Semana passada Silvio e eu fomos ao supermercado e gastamos, estupefatos, 375 reais. Compartilhei essa informação no meu Twitter e acrescentei: “Tudo bem que 100 foi em ração de gato, mas ainda assim… Tá tudo caríssimo! A gente não come carne bovina faz tempo, só frango e ovos — que aumentaram pra caramba! Como alguém que compra em supermercado pode apoiar o Bolso?”
Um montão de gente bacana que me segue concordou, colocou quanto gasta a cada ida de supermercado, comparou preços, apontou o que todo mundo vem sentindo (uma enorme alta dos alimentos e o aumento da inflação, que foi quase 9% nos últimos doze meses, e que vários especialistas preveem que vá alcançar os dois dígitos logo). Mas um carinha que não conheço (embora já bloqueava) decidiu me atacar gratuitamente. Ele escreveu: “O típico elitismo da esquerda acadêmica que quer fazer cosplay de pobre enquanto o povo (povo mesmo!) está passando fome. Ganha R$11mil por mês, gasta R$100 com ração de gato e ‘só’ come frango e ovos”.
Só fiquei sabendo desse ataque de pelanca um dia depois, através de um motoboy de treta. Fui ao perfil dele e percebi de cara que era um cirista. Quem está no Twitter sabe que Ciro Gomes (não tão carinhosamente apelidado de Cinco Gomes ou Six Gomes, dependendo da pesquisa) vem investindo pesado no seu gabinete do ódio particular. Muitas vezes os cirobots só ficam devendo aos bolsobots em volume, porque a tática de vasculhar as redes sociais dos desafetos e tentar destrui-los é a mesma.
No penúltimo parágrafo eu escrevi “atacar gratuitamente”, mas não é gratuito. Não é picuinha, não é pessoal. É orquestrado. Eles têm seus alvos, e eu sou um deles faz tempo, já que nunca gostei do Ciro. Nesse caso, alguém da campanha dele achou que, na falta de coisa melhor, dava pra destacar o meu tuíte sobre supermercado. Um outro abriu uma conta com o único intuito de colocar um print do meu salário no Portal da Transparência (a conta foi apagada poucos dias depois). Um dos coordenadores, se não engano um pastor, deu RT no tuíte com o print, e pronto, outros receberam a pauta.
Não foi exatamente uma ação bem sucedida, pois a imensa maioria das pessoas que comentaram o tuíte do “fiscal de salário”, como o carinha foi chamado, acharam um absurdo a pegação no meu pé, explicaram que em nenhum momento eu disse que não podia comprar carne bovina, indagaram se classe média pode ter gatos, e, se pode, se deve alimentá-los, lembraram que 11 mil reais, apesar de ser um salário muito acima da média brasileira, ainda assim está longe de ser salário de rico, e, principalmente, perguntaram quanto tinham que ganhar pra ter o direito de reclamar dos preços no supermercado na sua rede social.
Creio que meu tuíte foi bem simples e auto-explicativo. Na minha Timeline, a discussão descambou pra quanto se gasta com animais domésticos. Algumas pessoas, brincando, quiseram saber como eu gastava tão pouco com meus quatro gatinhos. Em geral eles comem dois sacos de 3 quilos de ração por mês, que a gente compra quase sempre uma vez por mês. É ração comprada em supermercado (Whiskas, Friskies, Qualita), nada de luxo, mas o preço aumentou uma barbaridade (na semana anterior, no mesmo supermercado, a Whiskas 3 kg de carne para gato castrado estava em R$ 45; uma semana depois, tinha subido pra R$ 59!).
Sei que essas rações não são boas, mas eu já tentei comprar uma que é considerada melhor, a Golden, e uma dos quatro gatos não gostou. Muita gente pontuou que vale a pena comprar saco de dez quilos (eu sei, minha vizinha compra). Trocamos ideias de como armazenar esse volume (a ração não fica menos fresca ao ser aberta?). Essas coisas bacanas e úteis que a gente faz no Twitter.
Desde 1997, eu anoto tudo que ganho e gasto. Creio que só assim é possível ter controle das finanças. Dessa forma, sei que em 2020 gastamos em compras de supermercado (o que inclui tudo menos algum creminho que eventualmente compramos em farmácia) um total de R$ 14.540, uma média de 1.212 por mês. Acho isso muito, muito alto pra um casal sem filhos. Em 2019, gastamos R$ 980 por mês. Em 2018, 928. Em 2017, 907. Este ano, até agora, a média não está tão diferente da do ano passado: são R$ 1.228 por mês.
Mas passamos por algumas mudanças alimentares. Por exemplo, barra de chocolate, meu vício, a gente agora só compra ocasionalmente, pra fazer algumas receitas. Carne bovina, que costumávamos consumir moída, de segunda (músculo), paramos. Desde novembro, passamos a fazer nossa própria mussarela caseira (faça você também : você transforma 200 gramas de mussarela em quase 2 quilos). Nossa maior mudança foi ter adquirido uma Air Fryer, em julho do ano passado. Vale muito a pena! Reduzimos nossa encomenda de comida pela metade (na realidade, é uma pizza em promoção por semana. Antes da Air Fryer eram duas). E a sobrecoxa de frango na fritadeira elétrica sem óleo fica tão incrível que a gente não se cansa de comer isso quase todo dia.
Não sei se dá pra ver daí, mas nosso cardápio do dia a dia está longe de ser luxuoso. E, mesmo assim gastamos mais de R$ 1.200 por mês! Não consigo parar de imaginar o que os 19 milhões de pessoas em situação de fome (dois anos atrás eram 10 milhões), ou as milhões de pessoas recebendo R$ 300 de auxílio-emergencial, estão comendo. Ou melhor, não estão comendo.
Quero dizer, até posso, porque a mídia de vez em quando noticia: fragmentos de arroz e feijão, pé e pescoço de frango, e doações de ossos de carne. Tudo cozinhado à lenha, por que desde quando quem sobrevive com 300 reais (ou mesmo com um salário mínimo de R$ 1.100) pode pagar mais de 100 por um botijão de gás?
Não consigo imaginar, sinceramente, qualquer pessoa votando neste governo da morte. Um governo cujo chefe maior, um genocida golpista medíocre, disse hoje mesmo que é preferível comprar fuzil que feijão, e que, mês passado, sua secretaria de comunicação divulgou uma arte comemorativa do Dia do Agricultor com uma homenagem aos capangas do campo, os Lázaros da vida.
É óbvio que o Brasil não era nenhum oásis antes do golpe de 2016, antes das catastróficas eleições de 2018, antes de 2020, em que passamos a contar com a mais corrupta e incompetente liderança do mundo para lidar com a pior crise sanitária do planeta em mais de cem anos. Mas basta comparar o Brasil de hoje com o de alguns anos atrás pra medir o tamanho da destruição.
Nunca vou me conformar. Nem perdoar. Já entender por que cirista defende Bolsonaro, eu até entendo. Não acho muito ético ou eleitoralmente eficaz, mas entendo.
Grande Cris Vector !
O post “QUEM COMPRA EM SUPERMERCADO CONSEGUE APOIAR BOLSONARO?” foi publicado em 27th August 2021 e pode ser visto originalmente na fonte Escreva Lola Escreva