço formal de discussão na COP. E lista os itens de negociação que precisarão ter resultados ou avanços importantes em Belém, como transição justa, adaptação, mitigação e financiamento.
A carta tem momentos inspiradores. De vários pontos que merecem ser lidos com especial atenção, destacamos dois: o reconhecimento de que Belém acontece num momento em que a crise climática “chegou à nossa porta” e precisa ser tratada como a emergência que é; e o chamado ao multilateralismo, no momento em que este enfrenta sua pior crise desde pelo menos o fim da Guerra Fria, em 1989. Numa indireta à política externa da lei do mais forte implementada por Donald Trump, Corrêa do Lago afirma que “ao entendermos que somos todos interdependentes na luta contra a mudança climática, precisamos reconhecer que a comunidade internacional só pode ser tão forte quanto seu elo mais fraco”.
O corolário dessa dupla linha de raciocínio deveria ser um apelo forte e inequívoco à implementação da determinação da COP28, de Dubai, de iniciar a eliminação gradual dos combustíveis fósseis, de longe os principais causadores da crise do clima, que “chegou à nossa vida cotidiana” e impacta desproporcionalmente os “elos mais fracos” da comunidade internacional. Isso, porém, não consta no comunicado da presidência da COP30. A única menção a combustíveis fósseis no texto é factual, ao lembrar o resultado de Dubai.
“Para que os combustíveis fósseis entrem na pauta da conferência será necessário um amplo processo de pressão e união sobre o tema. Apesar do cenário internacional adverso, a liderança do Brasil na COP 30 abre essa oportunidade”, afirma Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima. “A carta da presidência diz que a COP30 pode iniciar uma inflexão na luta contra a crise climática e que podemos ganhar de virada. Para virar esse jogo, o Brasil terá que jogar no ataque.”
Sobre o Observatório do Clima – Fundado em 2002, é a principal rede da sociedade civil brasileira sobre a agenda climática, com 133 integrantes, entre ONGs ambientalistas, institutos de pesquisa e movimentos sociais. Seu objetivo é ajudar a construir um Brasil descarbonizado, igualitário, próspero e sustentável, na luta contra a crise climática (oc.eco.br ). Desde 2013 o OC publica o SEEG, a estimativa anual das emissões de gases de efeito estufa do Brasil (seeg.eco.br ).
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