Hoje foi informado que dois irmãos pescadores teriam confessado o assassinato do jornalista inglês Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira, dizendo que desmembraram os corpos e os queimaram (mas um dos irmãos alegou que foi torturado pela polícia para assumir isso). Não sai da minha cabeça uma das frases hediondas de Bolso sobre o crime, “Fizeram alguma maldade com eles”.
Haverá várias medidas internacionais contra o governo brasileiro, já que Bolso só engana seus eleitores (aqueles que ainda não se arrependeram). No resto do Brasil e do mundo, sabe-se que o presidente miliciano fez de tudo para “passar a boiada”, acabando com a fiscalização e incentivando todo tipo de atividade ilegal contra a Amazônia e os indígenas. A primeira medida foi o aceite, em tempo recorde, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos para uma petição que diz que “o desaparecimento [de Dom e Bruno] seria enquadrado em um contexto de agravamento da violência contra os defensores dos direitos humanos, jornalistas e comunicadores sociais”.
Reproduzo aqui um ótimo texto de Leonardo Sakamoto publicado hoje no Uol.
Jair Bolsonaro tem razão ao afirmar que muita gente não gostava do jornalista inglês Dom Phillips, que denunciava em suas reportagens os crimes contra a Amazônia e seus povos. Contudo, o mesmo não pode ser dito sobre o próprio presidente, que é amado por quem comete crimes ambientais e sociais na região, como garimpeiros, madeireiros, pescadores e caçadores ilegais, além de grileiros de terra, exatamente por aquilo que deixou de fazer, ou seja, cumprir a lei.
“Esse inglês, ele era mal visto na região. Porque ele fazia muita matéria contra garimpeiro, a questão ambiental… Então, aquela região lá, que é bastante isolada, muita gente não gostava dele. Ele tinha que ter mais do que redobrado a atenção para consigo próprio. E resolveu fazer uma excursão”, afirmou Jair em uma entrevista ao canal da jornalista Leda Nagle.
Bolsonaro completou a tríplice coroa da infâmia, nesta quarta (15), ao culpar pela terceira vez o jornalista e o indigenista Bruno Pereira por seu próprio desaparecimento no Vale do Javari. A diferença é que, nas outras vezes, ele usou “aventura” ao invés de “excursão”.
Em 10 de junho, em Los Angeles, Jair disse: “Naquela região, geralmente você anda escoltado, foram para uma aventura, a gente lamenta pelo pior”. Três dias antes, já havia afirmado que “Realmente, duas pessoas apenas em um barco, numa região daquelas, completamente selvagem… É uma aventura que não é recomendável que se faça. Tudo pode acontecer. Pode ser um acidente, pode ser que eles tenham sido executados”.
O presidente poderia ter ido ao local, o que ajudaria a dar um senso de urgência para a estrutura de Estado e mobilizaria mais contingentes, equipamentos e veículos. Não fez isso, preferindo fazer uma motociata em Orlando. Até porque, se tivesse agido dessa forma, como iria encarar depois parte do seu eleitorado, composta por pessoas que lucram com a destruição do meio ambiente e dos povos da floresta?
Um caso de repercussão internacional como o desaparecimento de Bruno e Dom levaria um chefe de Estado a visitar o local das buscas — seja para reforçar que seu governo está preocupado, seja pelo marketing político. Mas Bolsonaro tem uma reputação a zelar com os tais grileiros e garimpeiros, madeireiros, pescadores e caçadores ilegais.
Eleitorado que contou com toda a atenção do presidente da República que se desdobrou, por três anos e meio, para enfraquecer a fiscalização da Funai, do Ibama, do ICMBio, do Incra, da Polícia Federal, além de desmontar regras e normas ambientais e apoiar um assalto de setores do Congresso sobre as leis que protegem o futuro do país.
Nesse contexto, faz sentido ele culpar sempre as vítimas, terceirizando responsabilidades que são dele. Foi assim com as mortes na pandemia de covid-19, com a fome e o desemprego, com o desmatamento e as queimadas, com a inflação.
Aquela região só é violenta, com a livre ação criminosa porque o Estado garante isso. Seja por uma histórica ausência em garantir os direitos fundamentais dos povos indígenas, seja porque o atual presidente sucateou as instituições e perseguiu servidores públicos, seja porque deu um salvo-conduto a qualquer grupo que atropele as políticas de proteção ao meio ambiente e aos povos e comunidades tradicionais na Amazônia, seja porque garante que o focos das Forças Armadas sejam urnas eletrônicas e não o tráfico internacional nas fronteiras.
Em um jantar com lideranças conservadores em Washington DC, nos Estados Unidos, em março de 2019, Jair afirmou: “Nós temos é que desconstruir muita coisa. Desfazer muita coisa. Para depois nós começarmos a fazer”.
Nos escombros da Amazônia é que floresce o eleitorado de Jair. Publicamente, ele lamenta as tragédias. Mas só publicamente.