A Mata Atlântica brasileira tem uma das biodiversidades mais ricas do mundo, mas também é uma das mais ameaçadas. Atualmente, existem apenas 7% de porções vegetais desse bioma, em relação ao que um dia existiu no território do Brasil.
São apenas fragmentos isolados que sobraram das porções que predominaram em estados como Paraná, Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. Mesmo com um nível tão alto de desmatamento e agressão, o potencial desse bioma, de tão expressivo, ainda é incalculável para a medicina. O Brasil conta com uma impressionante fonte natural de princípios ativos e com campo extenso para pesquisas que podem descobrir novos medicamentos a partir das plantas nativas.
Biodiversidade incalculável
Pesquisas recentes indicam a existência de 450 espécies de árvores em um único hectare de Mata Atlântica. O bioma todo concentra milhares de espécies. Além da riqueza da fauna – que abriga anfíbios, répteis, peixes, mamíferos e aves – e da flora – com diversas espécies de plantas e árvores endêmicas, originais e únicas da região – existe, ainda, uma imensa sociobiodiversidade representada por mais de 200 povos indígenas e por diversas comunidades, como quilombolas, caiçaras e seringueiros, que reúnem um inestimável acervo de conhecimentos tradicionais. Entre eles, está a prática do uso de plantas medicinais para tratar e prevenir problemas de saúde. A relevância desse conhecimento é fonte de estudos
sobre princípios ativos e possibilidades de aproveitamento dos elementos na indústria farmacêutica e alimentícia, afinal, apesar de toda essa riqueza, o Brasil ainda é um país bastante dependente de patentes de remédios pertencentes a nações ricas.
Projeto NUPPLAMED e a pesquisa de espécies vegetais nativas
O extrativismo de plantas medicinais é compatível com a conservação da floresta. Para isso, entretanto, é preciso técnica de trabalhos que gerem baixo impacto ambiental. A resolução da Anvisa (2010) representa um referencial para as pesquisas. O Núcleo Paranaense de Pesquisa Científica e Educacional de Plantas Medicinais (Nupplamed), da Universidade Federal do Paraná (UFPR), tem investigado dezenas de espécies da Mata Atlântica e os resultados dos estudos são promissores. Eles buscam métodos de localizar, avaliar e explorar legalmente a diversidade existente, buscando recursos genéticos e bioquímicos que o ecossistema possa oferecer.
Os pesquisadores elaboraram uma “extratoteca”, ou uma biblioteca de extratos vegetais, que tem como um dos principais objetivos gerar fonte constante de amostras a serem testadas para que seja possível identificar novas formas de uso farmacológico para diversas doenças. Para a coordenadora do Nupplamed, a bióloga Juliana Maurer, entender o potencial das espécies vegetais da Mata Atlântica é um mecanismo também para ajudar na conservação de um dos biomas mais ricos, importantes e ameaçados do planeta.
“Esta pesquisa precisa ser eficiente e, para isso, precisamos ter produtos que retornem para a sociedade. Não adianta ficarmos só dentro do laboratório. Temos que passar os resultados dessas descobertas para as pessoas, ter um ganho, e oferecer resultados mais concreto. Não se trata apenas do desenvolvimento de produtos fitoterápicos. Não é só floresta amazônica que é extremamente rica. A Mata Atlântica também é e ainda não conhecemos todas as espécies que ela reúne, quem dirá, as aplicações das espécies que contém”, diz a Juliana, bióloga doutora em bioquímica e coordenadora do Nupplamed.
Mais estímulo a novas pesquisas, mais descobertas
Os trabalhos na UFPR partiram de uma lista inicial feitas pelos pesquisadores Marília Borgo e Ricardo Britez. Eles registraram 334 espécies nativas A professora e pesquisadora Marcia Mendes Marques, também contribuiu, destacando a possibilidade de utilização de 176 espécies de plantas do litoral paranaense. O núcleo de pesquisa da universidade priorizou para o estudo 52 espécies nativas da Mata Atlântica, de porte arbóreo, que apresentam indicação de uso medicinal ou alguma utilização econômica.
Grande parte da população brasileira faz uso de plantas medicinais para tratar problemas de saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que 80% da população de países em desenvolvimento dependem da medicina tradicional e 85% dos medicamentos envolvem o uso de extratos de plantas. Isso significa que quase quatro bilhões de pessoas dependem dessas fontes de tratamento.
O potencial de existência de novos medicamentos é proporcional ao número de espécies de uma vegetação. Em décadas de estudos científicos, contamos com uma pequena amostra do que existe na floresta. Conforme o estímulo à pesquisa ocorre em um país, pesquisadores, professores e alunos, conseguem identificar novas possibilidades e estimular pesquisas inéditas.
A Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS) com apoio da Fundação Grupo Boticário desenvolveu o projeto da Grande Reserva Mata Atlântica, um trabalho em rede e articulado entre diversas instituições que atuam nesse território com o objetivo de promover o desenvolvimento da região, levando em consideração sua vocação de conservação da biodiversidade e cultura regional.
No site e nas redes sociais do projeto, você tem acesso a levantamentos, mapeamento e informações sobre a diversidade existente no Paraná, Santa Catarina e São Paulo. O projeto inclui a websérie “Histórias da Grande Reserva Mata Atlântica” repleta de paisagens maravilhosas, histórias sobre a rica fauna presente na região e traz até famosas lendas sobre um dos lugares mais mágicos do Brasil, a Ilha do Mel, localizada no litoral do Paraná.
