Como parte das celebrações do Dia da Visibilidade Trans (29) , foi realizada uma reunião técnica em Brasília (DF) entre pessoas trans, representantes das Nações Unidas e organizações de diversas partes do Brasil para debater temas como saúde, direitos sexuais e reprodutivos, empregabilidade, inclusão social e direitos humanos dessa população.
A reunião foi promovida pelo Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS) no Brasil e pela representação do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos (ACNUDH) no país, através das campanhas Livres & Iguais e Zero Discriminação.
O encontro, que continuou na quinta (30), reuniu mais de 80 pessoas entre profissionais de saúde, pessoas trans, sociedade civil, academia, gestores e gestoras públicas e representantes de organizações internacionais, estudantes, entre outros.
Os dois dias do evento realizado no escritório da Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) contaram também com o apoio da própria OPAS/OMS, do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e do Departamento de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis (DCCI) do Ministério da Saúde.
A vulnerabilidade social, o preconceito e discriminação ainda são barreiras encontradas por pessoas trans no emprego, o que afeta negativamente sua admissão, permanência e ascensão no mercado formal de trabalho.
O preconceito e a discriminação ocorrem, muitas vezes, a partir de atos velados, como a exigência de que as pessoas trans usem o nome de registro ou uniformes de trabalho que não condizem com sua identidade de gênero, por exemplo.
O relatório mais recente do UNAIDS aponta que, em todo o mundo, o risco de infecção pelo HIV é 12 vezes maior para pessoas trans em relação à média verificada entre pessoas com vida sexualmente ativa.
Além disso, globalmente, estima-se que 19% das mulheres trans e travestis vivam com HIV. Os dados mais recentes do Ministério da Saúde apontam para uma prevalência de HIV que pode ser superior a 30% entre travestis e mulheres trans no Brasil, enquanto na população em geral, esta prevalência do HIV é de 0,4%.
“Através da metodologia do Café Mundial, onde se propõe de maneira mais intimista uma discussão propositiva entre as representações sociais, membros da academia e gestores de serviços, é possível trabalhar em uma construção conjunta que contemple as necessidades de uma população que precisa deste olhar humanizado, sinérgico, equânime e principalmente singular“, explicou Ariadne Ribeiro, assessora de apoio comunitário do UNAIDS no Brasil.
O relatório “Violências LGBTFóbicas no Brasil: dados da violência” de 2018, do então Ministério dos Direitos Humanos, informou que, só em 2016, o Disque 100 registrou 103 denúncias relatando violência contra transexuais. Entre os tipos de violações, 34,6% relataram sofrer violência psicológica, enquanto 30% sofreram discriminação e 17,1% violência física.
“A naturalização da transfobia excludente implica no não reconhecimento da população trans, e isso impacta na estimativa de vida, que já muito baixa, de apenas 35 anos“, explicou Bruna Benevides, secretária de articulação política da Agência Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) e autora do dossiê de assassinatos e violência contra a população trans brasileira.
“É preciso que a sociedade civil e o Estado abracem os dados que existem sobre a população trans, e usem essas informações para políticas públicas.“
No primeiro dia da reunião, os debates abordaram os mais diversos aspectos de vulnerabilidade que afetam as pessoas trans. Durante a manhã, integrantes do movimento social participam de uma mesa temática sobre interseccionalidade de raça, etnia, geracional e de representação do conhecimento trans na saúde.
À tarde, a discussão focou no acesso e cuidado integral de pessoas trans, principalmente na sinergia de vulnerabilidade ao HIV e outras ISTs, como o uso abusivo de álcool e outras drogas, trabalho sexual e situação de rua, e também abordou os direitos sexuais e reprodutivos das pessoas trans e intersexo, principalmente no aspecto das mudanças corporais.
“Se somos um país que pratica genocídio à população trans, isso acontece porque nossa sociedade é estruturalmente LGBTIfóbica e racista, e mudar essa lógica não depende apenas do discurso, mas de tocar as pessoas e de afeto“, defendeu Jaqueline Gomes, Pesquisadora Trans do Instituto Federal do Rio de Janeiro, durante sua fala na Conferência Magna de abertura da reunião.
Durante o segundo dia (30), as discussões da manhã aconteceram no formato de Café Mundial, com o objetivo de construir o documento final sobre saúde, trabalho, direitos e inclusão social da população trans. Também ocorreu uma mesa temática com o tema “trabalho, saúde e inclusão social” e uma apresentação do PROADI SUS TRANS, pela equipe do Hospital Albert Einstein, de São Paulo.
Zero Discriminação
Desde 2013, o UNAIDS, com apoio das 11 agências, fundos e programas copatrocinadores do Programa Conjunto, tem implementado a iniciativa global Zero Discriminação, que celebra o direito de todas as pessoas a uma vida plena, digna e produtiva — não importando sua origem, orientação sexual, identidade de gênero, sorologia para o HIV, raça, etnia, religião, deficiência e tantos outros motivos de discriminação.
No ano passado, o UNAIDS lembrou que apenas nove países no mundo reconhecem o gênero não binário, e oferecem aos seus cidadãos outra opção legal que não “masculino” ou “feminino”, enquanto 17 países ainda criminalizam pessoas trans.
A campanha “Livres & Iguais” é uma campanha inédita e global das Nações Unidas para promover a igualdade de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexo (LGBT).
Lançada pelo ACNUDH em 2013, tem por objetivo aumentar a conscientização sobre a violência e a discriminação homofóbica e transfóbica e promover um maior respeito pelos direitos das pessoas LGBT, em todos os lugares do mundo.
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