Não estou no Instagram nem no Facebook, mas venho notando que, no Twitter, minha timeline muitas vezes não é composta pelas 189.500 pessoas que me seguem e nem das 13.400 que eu sigo. Tá cheio de gente estranha. Muitos têm reclamado da mesma coisa.
Pra entender melhor este fenômeno (uma decisão errada das plataformas), reproduzo este ótimo artigo publicado ontem na Folha pelo advogado Ronaldo Lemos, que também é diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.
Na semana passada houve muita gente furiosa com as mudanças que o Instagram está implementando . A rede social que surgiu com fotos está cada vez mais tornando-se uma plataforma para vídeos curtos e ficando cada vez mais parecida com o TikTok. Após protestos de influenciadores importantes (como as irmãs Kardashian) o Instagram voltou atrás em algumas das mudanças. No entanto, as reclamações só atrasam o processo. A mudança do Instagram (e do Facebook como um todo) é profunda e inevitável.
Mais do que isso, a reconfiguração das plataformas da empresa tem o potencial de produzir impactos enormes não só sobre a indústria de tecnologia, mas para a sociedade como um todo. Por isso é importante entender exatamente o que está acontecendo.
O Instagram e o Facebook estão gradativamente abrindo mão do chamado social graph. O termo em inglês diz respeito às pessoas que você se conecta, que decidem seguir você e que você segue. Em um mundo em que as instituições coletivas estão cada vez mais enfraquecidas, a sua rede social é o que existe mais próximo no mundo digital de uma comunidade. É a sua tribo no mundo online, as pessoas que você decidiu acompanhar a vida e que decidiram acompanhar a sua.
É dessa comunidade que o Facebook e o Instagram estão querendo se livrar. A ideia é que quando você entrar nessas plataformas, o conteúdo que aparece para você não venha mais das pessoas que você decidiu seguir.
O algoritmo vai buscar conteúdos produzidos no mundo todo, por pessoas que você não sabe quem é e que podem nem viver no mesmo país, e mostrar aquele conteúdo para você caso determine que é algo que pode te interessar.
Em vez de comunidades, as pessoas vão se conectar com uma massa amorfa e abstrata, com a qual não têm nenhuma conexão direta. Para quem produz conteúdo isso torna o jogo totalmente diferente. Você não vai falar mais para uma plateia que é sua. Cada conteúdo que postar vai competir por atenção com outros conteúdos postados no mundo inteiro. Sabe-se lá onde seu conteúdo irá chegar e, na maioria dos casos, chegue somente para desconhecidos ou não chegue a lugar nenhum. Em outras palavras, é você contra o mundo.
Atualmente cerca de 20% dos conteúdos que já são mostrados para os usuários no Facebook e Instagram não vêm mais do social graph, mas diretamente da decisão do algoritmo onisciente que fica pinçando o que acha que você vai gostar. A ideia é subir esse percentual. Qual o teto? 60%? 80%? Hoje ninguém sabe.
As consequências sociais disso são profundas. Se o ocidente já vive uma crise de individualismo exacerbado, essas mudanças (que estão sendo puxadas pelo TikTok) têm a capacidade de aprofundar a atomização das pessoas. Elas dinamitam o último bastião de coletividade ainda possível no universo digital. Nossa tribo será uma só: o algoritmo. Vai importar cada vez menos quem você segue. O algoritmo vai gerar um broadcast incessante e probabilístico, baseado na medição dos nossos estados mentais mais subjetivos. Nuvens de conteúdos globais vão viajar como aves migratórias parametrizadas.
Nas redes ditas sociais você estará sozinho, relacionando-se principalmente com fantasmas e ilusões plantadas na frente dos seus olhos por um software onisciente.
O post “AS PLATAFORMAS SOCIAIS QUE CONHECEMOS VÃO ACABAR” foi publicado em 1st August 2022 e pode ser visto originalmente na fonte Escreva Lola Escreva