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Conheça algumas plantas medicinais da Mata Atlântica e suas funções:
Pau-brasil ou Ibirapitanga (Caesalpinia echinata)
Esta espécie nativa, profundamente ligada à história do Brasil, tem propriedades e usos medicinais como ações adstringente e antidiarreica. Seu composto “brasilina”, o corante vermelho, deu origem ao primeiro produto natural extraído da colônia portuguesa e conduziu o primeiro ciclo econômico do país. A madeira desta árvore também foi bastante utilizada para confecção de instrumentos musicais e para a construção civil e naval. Atualmente, a espécie está extinção devido à exploração descontrolada.
Espinheira-santa, cancerosa ou cancorosa-de-sete-espinhos (Maytenus ilicifolia)
As folhas deste arbusto são prescritas pela medicina popular para tratamento de indigestão e úlceras gástricas. Seus princípios ativos, reconhecidos pela Anvisa, combatem problemas de acidez estomacal e a formação de gases. A espinheira-santa é muito usada em banhos para a cicatrização da pele. Além disso, seus compostos bioativos têm propriedades antineoplásica, para combate a tumores, e antimicrobiana, no controle de parasitas que causam a Leischimaniose e a Tripanossomose. É uma espécie nativa da Mata Atlântica, muito comum no sul e sudeste do país.
Erva-baleeira ou maria-milagrosa (Cordia verbenacea)
Este arbusto deu origem ao primeiro fitoterápico brasileiro desenvolvido no Brasil em parceria entre universidades, instituições e a indústria farmacêutica. O Acheflan®, desenvolvido a partir das folhas da erva-baleeira, é receitado como analgésico e anti-inflamatório tópico. Em pomada, creme ou spray, o medicamento é indicado no tratamento de tendinites e dores musculares, e em quadros inflamatórios associados a entorses e contusões.
A pesquisa e o desenvolvimento do produto levaram sete anos e receberam o investimento de mais de R$ 15 milhões. A ideia inicial partiu de um dos fundadores do laboratório Aché, que havia experimentado a erva no tratamento de uma lesão esportiva.
A Erva-baleeira é uma espécie nativa da Mata Atlântica, encontrada, principalmente, na região litorânea, com grande importância terapêutica e econômica.
Aroeira-vermelha (Schinus terebinthifolia)
Das cascas secas do caule das folhas são extraídos compostos com propriedades cicatrizante, anti-inflamatória, antimicrobiana, antirreumática e diurética.
Esta espécie nativa ocorre em quase todo o território brasileiro e, além de sua importância medicinal, também apresenta potencial para recuperação de áreas degradadas e outros usos múltiplos em propriedades rurais, como para a confecção de lenha, carvão, moirões, cercas vivas, forragem para cabras, aves silvestres e abelhas, ornamentação e para a arborização de pastos.
Araçá (Psidium cattleianum)
Esta árvore nativa é da mesma família da jabuticaba e da goiaba. Além de seu uso medicinal, é utilizada para fins madeireiro e alimentício. Seus frutos são consumidos tanto in natura como utilizados para fabricação de sorvetes e geleias. As folhas e frutos possuem propriedades e usos como antidiarreica e antimicrobiana. O nome “araçá” vem do tupi e significa “planta que tem olhos”. A espécie também pode ser usada na recuperação de áreas degradadas, porque tem crescimento rápido e atrai a fauna, sendo muito apreciada principalmente pelos pássaros.
Tomatinho-do-mato ou maracujá de morcego (Solanum diploclonos)
O tomatinho-do-mato é um exemplar nativo que está na lista de espécies ameaçadas de extinção. Os frutos, quando maduros, são comestíveis e têm funções antioxidantes.
O estudo desta planta é desenvolvido pela bióloga Flávia Christine dos Santos, do Nupplamed, em cooperação com a Sociedade Chauá, que atua na recuperação de áreas degradadas. A espécie é indicada em ações de restauração ecológica e plantios comerciais.
Outras espécies utilizadas na alimentação humana, a exemplo da batata, tomate, berinjela, pimentão, e as pimentas pertencem a mesma família.
Flor de Bananeira (Musa velutina)
Musa paradisíaca, ou bananeira, é uma espécie naturalizada, originária da Ásia, porém, amplamente cultivada no Brasil. É o país com a maior área plantada desta espécie. As bananeiras se adaptaram muito bem ao clima da Mata Atlântica.
Da flor os pesquisadores conseguiram um extrato para tratamento de diarreia, asma, tosse, bronquite, e com propriedade cicatrizante.
Além do uso medicinal, essa espécie tem grande importância comercial e nutricional em função de seus frutos, as bananas. E suas flores são consumidas também como “PANC”, que são “plantas alimentícias não convencionais”.
Pata-de-vaca ou unha-de-boi (Bauhinia forficata)
As folhas desta árvore são usadas para tratamento de processos infecciosos e dolorosos, e como tratamento auxiliar para o diabetes, por reduzir a taxa de glicose no sangue.
É uma espécie nativa, pertencente a mesma família de espécies de interesse econômico como a soja, a ervilha e o feijão. Além de seu uso medicinal, a pata-de-vaca também é utilizada como planta ornamental. No Rio Grande do Sul, ocorre nas formações florestais de todo o Estado.
Republicado do Observatório de Justiça e Conservação através de parceria de conteúdo. |
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Jornal Justiça & Conservação – Terceira Edição.
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O post “Plantas da Mata Atlântica têm propriedades medicinais de potencial ainda desconhecido” foi publicado em 14th April 2020 e pode ser visto originalmente diretamente na fonte ((o))eco