Claudia Reis tem 47 anos, é mãe de três filhos, hoje viúva porque perdeu seu marido pra negligência criminosa desse governo, que não quis comprar vacinas. É Assistente Social Especialista em Trabalhos e Desafios Sociais com Famílias. Aos 20 anos ela foi estuprada, e teve a coragem de contar sua história no Twitter (aviso de gatilho):
Eu fui estuprada do lado de fora da estação de trem Jaraguá, em SP. Eu voltava de uma festa, acabei dormindo no trem e passei direto de minha estação Perus. Como não tinha acesso na época pra passar pro outro lado sem pagar e poder voltar, um cara se aproximou e disse que tinha jeito de entrar sem pagar. Fui, pois eu não tinha a grana da passagem.
Ao entrar no acesso o homem me puxou pelos cabelos, me furou com uma chave de fenda na costela e subiu em cima de mim. Me lambeu a cara toda, chupou e mordeu meus seios e tentou me penetrar de toda forma possível, sempre me furando e dizendo que se eu não facilitasse ia me matar. Nojo. Ódio. Repulsa. Medo. Revolta. A cada vez que ele introduzia seus dedos podres em minha vagina, e esfregava aquele pênis nojento em mim, eu ficava mais apavorada com a certeza que após o estupro eu morreria ali, naquele mato, sem ninguém saber, e só me achariam no dia seguinte. Eu só pensava em minha filha. O que seria dela se eu morresse?
Num ato de desespero, quando aquele ser nojento parou de lamber meu rosto, eu gritei. Gritei o mais alto que eu pude, chamando a atenção de outro homem que passava por perto e começou a perguntar quem era, o que tava acontecendo, e se aproximando de nós. O estuprador fugiu, eu fui “salva”. O cara veio em minha direção, ao se deparar comigo nua e toda ferida, eu implorei: “Me ajuda, fui estuprada!” Ele disse: “Sai daqui, vai arrumar confusão na pqp, tem uma delegacia do outro lado da rua, vai pra lá”.
Fui correndo, chorando, sangrando, dolorida e gritando desesperada. Entrei na delegacia e ao contar o que houve, foi uma sucessão de desrespeito. O primeiro policial perguntou: “Mas você foi estuprada mesmo, ou desistiu de namorar o cara?” O segundo falou: “Mas ele chegou a te penetrar, porque sua calça é apertada demais, aí não é estupro”. A pergunta do terceiro policial me fez sair correndo. Ele disse: “Mas e aí, ele te comeu ou não, porque tem muitos casos aqui e você não tá nem baleada, nem esfaqueada, não é prioridade só porque teve um encontro ruim”.
Passado algum tempo sem atendimento algum, já que fiquei apavorada de ir a uma outra delegacia ou hospital, me deparei grávida daquele monstro. Busquei assistência social do hospital, contei minha história e mostrei minhas marcas na pele. Fui ouvida por uma equipe multiprofissional composta por um psicólogo, um médico, um assistente social e um pedagogo. Que autorizaram o aborto legalizado. Parecia tudo bem, até o momento da internação para o processo de curetagem.
Enfermeiras(os) ficavam passando de hora em hora me ameaçando, dizendo que me matariam enquanto eu dormia, porque era assim que o feto se sentia. Colocaram o sangue ainda gelado na minha veia, o médico havia dito que a transfusão era pra ser feita com o sangue em temperatura ambiente. Vomitei assim que senti o sangue gelado na minha veia. O enfermeiro, que era gay, me tacou uma toalha na cara e disse: “Se limpa rápido. Tá pensando que aqui é casa da mãe Joana?”
Minha alimentação chegava cheia de água, qualquer coisa que me dessem pra comer tinha uma quantidade exagerada de água, eu não comia pois tinha medo de estar envenenada. Foi uma segunda tortura. Após a curetagem o médico deu um tapinha no meu rosto e disse: “Acorda, e vê se quando transar, use camisinha pra não engravidar, porque aqui ninguém cai mais no conto do estupro, você já é mãe e sabe muito bem como se proteger”.
Sou mais uma vítima desse país machista, com leis machistas e violência estrutural constante contra as mulheres. Se abortamos sofremos violência, se gestamos e doamos somos violentadas novamente. A violência contra nossos corpos jamais terá fim se a mentalidade continuar sendo Deus, pátria e família numa falsa equivalência que só afaga o ego dos falsos cristãos e cidadãos de bem.
Hoje como Assistente Social, oriento mulheres vítimas de violência obstétrica, física, sexual, psicológica, moral e qualquer outra forma de violência. Você mulher que sofre, você não está sozinha, pois quando uma mulher sofre, sofremos todas.
E com muita luta por direitos adquiridos porém violados, vamos em frente de braços erguidos contando com apoio de mulheres fortes. Essa sou eu, acreditando sempre que o amanhã pode ser melhor. Obrigada pela atenção de todas, sintam meu abraço, porque eu sinto o de vocês.
O post “A VIOLÊNCIA POR FAZER UM ABORTO DECORRENTE DE ESTUPRO” foi publicado em 26th julho 2022 e pode ser visto originalmente na fonte Escreva Lola Escreva