Em mais uma decisão histórica para a proteção do clima e contra o desmonte ambiental promovido pelo regime Bolsonaro, o Supremo Tribunal Federal condenou o governo federal nesta quinta-feira (3/11) a reativar o Fundo Amazônia, parado desde 2019.
Por 10 votos a 1, a corte julgou procedente uma ação movida em junho de 2020 por quatro partidos políticos (Rede Sustentabilidade, PSB, PT e PSOL) que exigia a retomada imediata do fundo. A chamada ADO (Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão) 59 considera que o governo se omitiu de forma dolosa e inconstitucional ao deixar deliberadamente R$ 3,2 bilhões parados no fundo enquanto a floresta amazônica pegava fogo e sofria taxas recordes de desmatamento.
A decisão permitirá ao BNDES retomar já nos próximos meses a aplicação dos recursos do fundo em projetos de combate ao desmatamento tocados por Estados, municípios e por organizações da sociedade civil. Também permitirá ao Ibama pleitear novos recursos para fiscalização ambiental tão logo Jair Bolsonaro deixe a Presidência da República.
Relatada pela ministra Rosa Weber, atual presidente do Supremo, a ADO 59 integra o chamado “pacote verde” da corte, um conjunto de sete ações com a temática ambiental que foram pautadas para julgamento ao mesmo tempo, na esteira do Ato pela Terra de 9 de março, quando 50 mil pessoas se uniram em Brasília para protestar contra o desmonte socioambiental do governo Bolsonaro.
A decisão tomada nesta quinta-feira pela Suprema Corte tem um precedente poderoso: em 30 de junho, o pleno do STF já havia determinado ao governo que parasse de sabotar o Fundo Clima — que Bolsonaro também paralisou — ao julgar procedente por 10 votos a Kássio Nunes uma ação impetrada pelos mesmos quatro partidos na mesma data que a do Fundo Amazônia. O relator da ação, Luís Barroso, reconheceu em seu voto que a proteção do clima é um dever constitucional do Estado brasileiro, criando jurisprudência para o voto de Rosa Weber.
“ O Supremo Tribunal Federal dá mais um passo rumo à efetiva proteção do meio ambiente e do clima, a partir do reforço a uma política pública positiva e efetiva na área. O voto da Ministra Rosa, além de tecnicamente espetacular, ajuda a proteger o fundo de aves de rapina institucionais que ainda se alimentam de negacionismo para tomada de decisões”, afirmou Nauê Pinheiro de Azevedo, assessor jurídico do Observatório do Clima, que fez sustentação da ação no plenário do STF. O OC prestou assessoria técnica aos partidos na elaboração da ação e é, juntamente com o Instituto Alana e a Conectas Diretos Humanos, amicus curiae no processo.
Principal programa de pagamento por redução de emissões por desmatamento (REDD+) do planeta, o fundo foi criado em 2008 e vinha funcionando sem problemas até fevereiro de 2019. Naquele mês, o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, passou a atacar a governança do fundo, gerido pelo BNDES, visando a eliminar os projetos tocados por organizações da sociedade civil.
Os dois colegiados que geriam os recursos, o Cofa (Comitê Orientador do Fundo Amazônia) e o CFTA (Comitê Técnico do Fundo Amazônia) foram extintos em abril daquele ano e jamais recriados. Com isso, R$ 3,2 bilhões em recursos ficaram congelados no banco.
“O Fundo Amazônia é o maior fundo de proteção às florestas já implementado. A perda decorrente de sua paralisação por quatro anos é irrecuperável, mas a sua reativação é mais do que que urgente para que possamos retomar a agenda de proteção da floresta, combate ao desmatamento e desenvolvimento sustentável”, disse Tasso Azevedo, coordenador técnico do Observatório do Clima e um dos principais arquitetos do fundo durante a gestão de Marina Silva, em 2007.
“Quando criamos o Fundo Amazônia ele tinha alguns pilares. O primeiro era que o Cofa teria representatividade forte da sociedade civil, e assim foi feito. Outro eram os critérios do que poderia ser feito com o recurso; e o outro, claro, era o único compromisso que tínhamos — reduzir o desmatamento. O governo Bolsonaro torpedeou todas as premissas do Fundo Amazônia: tentou adulterar sua composição, tentou adulterar suas metas ao propor usar o dinheiro para indenizar proprietários de terra, e aumentou o desmatamento”, lembra Carlos Minc, que era ministro do Meio Ambiente quando o fundo foi lançado, em 2008. “É muito bom que a Justiça tenha determinado a recomposição dos comitês, mas esse é apenas um dos pilares. Não é suficiente, porque é preciso reduzir o desmatamento. Mas este governo está acabando, espero que o próximo retome os princípios originais.”
Sobre o Observatório do Clima – Fundado em 2002, é a principal rede da sociedade civil brasileira sobre a agenda climática, com 77 organizações integrantes, entre ONGs ambientalistas, institutos de pesquisa e movimentos sociais. Seu objetivo é ajudar a construir um Brasil descarbonizado, igualitário, próspero e sustentável, na luta contra a crise climática. Desde 2013 o OC publica o SEEG, a estimativa anual das emissões de gases de efeito estufa do Brasil.
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