Em um artigo pra Carta Capital, o professor e pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais Camilo Aggio explica por que Bolsonaro insiste na conversa de fraude nas eleições. É uma tática diversionista, claro, e sem qualquer pé na realidade.
Afinal, se as urnas eletrônicas em 2018 foram fraudadas, e seus candidatos ganharam de lavada (governadores e senadores desconhecidos que mal apareciam nas pesquisas venceram), elas agiram para ele, não contra.
Mas não: ele já disse — sem nunca apresentar qualquer tipo de prova –, que as urnas eletrônicas impediram que ele ganhasse no primeiro turno . Ontem seu filho Eduardo teve que admitir que “não temos como comprovar que houve fraude”.
No fim de semana, Bolso, histérico com as pesquisas, disse que, sem o voto impresso, Lula vencerá “pela fraude “. Em janeiro, antes do ex-presidente se tornar elegível, Bolso alegou que a tentativa de golpe nos EUA (a invasão do Capitólio por extremistas) foi por causa da falta de confiança dos americanos no sistema de votação. Outra incoerência é que ele é contra o voto eletrônico, mas Trump, sua inspiração, perdeu a reeleição nos EUA justamente com voto impresso.
Uma coisa que eu não sabia: quase 30 anos atrás, adivinha quem era a favor da informatização da apuração das urnas, justamente para impedir fraudes? Isso mesmo, Jair Bolsonaro! Em 5 das 7 vezes em q foi eleito e reeleito deputado federal, foi com as urnas eletrônicas. E pra presidente também!
Para Aggio, há três motivos para Bolso espalhar na ladainha da fraude nas urnas eletrônicas: como sua popularidade está indo pro espaço e Lula cresce nas pesquisas, insistir na fraude equivale a dizar que só sua reeleição seria autêntica. Fora isso, é cortina de fumaça (no caso, para desviar a atenção da CPI da Covid no Senado). O terceiro motivo é o que Marcos Nobre descreve como “caos como método”. Aggio escreve:
“O bolsonarismo sabe atuar com eficiência na guerra do caos, da confusão, do desnorteio, porque é aí que descontextualizações, mentiras e falsidades podem melhor se acoplar às mentes e corações das mobilizações e militâncias políticas numa esfera pública dominada pela poluição e pela confusão. Não é à toa que os discursos negacionistas do presidente guardam correlação direta com um maior número de desrespeito ao isolamento social, contaminação e mortes pela Covid-19.
E eis aqui o aspecto que julgo mais importante nessa história antes que cedamos aos diagnóstico simplório de que a tentativa de desqualificação do nossos sistema eleitoral se resuma a uma bravata sem maiores consequências práticas. Atacar o sistema eleitoral é parte de um conjunto de esforços que Jair Bolsonaro emprega há muito seguindo uma cartilha do populismo fascista: desqualificar as instituições democráticas, sob a alegação de defesa da democracia, para subverter o regime democrático: seja de forma radical, seja de forma incremental, homeopática. E o discurso da fraude eleitoral cai feito uma luva para a base bolsonarista que despreza valores liberais, o regime democrático, a separação dos Poderes. […]
Só para concluir nos termos certos: ao acusar nosso sistema eleitoral de fraudulento e pregar a volta do voto impresso, tudo o que Jair Bolsonaro e sua manada querem é promover uma fraude que o mantenha no poder. Acusar fraude para fraudar é o lema. E há uma dupla utilidade nessa estratégia: se mantiverem o voto eletrônico, essa já seria a prova de fraude; se adotarem alguma forma de impressão de voto, estarão abertas oportunidades de ouro para colocar o processo eleitoral sob suspeição utilizando de todas as táticas para dificultar contagem e auditoria de votos, bem como criar falsos casos e provas de fraude para criar um clima de opinião favorável a suas pretensões golpistas”.
Em outras palavras: não se deve pensar que as narrativas mirabolantes de Bolso são inofensivas. Elas visam sempre minar a democracia.
O post “BOLSO NEM SEMPRE FOI A FAVOR DO VOTO IMPRESSO” foi publicado em 18th May 2021 e pode ser visto originalmente na fonte Escreva Lola Escreva