A declaração presidencial da 4a Cúpula da Amazônia, publicada nesta terça-feira (8/8) em Belém, repete a sina de outras declarações multilaterais e nivela compromissos por baixo. Ao fazê-lo, num contexto de emergência climática, ela falha com a floresta e o planeta.
Os 113 parágrafos operativos da declaração são uma bonita carta de intenções, que tem o mérito de reavivar a esquecida OTCA (Organização para o Tratado de Cooperação da Amazônia) e reconhecer que o bioma está sob ameaça de atingir um ponto de não-retorno, mas que não oferece soluções práticas e um calendário de ações para evitá-lo.
Num ano que se encaminha para ser o mais quente da história, com eventos extremos se sucedendo numa velocidade que supera as piores previsões da ciência, o documento é uma chance desperdiçada dos países amazônicos de exercer liderança no clima.
Os líderes dos países amazônicos reunidos em Belém não conseguiram concordar com algo que deveria ser óbvio, a necessidade de zerar o desmatamento até 2030. A maior parte dos países da região já havia se comprometido com essa meta ao assinar a Declaração de Líderes de Glasgow em 2021, que fala em zerar e reverter a perda de florestas até 2030. Apesar de seus discursos em defesa da Mãe Terra, a Bolívia foi o país que mais trabalhou para que a menção ao desmatamento zero ficasse de fora do documento.
O Brasil, por sua vez, ajudou a enterrar qualquer menção a uma eliminação gradual de combustíveis fósseis. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem insistindo em abrir uma nova fronteira de exploração de petróleo na costa amazônica, contrariando todas as recomendações do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima e da Agência Internacional de Energia, segundo a qual a humanidade só conseguirá impedir que o aquecimento global ultrapasse 1,5oC se nenhum novo projeto de exploração de combustíveis fósseis for autorizado no mundo desde já.
Ao falhar em incorporar no documento a proposta colombiana de suspender a exploração de petróleo, gás e carvão mineral, os países amazônicos se juntam a vilões climáticos tradicionais, como Arábia Saudita, Rússia e EUA, e novos, como Reino Unido, e permitem a continuidade da farra do petróleo até que o mundo queime. O presidente colombiano, Gustavo Petro, ficou isolado entre seus pares ao fazer o único discurso na cúpula que reflete a realidade climática e a necessidade de agir.
Além de falhar com o planeta, a declaração presidencial também ignorou as contribuições dos Diálogos Amazônicos, a primeira etapa da cúpula de Belém dedicada a discussões da sociedade civil. O encontro começou sob promessas de participação social ímpar e teve três dias de plenárias e eventos de onde sairiam contribuições para o documento dos chefes de Estado. Além de não refletirem os debates feitos nos diálogos, os relatórios enviados à reunião presidencial não tiveram suas conclusões incorporadas à declaração.
“Esse é um acordo bastante inicial. Um primeiro passo, mas que ainda não oferece nenhuma resposta concreta ao mundo em que estamos vivendo. O planeta está derretendo, estamos batendo recordes de temperatura todos os dias. Não é possível que, num cenário como esse, oito países amazônicos não consigam colocar numa declaração, em letras garrafais, que o desmatamento precisa ser zero e que explorar petróleo no meio da floresta não é uma boa ideia. Em resumo, o documento pecou pela falta de contundência. Ele é uma lista de desejos, e os desejos são insuficientes”, afirma Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.
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Sobre o Observatório do Clima – Fundado em 2002, é a principal rede da sociedade civil brasileira sobre a agenda climática, com mais de 90 organizações integrantes, entre ONGs ambientalistas, institutos de pesquisa e movimentos sociais. Seu objetivo é ajudar a construir um Brasil descarbonizado, igualitário, próspero e sustentável, na luta contra a crise climática. Desde 2013 o OC publica o SEEG, a estimativa anual das emissões de gases de efeito estufa do Brasil.
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