Passados quase três meses do início do aparecimento das manchas de óleo na costa brasileira, o governo convocou especialistas em diversas áreas para reunir conhecimento e ferramentas visando o enfrentamento da crise. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) sediou os encontros do grupo que trabalha com as questões mais prementes sobre o assunto: o de Monitoramento, Modelagem e Sensoriamento Remoto, capaz de responder perguntas como qual a origem do óleo e extensão do impacto das manchas.
Cerca de 40 especialistas em imagens de satélite, movimentação oceânica, dispersão e caracterização química do óleo de cerca de 20 instituições de pesquisa, universidades e iniciativa privada de todo o país estiveram reunidos por três dias, entre segunda (18) e quarta-feira (20), na sede do INPE, para tentar traçar, pela primeira vez de forma unificada, a rota das manchas de óleo que avançam a partir do litoral nordestino.
Paulo Nobre, pesquisador do INPE responsável pelo Grupo de Trabalho, explicou que, cruzadas as informações e expertises, será possível afunilar as possibilidades sobre a causa do desastre ambiental, saber se ainda há óleo para chegar nas praias e onde ocorreriam esses novos aportes de óleo.
Os trabalhados iniciados no INPE por este grupo têm como objetivo abastecer com informações científicas o Comitê de Crise do Governo Federal, que direciona as ações contra o problema. Segundo Nobre, outros seis Grupos de Trabalho, de temas como biologia e biodiversidade, foram convocados na última semana pelo Ministério da Defesa como mesmo intuito. De acordo com o pesquisador do INPE, as informações geradas nos grupos serão imediatamente passadas para o Comitê de Crise, que será o responsável pela divulgação das descobertas e novos dados gerados.
“Acredito que em poucos dias ou semanas nós vamos testar hipóteses internamente, até que cheguemos uma conclusão substantiva que possamos divulgar [sobre origem do óleo e novos aportes]. Infelizmente esse é um trabalho que nós não conseguimos precisar quanto tempo vamos gastar, mas as equipes estão trabalhando em alerta integral, dedicados em esquema continuo”, disse Paulo Nobre.
Sistema de monitoramento 24×7
Do encontro desta semana, foi gerado um relatório com uma lista de ações que a comunidade científica é capaz de executar com os recursos e conhecimentos já existentes e o que é preciso fazer para ampliar a capacidade de resposta do Governo brasileiro a desastres por derramamento de óleo.
Além da unificação da base de dados brasileira em modelagem reversa para tentar identificar a origem do derramamento, os pesquisadores já podem orientar o governo nas ações de prevenção à chegada de novas manchas. “Esse Grupo de Trabalho existe para assessorar o Comitê de Crise sobre onde mandar um navio, onde despachar um helicóptero, um avião, onde requerer imagens de satélite, para direcionar ações de prevenção”, explicou Nobre.
No entanto, o GT reunido no INPE salientou a necessidade da criação de um sistema nacional unificado de dados sobre alertas de derramamento de óleo em águas nacionais, a exemplo do que já existe em relação ao desmatamento, a inundações e deslizamentos, por exemplo.
“Existe um cabedal de conhecimento muito interessante, concreto, presente, nós precisamos ter agora essa questão da articulação e governança de todas essas informações para termos um sistema que monitora 8 mil km de costa, 24 horas por dia, sete dias por semana”, defende Paulo Nobre.
Investimento em recursos humanos
Durante encontro no INPE, os especialistas lançaram um alerta ao governo Bolsonaro, que estará presente no relatório a ser enviado ao Comitê de Crise: a erosão da capacidade de inteligência das instituições de pesquisa, causada pela falta de investimentos em recursos humanos.
“Não devemos nos iludir de que se não houver uma atenção dedicada ao elemento humano, a nossa capacidade de resposta será cada vez menor, como um corpo em enrijecimento. Nas ameaças do futuro, não estão somente novos derrames ou incêndios. […] Nós precisamos de novo satélite, de mais navios e boias, de super computador pra fazer tudo, mas precisamos mais do que isso, precisamos de pessoas com conhecimentos específicos para atuar, operar e melhorar o sistema”, disse Nobre.
Vale lembrar que o Ministério de Ciência e Tecnologia foi um dos mais afetados pelo corte orçamentário realizado pelo Governo Bolsonaro no início do ano e que o país enfrenta uma crise na manutenção do pagamento de bolsas de pesquisa, como Capes e CNPq.
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