Por 10 votos favoráveis, 1 abstenção e apenas 1 voto contrário, o Conselho de Política Ambiental do Estado de Minas Gerais, por meio da Câmara Especializada de Atividades Minerárias (CMI-Copam), aprovou na tarde desta sexta (25) a volta das atividades da Samarco, controlada por Vale e BHP Billiton, em Mariana.
A expectativa da Samarco é retomar as atividades em um ano.
A autorização acontece em um
momento bastante simbólico: há exatos 9 meses a barragem da Vale em Brumadinho
rompia, deixando 252 mortos e 18 desaparecidos até o momento. E no próximo dia
05 de novembro o rompimento da barragem da Vale em Mariana completará 4 anos.
“Como é possível que a Secretaria de Meio
Ambiente permita e seja favorável à retomada da Samarco apesar da empresa não
ter realizado a totalidade das reparações e recuperação do passivo ambiental
deixado pelo rompimento em 2015 e com diversas inconsistências no processo de
licenciamento, inclusive em relação à barragem de Germano, com alteamento a
montante, e à Cava de Germano que também contém rejeitos, que já apresentavam
riscos antes de 2015?”, pergunta o Profº Dr. Klemens Laschefski, do Grupo de
Estudos em Temáticas Ambientais da Universidade Federal de Minas Gerais
(GESTA-UFMG).
O parecer de vistas do Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas (Fonasc), único voto contrário na reunião da CMI, aponta uma série de irregularidades no processo. A Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese) optou pela abstenção.
A Superintendência de Projetos Prioritários (SUPPRI) foi responsável pelo parecer técnico favorável à concessão da licença para a retomada e embasou a decisão dos conselheiros da CMI-Copam.
“O fato de a SUPPRI, mais uma
vez, apresentar no seu parecer uma argumentação burocrática absurda sobre as
estruturas com rejeitos só prova que sistema de gestão ambiental de Minas
Gerais é que é o verdadeiro desastre. É totalmente inaceitável que a Samarco
queira retomar suas atividades no complexo minerário sem eliminar completamente
qualquer risco às pessoas e ao meio ambiente na bacia do Rio Doce tão
castigado. E a Vale, que sempre afirmou que suas barragens de rejeitos eram
seguras e não iriam romper, já demonstrou que além de incompetente na gestão
dessas estruturas é criminosamente negligente”, diz a ambientalista Maria
Teresa Corujo.
A barragem de rejeitos de Germano
e diques associados (Sela, Selinha e Tulipa) têm quase 130 milhões de metros
cúbicos de rejeitos acumulados – o equivalente a mais de duas barragens de Fundão
e a 10 barragens de Córrego do Feijão em Brumadinho – além de um barramento com
163 metros de altura. É uma das maiores barragens alteada a montante de que se
tem conhecimento em Minas Gerais e no Brasil.
Maria Teresa lembra que esse complexo está situado ao lado da barragem de Fundão, que se rompeu em 2015, em região de falhas geológica e caracterizada como foco da maior quantidade de sismos de toda a região do Quadrilátero Ferrífero.
“Além disso, os relatórios sobre as barragens da Samarco são marcados por falhas de informações a exemplo dos dados sobre volume de rejeitos registrados pelo Governo de Minas Gerais entre 2011 e 2014. Todas essas questões não foram tratadas no parecer da SUPPRI, o que é muito grave considerando o ocorrido em Mariana (2015) e Brumadinho (2019)”, afirma Teca.
Com a Licença de Operação Corretiva (LOC) garantida, a promessa da Samarco é construir uma planta de filtragem que vai separar a parte líquida da sólida dos rejeitos. As obras devem durar 12 meses. Com isso, a previsão de voltar a operar em 2020, feita anteriormente pelos executivos da empresa, se cumpre.
Em nota, a Samarco afirmou que “este passo importante demonstra o compromisso da empresa em reiniciar suas operações de forma segura e sustentável”. Em vídeo , o prefeito de Mariana, Duarte Júnior (PPS), comemorou a decisão do COPAM.
Controladoria-Geral de Minas Gerais coloca em xeque o
licenciamento no Estado
A aprovação também ocorre na mesma semana em que um relatório inédito da Controladoria-Geral de Minas Gerais mostrou que a barragem da Vale em Brumadinho funcionou sem licença até 2008 , obteve autorização para alteamento posteriormente mesmo sem documentos obrigatórios e licenças ambientais foram concedidas sem levar em conta o comprometimento da estrutura.
O relatório da CGE aponta ainda a
ineficiência de gestão do estado de Minas Gerais na avaliação das recomendações
de segurança das barragens de rejeito, a existência de fragilidades quanto à
instrução e análise pela Secretaria de Meio Ambiente (Semad) dos processos de
licenciamento ambiental e fragilidades também em ações após a emissão das
licenças, como, por exemplo, no monitoramento das condicionantes.
Todo esse comprometimento
estrutural do licenciamento em Minas Gerais, comprovado não só pelo relatório
da CGE mas por dezenas de matérias investigativas, as CPI’s em curso no Senado,
no Congresso e na Assembleia Legislativa de MG e as investigações oficiais da
Polícia Federal não foram suficientes para impedir a aprovação do retorno da
Samarco.
CMI segue servindo as
mineradoras
Há apenas 11 meses, a mesma CMI
licenciou, com parecer favorável do Estado e um único voto contrário (também do
FONASC), a continuidade das minas Feijão e Jangada da Vale, local de rompimento
da barragem em Brumadinho, apesar de todas as denúncias de que a mineradora não
cumpria condicionantes, havia falhas no processo de licenciamento e o complexo
minerário era uma ameaça à região.
A CMI é composta sobretudo por
representantes do governo estadual e do chamado “setor produtivo”: SEMAD, SEDE,
SEGOV, SEDESE, Codemig, ANM, Ibram, Sindiextra, Federaminas, Fonasc, Cefet e
Crea.
Assim, a aprovação do retorno da
Samarco não é exatamente surpresa.
Apenas um projeto minerário foi barrado na CMI-COPAM em 40 reuniões realizadas entre fevereiro de 2017 e janeiro de 2019, quando a barragem de Brumadinho rompeu. Os fatos mostram que a CMI segue servindo exclusivamente às mineradoras e que as decisões da Câmara são, no mínimo, questionáveis.
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