Artigo publicado na revista médica The Lancet por Willemijn Lodder e Ana María de Roda Husman , do Centro de Controle de Doenças Infecciosas da Holanda, indicou a presença de RNA do novo coronavírus (Sars-CoV-2) no esgoto de cidades como Paris e Amsterdã e nas fezes de doentes pela Covid-19.
Apesar de a descoberta ter causado preocupação, especialistas ligados ao Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento – ONDAS apontam que a presença de vestígios do vírus no esgoto não significa necessariamente que a Covid-19 seja transmitida dessa maneira e lembram que o vírus não se reproduz na natureza sem um hospedeiro.
Até o momento, não existe relato de transmissão do novo coronavírus por água ou esgoto, o que demonstra, de acordo com esses especialistas, a necessidade de uma análise abrangente e mais sutil para testar a hipótese de possível transmissão fecal-oral da Covid-19. É o que afirma o Prof. Dr. Léo Heller, relator especial da ONU para os Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário e conselheiro do ONDAS, em artigo produzido em conjunto com mais dois pesquisadores brasileiros e publicado no Science of The Total Environment, v.729, 2020. (para ler a versão traduzida, clique aqui ).
No artigo, os autores argumentam que a dinâmica ambiental e a persistência da infectividade viral devem ser consideradas na proposta de um marco analítico para testar a hipótese fecal-oral, desvelando as diferentes rotas ambientais das fezes até a boca de uma pessoa suscetível. Também alertam que esse marco não deve ser visto como uma confirmação da hipótese.
Por fim, concluem os autores: “considerando que 2,2 bilhões de pessoas em todo o mundo não têm acesso à água gerenciada de forma segura e 4,2 bilhões a saneamento gerenciado de forma segura, a possível contenção do COVID-19 por meio do acesso a esses serviços é, por si só, uma justificativa para estabelecer medidas imediatas para mitigar a exposição de pessoas que vivem nas situações mais vulneráveis a doenças de transmissão feco-oral”.
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Presença na água
A estrutura morfológica e química do SARS-CoV-2 é similar a outros coronavírus já conhecidos e a própria Organização Mundial da Saúde –OMS admite a similaridade entre eles em termos de persistência na água e de resistência à inativação por desinfecção, mas afirma também que, embora possível, não há evidências da persistência de quaisquer coronavírus em água. O engenheiro sanitarista Alex Moura de Souza Aguiar e o Prof. Dr. Rafael Kopschitz Xavier Bastos reforçam que, até agora, não há quaisquer evidências que a transmissão possa ocorrer por consumo de água tratada.
“O SARS-CoV-2 é um vírus envelopado, envolto por uma membrana lipídica externa frágil, tornando-o suscetível à ação de oxidação da radiação do sol, do cloro ou de outro desinfetante empregado no tratamento da água. Dessa forma, tudo indica que o tratamento convencional da água seja suficiente para a remoção/inativação efetiva do SARS-CoV-2, principalmente a etapa da desinfecção com cloro, que é o desinfetante mais comumente utilizado no Brasil”, explica Alex Moura.
Esgoto pode servir para descobrir circulação do vírus
A importância dos estudos sobre a presença do novo coronavírus no esgoto e na água, para além dos riscos de transmissão, é instrumento importante que pode servir como fonte de dados para descobrir se o vírus está circulando entre a população e em quais regiões, por exemplo. Os especialistas afirmam que isso poderá servir como uma ferramenta epidemiológica barata e não invasiva para alertar contra surtos da doença. O INCT – Etes Sustentáveis está desenvolvendo pesquisa com este objetivo em Belo Horizonte.
A página do ONDAS – Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento vem divulgando sistematicamente artigos relevantes de especialistas abordando os nexos entre os direitos humanos à água e ao saneamento e a atual pandemia, com foco nos segmentos mais vulneráveis da população.
Fonte: Eco Debate .
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